O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo divulgou recentemente os resultados da décima edição do Exame do Cremesp cujas provas ocorreram em outubro último. O número de reprovados é alto e preocupante, refletindo a baixa qualidade do ensino da medicina no Estado de São Paulo e, quiçá, no Brasil, já que em 468 formandos de outros estados o resultado foi ainda pior.
Submeteram-se ao Exame 3.359 recém-formados. Dos 2.891 inscritos de São Paulo, 55% (1.589) tiveram média de acerto inferior a 60% ao conteúdo apresentado. Destaque-se que o exame é composto de questões fáceis ou medianas pela análise psicométrica clássica (Índice de Facilidade e Discriminação). Já entre os novos médicos de outros estados, a reprovação foi de 63,2% – indicativo que a situação, já
gravíssima em São Paulo, pode estar ainda pior.
Enfim, o baixo aproveitamento foi desalentador, ainda mais considerando o despreparo dessa safra de novos doutores em áreas fundamentais como clínica médica, pediatria, ginecologia, obstetrícia e cirurgia geral. Eles mostraram ignorância em questões simples como o atendimento inicial a vítima de acidente
automobilístico, a vítimas de ferimento por arma branca, casos de
pneumonia na comunidade, pancreatite aguda e colelitíase (pedra na vesícula).
Das 42 escolas do estado de São Paulo, 30 participaram da avaliação. As 20 piores colocações ficaram com as instituições privadas. Absurdo! Cobram mensalidades entre R$ 6 e R$ 9 mil, mas não oferecem em contrapartida formação adequada àqueles que investem no sonho de ser médico. Isso é preocupante porque a maioria desses novos graduados em breve estará na linha de frente da assistência médica em Pronto Socorro e Pronto Atendimento. Houve curso cujos alunos não ultrapassaram 13% de acertos.
Como o Exame do Cremesp não pode, por força da legislação, impedir ninguém de ser médico, por mais desqualificado que seja esse profissional, o ônus da má-formação recai sobre os cidadãos. Somos nós, nossos filhos, pais, parentes e amigos
que estaremos correndo risco ao ser atendido por um desses médicos.
O Conselho de Medicina fará sua parte dentro do que lhe é possível.
Os resultados são entregues individualmente e em caráter confidencial aos novos médicos. As escolas também receberão relatório detalhado sobre o desempenho de seus alunos, para que tenham a possibilidade de aperfeiçoar seus cursos. Os dados ainda serão disponibilizados aos ministérios da Educação e da Saúde, Conselho Federal de Medicina, Câmara dos Deputados, Senado Federal, Ministério Público e Conselhos Nacionais de Saúde e Educação.
Esperamos que cada uma dessas instâncias cumpram seus papéis, intervindo e envidando esforços para mudar o atual panorama do ensino da medicina. O Exame do Cremesp deixa escancarado que é inadequada a maneira como o governo
avalia as escolas médicas. A título de exemplo, a já citada escola médica que teve apenas 13% de aprovação na presente avaliação do Exame do Cremesp possui resultado satisfatório no Enade. Esse último exame é utilizado pelo Ministério da Educação (MEC) para avaliação.
Evidentemente há pouca disposição de mudança em boa parte das escolas médicas privadas. Elas, inclusive, não esboçam interesses em serem avaliadas, pois isso significaria mais investimento no corpo docente, em laboratórios e biblioteca médica. Hoje, mais de 80% dos cursos privados do estado de São Paulo não têm hospitais-escola.
Finalizando, da mesma forma que existe avaliação obrigatória para exercer a profissão de advogado e contador, propugnamos que também deve haver uma prova obrigatória para os recém-graduados em Medicina. Ou as planilhas e processos são mais importantes do que a saúde e a vida? Não, a resposta só pode ser um rotundo Não!
*presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo.