Em meio a uma fila de carros parados, uma mulher -blusão vermelho e uma faca na mão -atravessa a rua, passa por trás de um veículo e escolhe uma vítima.
Dentro de um Fiat Punto preto, vidro aberto, uma motorista pacientemente aguarda os carros andarem.
A assaltante, com a faca em punho, encosta e anuncia o roubo. A motorista reage e as duas começam a lutar pela janela do veículo.
Logo atrás -num Fiat Idea prata- o auxiliar de RH Diego Oliveira, 35, vê e decide ajudar. Ele desvia da fila de carros, emparelha com o Punto e acelera devagar, prensando a assaltante entre os dois veículos.
As mulheres continuam a brigar, até a faca da assaltante cair no chão.
Encurralada pelos carros, ela se joga no asfalto. Os dois carros aceleram e a mulher, sem levar nada, recolhe sua arma e vai embora, andando.
Essa tentativa de roubo, flagrada pela Folha, durou menos de um minuto na manhã de ontem, na ligação Leste-Oeste, em um ponto no Glicério, região central de SP.
“Minha intenção não era machucar, queria segurá-la para a motorista fugir ou até a polícia chegar”, diz Diego, que afirma não ter visto se a assaltante estava armada.
A reportagem não conseguiu localizar a motorista.
GANGUE
Comerciantes e moradores do Glicério reclamam da falta de policiamento e dizem que o bairro é ponto de assaltos constantes. Em geral, os roubos são feitos sem armas de fogo e as vítimas costumam ser mulheres -em carros ou a pé.
Uma gangue de ao menos 15 pessoas atua em cruzamentos do Glicério em horários de pico, dizem moradores.
“Aqui [Glicério] tem roubo todo dia, para carro no farol, eles chegam e assaltam”, afirma um mecânico, que tem uma oficina no bairro.
Ele diz que já roubaram peças de seu comércio e a bateria de seu Fusca 1974 diversas vezes. “Agora, quando estaciono por aqui, tiro a bateria do carro e a levo comigo.”
O grupo, que se reúne em uma padaria local, aproveita os congestionamentos para roubar bolsas e celulares.
Para quebrar os vidros dos veículos, os ladrões arremessam velas de ignição -objeto de cerâmica e metal- retirados de outros carros.
Mas nem só os motoristas são alvos dos ataques. Ontem, a operadora de caixa Camila Gonçalves, 19, chegou chorando ao supermercado Extra, no Glicério, onde trabalha.
Pouco depois de descer na estação Parque D. Pedro do metrô, ela foi abordada por um assaltante “bem vestido, até”.
“O cara segurou meu braço e disse: ‘nem pense em fugir, passa a bolsa e o que está no bolso'”, diz Camila.
Como ele não estava armado, ela correu e abraçou um idoso que passava pela rua. “Me leva pro Extra, por favor”, pediu ao desconhecido.
Para evitar assaltos, após o supermercado fechar, funcionários dizem que vão em grupo para a estação do metrô.
“É abandonado, a polícia raramente passa”, afirma um estoquista do Extra, que prefere não se identificar.
Os roubos na área do 1º DP, onde são registrados os crimes do Glicério, subiram 11,76% em junho em relação ao mesmo mês de 2012. Neste ano foram 304 casos. Procurada pela Folha, a PM não respondeu até a conclusão desta edição.