Uma viagem de 1.600 quilômetros, 20 horas de estrada, duas paradas para abastecer o carro, refeições de biscoito, banana e água. Assim o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato chegou à fronteira do Paraguai há cerca de 50 dias. O automóvel, porém, não passou para o lado de lá: ainda em território brasileiro, Pizzolato despediu-se do amigo que o levava, atravessou a pé a linha imaginária entre os dois países e embarcou em outro veículo, que já o esperava.

Foi para Buenos Aires, na Argentina, onde, já com outra via do passaporte italiano – a primeira fora entregue à Justiça do Brasil, com o documento brasileiro -, tomou um voo para o país europeu. A jornada de Pizzolato para escapar ao cumprimento da sentença, que considera injusta, de 12 anos e 7 meses de prisão no processo do mensalão, feita em segredo, começara às 4h30 da manhã anterior à chegada à fronteira.

O ex-diretor do Banco do Brasil saiu discretamente do prédio onde morava, em Copacabana, na zona sul do Rio, sem bagagem e levando consigo um pen drive, com cópia de um dossiê que elaborou com sua história desde a campanha eleitoral que elegeu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, além de detalhes da ação penal em que foi condenado. Tenso, preferiu deixar a direção com o amigo: não se sentia em condições emocionais de dirigir.

Pizzolato decidiu deixar o Brasil em direção à Itália depois do 7 de setembro. Pouco antes, no dia 4, o Supremo Tribunal Federal rejeitara seus primeiros embargos de declaração – tipo de recurso que questiona a clareza das decisões – à sentença que o condenara à prisão por peculato (apropriação criminosamente, por servidor, de dinheiro público), lavagem de dinheiro e corrupção passiva.

Pouco depois, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, outro dos réus condenados no processo do mensalão, reuniu amigos em sua casa, para acompanhar pela televisão uma sessão da Corte que examinava o seu caso e admitiu concretamente a possibilidade de ir para a cadeia.

Foi mais um sinal assustador para Pizzolato: o mais graduado dos petistas no processo admitia publicamente que seria preso. “O que vai ser depois da condenação?”, preocupava-se o ex-diretor do Banco do Brasil em conversas com amigos próximos.

Plano

A operação secreta que retirou Pizzolato do Brasil foi arquitetada com ajuda de um grupo restrito. Seria, porém, do conhecimento prévio de alguns petistas, entre eles Dirceu.

Ao saber da disposição do ex-diretor do Banco do Brasil de deixar o Brasil e continuar lutando por sua absolvição na Itália, o ex-ministro da Casa Civil, condenado a mais de dez anos por comandar o mensalão, não teria se oposto, embora não soubesse de detalhes do plano.

O próprio Dirceu descartou a possibilidade – aventada – de fugir do País para a Venezuela ou para Cuba, países em cujos governos o ex-ministro cultiva boas relações e de onde já colhera sinalizações de solidariedade, diante da condenação à prisão anunciada pelo Supremo.

Antes da partida, ocorrida alguns dias depois do 7 de setembro, Pizzolato, que tem dupla nacionalidade – brasileira e italiana -, fez algumas avaliações. Uma das mais importantes envolveu o tratado de extradição Brasil-Itália, que desobriga as partes de extraditar para a outra seus nacionais e abre a possibilidade de abertura de novo processo, de acordo com a respectiva legislação local.

Esse mecanismo era justamente o que o ex-diretor do BB queria para que seu caso fosse examinado, segundo argumenta, apenas sob a ótica jurídica. O tratado também não permite a extradição se houver motivos para acreditar que o extraditado sofrerá algum tipo de perseguição política.

Outra avaliação envolveu possíveis represálias, como confisco de bens e bloqueio de aposentadoria. O único bem de vulto que o ex-diretor possui, segundo seus amigos, é a cobertura na Rua Dias Ferreira, em Copacabana, cujo bloqueio não o afeta imediatamente.

Pizzolato foi condenado ao lado de outras 24 pessoas no ano passado.

Segundo o Supremo, ele participou de um esquema de desvio de dinheiro do Banco do Brasil, por meio de contratos da Visanet – sistema de pagamento via cartão -, para abastecer o caixa do empresário Marcos Valério, que repassava o dinheiro para parlamentares da base aliada do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, entre 2003 e 2005. A defesa do ex-diretor do banco estatal afirma que os contratos da Visanet com as agências de publicidade de Valério eram legais e todos os serviços foram prestados. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.