A presidente Dilma Rousseff afirmou não acreditar que a crise na Argentina venha a ter “consequências muito significativas” para o Brasil, mas não deixou de acrescentar: “Estou atenta, bastante atenta”.

O comentário foi feito durante a conversa que a presidente brasileira manteve em Davos com integrantes do International Media Council (IMC), criado pelo Fórum Econômico Mundial para reunir cerca de cem jornalistas que o evento considera influentes global ou regionalmente.

Dilma teve imenso cuidado em não dizer nada que mostrasse excessiva preocupação com “a crise que afeta a Argentina”. Previu até que, com a recuperação da economia mundial e a iminente comercialização da safra argentina de grãos, “vai aumentar o grau de liberdade de gestão da economia argentina”.

Tradução: a entrada de dólares pelas exportações pode retirar pressão do mercado cambial.

De todo modo, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio tem opinião mais pessimista do que a necessariamente cautelosa presidente, ao antever um barateamento da produção argentina, pela queda do peso, e o encarecimento dos produtos que o Brasil exporta.

Mesmo Dilma deixou claro que já está havendo “um rearranjo no comércio com a Argentina, com a redução do fluxo de comércio”, que só tende a se acentuar se a crise não for passageira.

TOM UFANISTA

Tanto na conversa com os jornalistas do IMC como no pronunciamento em sessão plenária, pouco antes, Dilma adotou um tom ufanista, jogando sobre a plateia uma catarata de dados positivos sobre a economia brasileira e sobre a inclusão social.

Antes, Klaus Schwab, que preside o fórum, já havia preparado o terreno para Dilma, ao mencionar a inclusão como característica relevante do seu governo, citando os 36 milhões de brasileiros que a administração diz ter retirado da extrema pobreza e os 40 milhões que ingressaram na classe média.

Como o objetivo de Dilma ao vir a Davos pela primeira vez, depois de ter recusado os três convites anteriores, era o de desmanchar a insatisfação de executivos e de economistas ortodoxos com suas políticas, o discurso dela tocou música para os ouvidos desse público. Assim:

1 – “O controle da inflação e o equilíbrio das contas públicas são requisitos essenciais para a estabilidade”;
2- “Conhecemos o valor destrutivo do descontrole de preços”;
3 – “Responsabilidade fiscal é princípio basilar” [de sua política];
4 – “Temos um dos menores endividamentos públicos do mundo”. Citou a queda da dívida líquida de 41,2% do PIB em 2009 para 34% em 2013 e da dívida bruta de 60,9% para 58,5%;
5 – Reservas de US$ 376 bilhões formam “colchão seguro” contra a volatilidade.

Anunciou ainda uma nova etapa em que haveria “um ambiente estável e atrativo aos investidores”.

A partir daí engatou incontáveis números sobre necessidades de investimento, sempre destacando o papel relevante que ela diz conferir ao setor privado.

CRÍTICAS

As críticas à política econômica têm transitado principalmente pelas dúvidas sobre a sustentabilidade da política fiscal, uma vez que o governo recorre a truques para fazer superavit, e a uma eventual perda do controle sobre a inflação, que está perigosamente perto do teto da meta, que é de 6,5% ao ano (fechou 2013 em 5,91%).

É também criticado uma suposta tendência estatizante da presidente.

Na “nova etapa que o Brasil tem que passar necessariamente”, segundo Dilma, entra como prioridade “ampliar a produtividade”.

Passa também por enfrentar o desafio da educação, que a presidente considerou “a única maneira de perenizar a erradicação da miséria”.

Dilma justificou seu otimismo desabrido com a frase “é imperdoável para um presidente ser pessimista”.

O discurso colou ao menos com um importante executivo, José María Álvarez Pallette, o segundo homem da espanhola Telefónica, com presença forte no Brasil: “Fiquei muito satisfeito. Ela disse o que queríamos ouvir”.