Ao chegar a Nova York para a Assembleia Geral da ONU, o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, entrou mais uma vez na batalha pela opinião pública, e mais uma vez ele parece ter ganhado a primeira briga.

Como sempre, ele fez a sua ronda pelos estúdios das redes de televisão americanas, aparecendo nos programas de Charlie Rose, na PBS, e de Larry King, na CNN. Antes, ele já havia sido entrevistado por Christiane Amanpour na ABC.

Enquanto parte da mídia ocidental o acusa de ser louco, Ahmadinejad tem se mostrado tão hábil em influenciar opiniões e os órgãos de imprensa quanto qualquer outro líder mundial.

É verdade que ele é conhecido por cometer sérias gafes, como a sua afirmação, em uma viagem anterior a Nova York, que “nós não temos gays, como vocês têm”.

Mas o iraniano também foi bem sucedido em levar as discussões políticas para um terreno que ele próprio escolheu, e poucos jornalistas ocidentais que o entrevistaram (talvez nenhum) conseguiram fazê-lo perder pontos.

Uma de suas técnicas favoritas é usar sua aparente fraqueza para atacar os oponentes.

Assim, antecipando-se à pressão para libertar Josh Fattal e Shane Bauer, os dois americanos detidos no Irã desde julho de 2009, ele pediu a liberdade de iranianos mantidos presos nos Estados Unidos.

Este assunto dominou as manchetes, mais do que o seu próprio histórico em termos de direitos humanos ou a ameaça de apedrejamento à iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani.

Esta é uma técnica de manipulação que deveria ser reconhecida por qualquer consultor de mídia de presidentes ou primeiros-ministros no mundo.

Escorregadio

É tão difícil entrevistar Ahmadinejad que uma discussão animada está ocorrendo na internet sobre como tirar o melhor dele.

Em um artigo na revista Foreign Affairs, intitulada “Como não ser manipulado por Ahmadinejad”, a ex-correspondente do jornal americano USA Today Barbara Slavin avisa a seus colegas jornalistas: “Desde que foi eleito em 2005, o presidente iraniano aperfeiçoou a arte de deslizar e escapar até dos entrevistadores mais preparados. Ele tipicamente responde às perguntas com perguntas e rebate as críticas atacando os Estados Unidos e Israel”.

A técnica de Ahmadinejad é auxiliada pelo fato de que a maior parte das entrevistas feitas por estrangeiros são feitas por meio de tradutores – dando ao jornalista menos espaço para interromper e menos tempo para inquirir.

Os críticos de Ahmadinejad também argumentam que ele tem uma postura flexível em relação à verdade, uma atitude que os políticos que enfrentam cobranças cotidianas têm dificuldade de adotar impunemente.

Em uma entrevista com Christiane Amanpour no programa “This Week”, da ABC News, veiculada no ultimo domingo, ele rechaçou e chamou de “propaganda” a sentença de apedrejamento que os advogados de Sakineh Mohammadi Ashtiani alegam ter sido imposta a ela.

Questionado sobre sua opinião pessoal sobre apedrejamento em geral, Ahmadinejad simplesmente evitou a pergunta.

Ele então, de maneira seca, negou a acusação de que o número de execuções no Irã aumentou dramaticamente desde que ele assumiu a Presidência, algo alegado tanto por organizações de defesa dos direitos humanos quanto agências de notícias internacionais, que mantêm uma contagem das execuções anunciadas na mídia iraniana.

Na Universidade de Columbia, em Nova York, ele afirmou que havia total liberdade nas instituições de ensino superior iranianas. Vários estudantes que protestaram contra Ahmadinejad em seu retorno a Teerã foram prontamente detidos.

Às vezes, ele simplesmente faz graça com a pergunta.

Questionado por Jon Snow, da rede de televisão britânica Channel 4, sobre sua resposta à “mão amiga” oferecida pelo presidente americano, Barack Obama, Ahmadinejad perguntou jocosamente qual das mãos seu colega havia estendido, a esquerda ou a direita.

Subestimado

Em outros temas, ele apresenta mensagens radicalmente diferentes para diferentes públicos.

Questionado em uma visita anterior a Nova York sobre acusações de que ele era antissemita e negava o Holocausto, o presidente iraniano disse que ele estava simplesmente pedindo um debate aberto sobre o assunto.

Em contraste, falando no Irã, ele regulamente insulta a “camarilha de sionistas” que, segundo ele, controla as políticas de Israel, dos Estados Unidos e de outros países ocidentais.

Tal linguajar pode soar tão radical para os ouvidos do Ocidente que os entrevistadores erroneamente pensam que Ahmadinejad é ingênuo ou burro, e é comum que o subestimem.

O problema não é exclusivo dos jornalistas ocidentais. Ahmadinejad também foi um páreo duro para seus oponentes políticos nos debates televisivos que antecederam a eleição presidencial ocorrida em junho de 2009.

Um dos candidatos de oposição, Mehdi Karroubi, parecia particularmente despreparado.

Mas os entrevistadores do Ocidente encontram problemas específicos.

“Os repórteres precisam estar munidos de um conhecimento profundo da economia, da política e da sociedade do Irã – e mesmo assim eles podem ter dificuldades em conseguir que Ahmadinejad admita a verdade”, diz Barbara Slavin.

Ela orienta seus colegas a evitar o assunto do Holocausto, que, segundo ela, raramente causa respostas esclarecedoras, e focar em tópicos específicos e atuais.

A organização Campanha Internacional pelos Direitos Humanos no Irã já produziu um “guia para repórteres” de 56 páginas, dizendo como entrevistar autoridades iranianas.

O texto inclui um item de “mitos versus fatos” sobre o histórico de direitos humanos do país, traz sugestões de perguntas para Ahmadinejad e apresenta as suas respostas a perguntas feitas anteriormente.

Público admirador

O uso astuto que Ahmadinejad faz da mídia pode frustrar os seus oponentes, mas isto importa?

O seu alvo principal é a opinião pública no Irã, embora a opinião lá seja tão polarizada que não exista algo como votos oscilantes a serem conquistados.

Ahmadinejad se orgulha da sua liderança em termos de opinião nos países em desenvolvimento, mais notadamente no mundo árabe. É lá que os seus comentários sobre o Holocausto e a existência de Israel têm um público admirador.

Mas também existe algo como uma batalha sendo travada pela opinião junto ao público escolarizado do Ocidente.

Muitos liberais e oponentes do governo americano são receptivos às suas acusações de “dois pesos e duas medidas” contra as democracias ocidentais.

Às vezes, eles parecem mais inclinados a dar ao iraniano o benefício da dúvida do que a seus próprios governantes.

Por exemplo, enquanto a maioria dos iranianos têm opiniões claras sobre se a reeleição de Ahmadinejad foi fraudada, os ocidentais ainda se debruçam sobre as provas e reexaminam as estatísticas.

Existe uma opinião corrente no Ocidente de que as acusações de fraude são simplesmente propaganda projetada para “amaciar” a opinião pública antes de um ataque ao Irã.

Isto nem sempre ocorre a favor de Ahmadinejad.

Críticos da postura do Irã frente aos direitos humanos causaram problemas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois que ele tentou mediar a disputa em torno do programa nuclear iraniano e pareceu, para alguns, sair em defesa de Ahmadinejad.

Além disto, o Irã claramente se mostrou constrangido e desprevenido pela recente controvérsia sobre apedrejamento, algo que atinge o âmago das tentativas de Ahmadinejad em retratar a sua República Islâmica como mensageira de valores novos e mais puros para o mundo.

E assim continua a batalha pelas opiniões sobre o Irã. Enquanto apoiadores e oponentes de Ahmadinejad acreditarem que a verdade está do seu lado, nenhum parece prestes a obter uma vitória fácil.