O futuro prefeito de São Paulo herdará, a exemplo de seus últimos três antecessores, o caso mais grave de endividamento entre os maiores orçamentos do país.
Desde a década passada, a dívida paulistana se mantém em patamar igual ou superior ao dobro da receita anual do município, muito acima do teto fixado pela legislação.
Proibida pela Lei de Responsabilidade Fiscal de obter novos empréstimos, a prefeitura não consegue acompanhar o ritmo de expansão dos investimentos públicos dos últimos anos.
A dívida soma R$ 58 bilhões, a maior parte dela com a União, que socorreu financeiramente a cidade em 2000, quando a dívida, na casa dos R$ 11 bilhões, era tida como impagável com os juros da época. Pelos limites legais, o valor não deveria ultrapassar R$ 35 bilhões, ou seja, 120% da receita de R$ 29 bilhões contabilizada em 2011.
Nenhuma das demais grandes metrópoles do país se aproxima desses números. No Rio de Janeiro e em Salvador, as dívidas ficam em torno de metade da receita. Em Belo Horizonte, de um terço.
A julgar pelo discurso dos candidatos, o futuro prefeito tentará, como seus antecessores fizeram sem sucesso, rever o contrato da dívida com a União –cujas condições, de início, eram muito mais favoráveis que as oferecidas pelo mercado.
Proibida de tomar crédito, a Prefeitura de São Paulo não tem acesso aos recursos oferecidos por bancos públicos e instituições internacionais para financiar obras de urbanismo, transportes e projetos ligados, por exemplo, à Copa.
O custo da dívida e o baixo nível de investimento prejudicam a gestão das contas de São Paulo, embora o município ostente bons resultados de arrecadação e controle dos gastos com pessoal.
Do orçamento do ano passado, os investimentos paulistanos somaram pouco mais de R$ 3 bilhões, enquanto juros e amortização da dívida chegaram a R$ 3,5 bilhões.
ESCALADA
A escalada da dívida se deu em meio a embates e negociações entre as forças políticas que ocuparam o poder desde a década de 90 e cujos herdeiros hoje encabeçam a disputa eleitoral.
A prefeitura liderou o crescimento da dívida de Estados e capitais do país no mandato de Paulo Maluf (hoje PP), encerrado em 1996.
A conta comprometeu a gestão de seu sucessor, Celso Pitta, que teve o atual prefeito, Gilberto Kassab, como secretário de Planejamento.
Pitta renegociou a dívida graças ao socorro do governo Fernando Henrique Cardoso, do qual o tucano José Serra era ministro da Saúde.
Em 2000, Maluf perdeu as eleições na capital para Marta Suplicy (PT). Também fracassou sua intenção de eleger Celso Russomanno prefeito de Santo André.
Marta, na prefeitura, avaliou impossível pagar 20% da dívida até 2002, opção dada pelo governo federal do PSDB para estimular privatizações. Com isso, os juros subiram de 6% para 9% ao ano.
Então candidato à Presidência em 2002, Luiz Inácio Lula da Silva defendia a revisão dos contratos de endividamento entre União, Estados e municípios, promessa que descumpriu.
Em 2011, a Prefeitura de São Paulo levou ao Tesouro Nacional proposta para rever sua dívida, de novo considerada “impagável” hoje pela administração municipal.
Em 2030, fim do prazo estipulado para o pagamento da dívida, São Paulo terá pago R$ 170 bilhões e, ainda assim, ficará com um saldo devedor de R$ 215 bilhões, calcula o secretário municipal de Finanças, Mauro Ricardo, que também ocupou o cargo na gestão de José Serra.
“Além de comprometer recursos significativos do orçamento, [a forma de cobrança] não está resolvendo o problema do endividamento.”
A prefeitura sugeriu pagar hoje os 20% que não conseguiu em 2002 e, com isso, baixar novamente os juros para 6% ao ano. Pelas contas de Ricardo, isso reduziria a dívida com a União imediatamente de R$ 58 bilhões para R$ 25 bilhões.
Mas, para dar certo, a prefeitura paulistana teria que pegar emprestados recursos no exterior, o que hoje não pode fazer. Para isso, defende também a mudança dos limites de endividamento dos municípios. Segundo Ricardo, o governo federal não deu resposta ao pedido e mantém negociação com outros Estados, que também pleiteiam a revisão de suas dívidas.
O imbróglio, reconhece o secretário, ficará sem solução na sua gestão, e ele tem apenas uma recomendação ao próximo governante paulistano: “Continue insistindo