Para os especialistas em educação, reunidos nesta segunda-feira no debate ‘A Capacidade do Brasil – O Papel da Educação’, promovido pela BBC Brasil e pela rádio CBN, o Brasil precisa melhorar a qualidade das universidades e fazer com que seus cursos atendam às necessidades do mercado.

Segundo eles, o país forma hoje muito mais profissionais nas áreas de humanidades do que na de exatas, em um momento em que há uma grande procura por engenheiros e técnicos para alavancar o investimento principalmente na área de infraestrutura.

A diretora-executiva da Fundação Lemann, Ilona Becskeházy, lembrou que o Brasil precisa urgentemente de mais médicos, engenheiros e profissionais na área técnica. “É isso que vai melhorar a qualidade de vida do país. Se não tomarmos essa decisão e fizermos um trabalho estratégico de formação nessas áreas – inclusive de mais professores de matemática e ciência na educação básica – a gente não dá esse salto e vai para o auto-engano.”

Segundo Becskeházy, a tendência no ensino superior em favor da área de humanas resulta em uma ampliação do número de estudantes nas universidades, mas isso não se reflete em aumento da capacidade técnica e de inovação do país. “Não temos mais lugar para tanto psicólogo e sociólogo. Depois, eles ficam criando matérias no ensino médio para empregar essas pessoas.”

Cursos baratos

A proliferação dos cursos de humanas, segundo especialistas, também se dá porque eles são mais baratos, pois necessitam de menos laboratórios e menos professores capacitados. A diretora da Fundação Lemann disse ainda que esses cursos são cada vez mais populares por serem “os únicos que o aluno que não aprendeu quase nada na educação básica tem condição de fazer”.

O economista Naércio de Menezes Filho, professor da FEA-USP e do Insper, afirmou que isso faz com que a mensalidade nos cursos de humanas seja mais barata. “E, tendo em vista a necessidade cada vez maior de diploma, o mais fácil é cursar uma dessas faculdades.”

O professor disse, porém, que o cenário está mudando, já que há alguns anos uma pessoa formada ganhava 2,5 vezes mais do que quem não tinha um diploma. “Hoje, essa diferença está caindo, indicando que o mercado começa a ficar saturado de profissionais nessa área (humanas).”

Nas áreas em que há demanda, os salários, segundo Menezes, continuam altos. “Precisamos ter condições de lidar com infraestrutura – cursos como engenharia operacional e de produção – para poder desenvolver o país”, afirmou o professor.

Déficit

Mozart Neves Ramos, da ONG Todos pela Educação, citou dados para corroborar a opinião dos outros dois debatedores: “O Brasil forma apenas 30 mil engenheiros por ano. A China, 300 mil”.

Ele disse ainda que as faculdades são muito elitizadas, já que só 13% dos jovens brasileiros estão na universidade, enquanto na União Europeia esse índice chega a 80%.

Para Ramos, outro problema grave é que as universidades se afastaram muito da formação de professores da educação básica. “E isso impacta naturalmente nesses 13%, que têm um nível muito abaixo do que se esperaria”, disse. “Ou a faculdade se volta para a Educação Básica, aprimorando a formação de professores, ou temos de repensar o papel das universidades como um todo.”

Menezes destacou que o ensino superior também sofre com um problema distributivo, já que no setor público gasta-se cerca de R$ 12 mil por aluno desse nível educacional, enquanto no ensino Básico o gasto é de R$ 2 mil. “Ou seja, gastamos muito com quem tem condições de pagar e pouco com quem não tem condições”, disse.

Universidades

Os três debatedores concordaram que a qualidade das universidades ainda é precária. “O ensino superior reflete a má qualidade da educação básica”, disse Becskeházy.

Ela acredita que o sistema está todo contaminado desde a base. “Quando você chega ao ensino superior, meia dúzia de faculdades selecionam os melhores alunos. As outras vão pegar o restante, que não aprenderam praticamente nada na educação básica.”

Menezes ressaltou o fato de haver faculdades muito ruins entre as particulares. Ainda assim, ele é contra o fechamento de cursos, pois acredita que cabe ao MEC mostrar aos alunos por meio do Enade (o antigo Provão) a qualidade de cada faculdade e deixar para o candidato escolher se ele vai ou não cursá-las.

O debate, realizado no Espaço Reserva Cultural, em São Paulo, foi o segundo da série “O Futuro do Brasil”. O próximo encontro acontece na segunda-feira (dia 27) e tem como tema “O Brasil no Mundo – Política Externa e a Defesa do Meio Ambiente”.

Participarão do encontro Ricardo Seitenfus, representante da OEA no Haiti, o ex-ministro das Relações Exteriores Luiz Felipe Lampreia, José Eli da Veiga, professor da Faculdade de Economia da USP, e Sergio Besserman, professor de Economia da PUC-RJ.