A antiga Fazenda Imperial de Santa Cruz – que originalmente tinha uma área duas vezes maior que a da cidade do Rio de Janeiro – representa hoje um dos maiores desafios de regularização fundiária urbana enfrentados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Dos 225 mil hectares iniciais, restaram 80 mil hectares a serem regularizados, divididos em 60 mil propriedades, onde vivem cerca de 200 mil pessoas.
A grande maioria não tem o título de posse da terra, que é vendida apenas com registro de transferência de cessão de direitos. A situação acaba travando o desenvolvimento da imensa área, que abrange parte da zona oeste do Rio e mais oito municípios, pois grandes empresas que desejam se instalar no local esbarram na fragilidade jurídica da área. Da mesma forma, os moradores não podem oferecer os imóveis como garantia para conseguir financiamento bancário e investir em projetos agropecuários.
O quadro de incerteza do local – que depois da República passou a se chamar Fazenda Nacional de Santa Cruz – já atravessou três séculos e ainda não chegou ao fim. O Incra já contou com um departamento com 80 técnicos, voltados unicamente para regularizar os títulos de posse, mas o ritmo do trabalho diminuiu na década de 90. O único funcionário que manteve o projeto ativo se aposentou este ano. Para que o conhecimento não se perdesse, Josemar Costa de Oliveira treinou um novo grupo de servidores com a missão de dar continuidade ao processo.
“É um trabalho hercúleo. Temos um acervo enorme sobre a fazenda. Alguns livros datam de 1814. A situação é uma bagunça fundiária. Temos áreas já desvinculadas do patrimônio da União, áreas pertencentes ao Poder Público, mas não ao Incra, como a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e a Casa da Moeda, áreas de ocupação e áreas que foram frutos de reforma agrária”, citou Josemar.
A confusão começou ainda no Império, quando eram concedidas autorizações aos agricultores para ocupação de parte da fazenda. Em troca dessa permissão, eles pagavam um valor anual, o foro. Com a proclamação da República, em 1889, as terras passaram para o acervo federal. Por sucessivos decretos, a União foi regularizando parte das propriedades, até a criação do Incra, que assumiu a tarefa. Atualmente a fazenda abrange áreas dos bairros de Santa Cruz e Sepetiba, no Rio, e dos municípios de Itaguaí, Seropédica, Paracambi, Japeri, Engenheiro Paulo de Frontin, Mendes, Piraí e Rio Claro.
Em Seropédica, 80% do território pertence à Fazenda Nacional ou são terras públicas. Só ali, segundo o técnico, cerca de 10 mil propriedades precisam ser regularizadas. Toda a região foi valorizada recentemente, pois se tornou um grande polo de desenvolvimento com a construção de siderúrgicas, estaleiros, usina nuclear, portos e rodovias. Por conta disso, muitas empresas têm procurado o Incra para saber se as áreas são regularizadas.
“É interessante para o município incentivar a regularização, porque uma empresa que quiser se instalar ali pode comprar terras, pedir financiamento, ter incentivo fiscal. Toda a região é estratégica, pois o Arco Metropolitano passará por lá, é próximo ao Porto de Itaguaí e ao Rio de Janeiro e tem ligação com São Paulo.”
Para Josemar, além de incentivar a economia regional, a regularização fundiária da imensa área tem um significado ainda maior. “Para essas famílias, a regularização é a emancipação da cidadania, ao terem o registro de imóveis de sua terra.”
O morador que quiser obter informações sobre a regularização de terras deve procurar a Divisão de Ordenamento Fundiário do Incra, na sede do Rio, pelo telefone (21) 2224-5561.