Pais estão pagando caro para armazenar o sangue de dentro dos cordões umbilicais dos seus filhos, mas deveriam também armazenar o próprio cordão, que costuma ser descartado. Isso porque as células-tronco do cordão servem para formar neurônios, dizem agora cientistas brasileiros. Elas podem, um dia, servir para tratar lesões de medula ou o Parkinson.
“Células-tronco que formem tecido nervoso serão muito importantes. É o [tecido] mais difícil de repor. O ideal, então, seria guardar os dois, sangue e cordão”, diz Sérgio Verjovski-Almeida, biofísico da USP e coautor do estudo, a ser publicado no periódico “Stem Cell Reviews and Reports”.
Ele diz isso porque é longa a lista de aplicações na medicina que talvez surjam a partir dessas células-tronco do cordão. A mais sonhada é repor células neurais afetadas por traumatismos ou doenças ligadas ao tecido nervoso. Isso ajudaria inclusive paraplégicos ou tetraplégicos vítimas de acidentes.
Células de dentro
Os pesquisadores descobriram também que as células-tronco do sangue de dentro do cordão, por outro lado, serão boas para formar outros tipos de célula, como as dos ossos. Serviriam, portanto, para tratar outras doenças, como regenerar ossos fraturados.
Além disso, já se sabia há bastante tempo que essas células eram especialmente boas também para gerar novas células do sangue. Trata-se de sangue umbilical gerando sangue adulto, algo que acontece naturalmente, os cientistas nem precisam se esforçar. Tanto que, desde 1988, há gente recebendo, para tratar a leucemia, sangue transplantado que veio de cordões umbilicais.
Células-tronco do cordão umbilical e do sangue têm, portanto, utilizações diferentes.
Isso acontece porque as únicas células-tronco que podem se tornar qualquer tipo de célula especializada são as embrionárias. Basta pensar que um embrião, de fato, acaba virando um organismo completo.
As outras, mais “velhas”, já apresentam potencial maior para se tornar um tipo específico de células -perderam parte de sua “pluripotência”, ou capacidade de diferenciação.
Jogando fora o trigo
Mayana Zatz, geneticista da USP e também autora do estudo, já tinha feito outro trabalho mostrando que não é inteligente jogar fora o cordão.
Ele mostrava que era possível isolar células-tronco em todos os cordões. Entretanto, os cientista só conseguiam fazer o mesmo em 10% das amostras de sangue umbilical.
Isso faz com que se questione se vale realmente a pena retirar o sangue do cordão para ser congelado. Ainda mais porque o procedimento é caro: são cerca de R$ 4 mil pela coleta -e ainda é necessário pagar uma taxa anual de manutenção.
“Eu recebo zilhões de e-mails de pessoas perguntando se devem congelar o sangue do cordão umbilical dos seus filhos. Elas pagam uma fortuna para guardar o sangue e jogam fora o principal”, diz Zatz. É como se, na separação do joio do trigo, o trigo fosse jogado fora.
“Até se deve guardar o sangue de dentro do cordão umbilical, por causa da leucemia e de uma eventual transfusão. Mas ele deve ficar em um banco público”, diz Zatz. Assim, outras pessoas poderiam usar aquele sangue se precisassem.
Isso deve ser assim porque “não se recomenda usar sangue do próprio cordão, pode acabar causando câncer de sangue. É melhor receber de um doador. Além disso, o sangue de um único cordão é suficiente [em um transplante] para alguém com no máximo 50 quilos, então, em geral, não basta”.