Indígenas, organizações indigenistas e produtores rurais acompanham o julgamento de um dos itens pevisto na pauta da sessão plenária do Supremo Tribunal Federal (STF) de hoje (31). O item trata dos pedidos de esclarecimento às dúvidas que restaram do julgamento que, em 2009, manteve a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, em terras contínuas. A resposta dos ministros é condição fundamental para indicar a validade ou não da Portaria nº 303 da Advocacia-Geral da União (AGU).
Publicada em julho deste ano com o objetivo de regulamentar a atuação dos advogados e promotores públicos, a portaria obriga que todas as 19 condicionantes impostas para a manutenção da demarcação da Raposa Serra do Sol sejam observadas e cumpridas em todos os processos demarcatórios, inclusive para os já finalizados. A portaria reflete o entendimento da AGU sobre o que teria sido definido pelo STF em 2009.
Diante da reação contrária de órgãos públicos, como a Fundação Nacional do Índio (Funai), e de comunidades indígenas de todo o país, a entrada em vigor da portaria acabou sendo suspensa até que o STF se manifestasse sobre o assunto, julgando os pedidos de esclarecimentos, os chamados embargos de declaração, apresentados por diversos setores.
Para o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto, os conflitos entre comunidades indígenas e proprietários rurais irão se intensificar, caso o STF confirme a interpretação da AGU e a validade da portaria.
“Entendemos que isso reabriria e potencializaria uma série de conflitos fundiários para além do que já verificamos atualmente”, disse Buzatto à Agência Brasil, destacando que, entre outras coisas, a Portaria nº 303 prevê a possibilidade de que processos demarcatórios já concluídos sejam reabertos e revistos.
“Estamos bastante confiantes de que o julgamento dos embargos de declaração esclareça de vez a interpretação [da AGU]; que o Supremo possa, de uma vez por todas, esclarecer que as condicionantes são restritas e se aplicam única e exclusivamente para o caso da Raposa Serra do Sol, não podendo atingir aos direitos constitucionalmente garantidos de usufruto permanente e exclusivo dos povos indígenas sobre suas terras”, concluiu Buzatto.
Produtores rurais e representantes do setor agropecuários também viajaram a Brasília para acompanhar o julgamento. Para a Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), a apreciação dos embargos poderá resultar em uma mudança de postura da União nos processos relacionados à questão indígena, impedindo os advogados públicos e promotores de “defenderem teses contrárias às diretrizes do Supremo.”
Em nota, o presidente da entidade, Eduardo Riedel, destaca a importância do julgamento. “As diretrizes não trazem nenhum prejuízo aos indígenas, apenas colocam os territórios ocupados por eles dentro das mesmas normas que regem a nação”, assinalou Riedel. “A sociedade precisa estar atenta, buscar informações e avaliar de modo crítico e consciente. O julgamento do caso Raposa Serra do Sol demandou exaustivas análises e esforços por parte do STF, a mais alta Corte e, portanto, a mais preparada para decidir assuntos dessa natureza.”
O presidente do STF, Carlos Ayres Britto, decidiu inverter a pauta prevista para hoje. A sessão começou com listas de recursos de menor importância, e em seguida, Britto votou sobre um processo envolvendo lei do Rio Grande do Sul a respeito da contratação de softwares. No entanto, o processo não terminou porque houve pedido de vista. Depois, foram convocadas duas ações sobre uso de amianto na indústria nacional. O assunto é complexo e conta com a exposição de vários advogados de partes interessadas, o que torna imprevisível a duração do julgamento.