A declaração de bens e evolução patrimonial de Ricardo Teixeira serão decisivas para provar se algum dia ele realizou lavagem de dinheiro no Brasil. O procurador da República Marcelo Freire, que pediu a investigação por evasão de divisas contra o dirigente, fez uma série de exigências à Polícia Federal para que o novo inquérito contra o presidente da CBF e do Comitê Organizador Local da Copa 2014 não seja enfraquecido na origem por detalhes técnicos.
As investigações devem começar ainda esta semana e os policiais terão 90 dias para concluir o relatório, segundo ofício do MPF enviado à Superintendência de Polícia Federal fluminense. O prazo poderá ser prorrogado, caso seja necessário.
O MPF decidiu pedir investigação contra Teixeira com base em representação apresentada pelo Partido Republicano Brasileiro, junto à Procuradoria Geral da República, em Brasília, em junho. O caso foi transferido para o Rio de Janeiro, onde funciona a sede da CBF e residência oficial do dirigente.
A Delegacia de Crimes Financeiros deverá levantar, por exemplo, se a empresas Sanud e RLJ (dirigidas por Ricardo e pelo irmão procurado, Guilherme) ainda mantêm registros atualizados na Junta Comercial do Rio de Janeiro. O tópico é importante na investigação porque a Sanud, que tem base no Exterior, ‘investiu” cerca de US$ 600 mil no Brasil, usando o sistema de empréstimo internacional para o caixa da RLJ, empresa de Ricardo Teixeira.
As duas empresas são de Ricardo Teixeira, mas é possível que ele não tenha feito negócios apenas com o irmão Guilherme, procurador da empresa no Brasil e seu homem de confiança. Guilherme também será interrogado por lavagem de dinheiro. Há fortes indícios de que a Sanud teria sido fechada em 1999, pouco depois da saída de João Havelange da presidência da Fifa, em 98.
Os Senadores que investigaram a CBF por meio da CPI do Futebol (entre 2000 e 2002) já haviam descoberto que as duas empresas “eram empresas de fachada”, escreveram os senadores. O empréstimo de US$ 600 mil feito pela Sanud como investimento na RLJ também foi de fachada: o dinheiro entrou como “investimento estrangeiro” mas desapareceu como empréstimo, que nunca foi pago.
ALGUMAS EMPRESAS ENVOLVIDAS EM SUBORNO, SEGUNDO JUSTIÇA SUÍÇA
Sanud | 8,5 mihões | de 16/02/93 a 28/11/97 |
Beleza | 1,5 milhão | de 27/03/91 a 01/11/91 |
Ovada | 820 mil | 22/01/1992 |
Wando | 1,8 mihão | de 06/07/89 a 22/01/93 |
Sicuretta | 42,4 mihões | de 25/09/89 a 24/03/99 |
Um trecho do extenso relatório da CPI do Futebol denuncia operações financeiras entre os irmãos Teixeira e as empresas Sanud e RLJ Participações.
“Esses procuradores, um dos quais Guilherme Terra Teixeira, irmão de Ricardo Teixeira, representaram seus próprios interesses e os de Ricardo Teixeira… Há irrefutáveis evidências de que houve desvio de recursos da Sanud nas relações financeiras com a RLJ Participações…Há inegáveis evidências de que Ricardo Teixeira e os procuradores da Sanud no Brasil estiveram de pleno acordo em dar o destino que se deu aos US$ 599.964,00”.
A coincidência da trama financeira foi descoberta parcialmente pela Justiça suíça. Os senadores brasileiros e o Ministério Público ainda não sabem oficialmente o que os suíços descobriram: a Sanud, empresa investigada em 2000, já estava na lista negra de suborno atribuída a executivos da Fifa, desde 1993.
A Sanud encontrada pelos senadores é a mesma encontrada pela Justiça suíça, na lista de propinas da Fifa para compra de votos de países-sede de copas do mundo. Há suspeitas de comissões recebidas por venda de direitos exclusivos de transmissão dos eventos da Fifa.
A Sanud,empresa ligada a Ricardo Teixeira e talvez a João Havelange, recebeu US$ 8,5 milhões em quatro anos, de 93 a 97. Havelange foi o presidente da Fifa entre 1974 e 1998. Sepp Blatter, hoje chefão do futebol mundial, era seu secretário-geral. A tabela abaixo mostra um grupo de operações ocorridas durante os mandatos de Havelange.
A lista negra traz uma linha de tempo curiosa com outras empresas envolvidas em recebimento de propinas. Interesse especial nos nomes como Wando, Beleza, Ovada e Monarde. Essas quatro empresas desaparecem das operações com a entrada da Sanud, em 93, sugerindo uma passagem de bastão ou consolidação de empresas interessadas no dinheiro da Fifa. Destaque para Sicuretta que recebeu, segundo investigadores europeus, US$ 42,4 milhões em dez anos, de 1989 a 1999, meses após a saída de Havelange da presidência da entidade.
Wando, Beleza, Ovada e Monarde saem de cena e entram a Sanud e Sicuretta dando sequência aos depósitos milionários ilegais.
Segundo o jornalista escocês, Andrew Jennings, que investigou as operações nebulosas da Fifa e publicou o livro Jogo Sujo, no Brasil, em junho último, Ricardo Teixeira e João Havelange teriam devolvido cerca de US$ 9 milhões (recebidos supostamente de maneira ilegal) para trancar ação criminal na Suíça.
O valor mencionado por Jennings (também em um documentário feito para a BBC de Londres) é próximo de tudo o que foi repassado para a Sanud entrejaneiro de 93 e novembro de 97, pouco antes da saída de Havelange da presidência da Fifa.
Agora, o Ministério Público Federal quer descobrir quem está por trás das outras empresas da lista, batizadas em bom Português, como se fossem códigos indecifráveis em países europeus.
O Ministério Público Federal quer saber também se parte desses repasses milionários entrou no Brasil via Sanud para beneficiar Ricardo Teixeira e seu irmão, Guilherme, como lavagem de dinheiro.