A presidente Dilma Rousseff possui certamente uma significativa porção de patrimônio genético cigano. Aliás, grande parte do povo brasileiro participa dessa ancestralidade por vezes maravilhosa, do coletivo solidário dos parceiros étnicos, da música lânguida ainda que a expressar tristezas, dramas pessoais ou coletivos que não faltaram em suas sagas, vítimas da crueldade por séculos pelo cultivo de costumes típicos e de padrões éticos bem distintos da ética cristã e ocidental. A Espanha e a Romênia, terra dos gens da presidente, foram as primeiras nações europeias a recepcionar, não sem cruéis perseguições, esse povo misterioso, vindo do húmus do Nilo, porém sem dar duro. O subscritor destas observações tem radicais em Jaen, outrora centro cigano da Espanha, de modo que é insuspeito para falar dessa raça de seres inteligentes, improvisadores, porém inclinados a pôr em primeiro plano seus interesses pessoais e de seus clãs. Não nasceram para administrar outras nações, os demais segmentos de seus territórios sempre transitórios.
Nômades, suas sementes foram espalhadas pelo mundo, a tal ponto que, de seus métodos expeditos e invejáveis, podemos até mesmo suspeitar que o “jeitinho brasileiro”, tão reverenciado nestas plagas, tenha origem nesse povo de um Deus de plantão, cuja ética pouco compreendida levou 20 mil deles ao sacrifício no patíbulo nazifascista.
Entretanto, creio que até mesmo os acadêmicos especialistas na análise do povo cigano têm sérias dificuldades para erigir classificações teóricas. Somente seus atos, imprevisíveis e causadores de estupefação, ou de arrependimento ineficaz, por deles ter um ocidental politicamente correto incautamente se aproximado, podem nos dar pistas se o método gitano foi ou não inspirador de suas condutas.
No caso de nossa presidente, temos um sem-número de razões para dizer que se trata de uma cigana. E das boas. O que é bom para as tradições folclóricas e as magias que encantam as literaturas, mas não para a condução de um povo. E tampouco para o cumprimento da Constituição da República, que ela jurou: no mais puro estilo de sua raça.
Foi à luta armada contra a ditadura militar e não vive da lembrança dos massacres que sofreu na prisão. Assim pensa o cigano. Para que a memória das desgraças? O importante é o presente. E o futuro é de Deus, sempre inconstante. Ingressou no PDT e não tinha nenhuma chance face ao autoritarismo de Brizola. Mas, nele se manteve, ao contrário de muitos que debandaram em decorrência da ditadura partidária do caudilho dos pampas. Habilmente, se manteve. Até que caiu nas graças de Lula. Não se diga que é incurial um metalúrgico cair nas graças de uma cigana. Cumulava importantes cargos na República, inclusive a chefia da Casa Civil, e, ao mesmo tempo, a presidência do Conselho de Administração da Petrobras. Assinou um documento sem observá-lo e deu Passadena, milhões nos costados dos brasileiros. Não viu o que fez. Nenhum cigano vê o que fez, quando sua conduta não é objeto de valor moral. Tocam em frente.
Em seu primeiro mandato, fingiu-se de serva de Lula. Nenhum cigano é servo. Lula era político, ela fez e desfez no campo administrativo. E dê-se poder a um cigano: baixa o espírito do avô, do “paterfamilias” e todos os demais podem ser ouvidos, eventualmente, sem em nada influenciar a decisão do chefe adrede tomada. Assim, aumentou o número de Ministérios, enveredou por todos os campos, nomeou e escorraçou quando apareciam as denúncias. Ficou habilmente na retaguarda. Se os ciganos avançassem, os cárceres estariam lotados deles. O importante é o contra-ataque e jogar pelas pontas. Passeou alegremente como chefe do mercado, mas escolheu seus tópicos de beneficiários, ainda que se lascassem os demais. O cigano vive de expedientes, não o faça pensar em estruturas de longo prazo. As consequências do espontaneísmo estão aí, mas é parte do ritual.
Na campanha, não corou ao dizer que fez pacto com o diabo, o que é natural. Recebeu os votos dos socorridos pelo PT. Suficientes. Pouco importa se os centros esclarecidos a repudiaram. Um cigano não é repudiado: sua cultura é descoberta em mais um de seus múltiplos aspectos. Mentiu deslavadamente. Como cumprir os desígnios e ganhar o mundo sem mentiras? Se constatadas depois, pouco importa. O relógio da vítima já foi.
E o sorriso nos lábios do cigano persiste. Ciganos não são tristes. Suas lágrimas são como as nossas, mas carregam um excipiente de felicidade inabalável. Nada melhor para um presidencialismo de coligação incriteriosa que o comando de uma cigana. O futuro, bom ou mal, pouco importa. Não haverá renúncia e tampouco suicídio. Quantos ciganos deram cabo da própria vida, ainda que pilhados no que consideramos beco sem saída? Para eles, sempre haverá uma saída. Se a saída for do Palácio, compulsoriamente, não pelas mãos, mas pelos punhos do povo, Dilma Rousseff continuará verdadeira cigana. Compreender a ética dos gitanos não é para qualquer um. Enquanto isso, dançar uma música flamenga e fazer vibrar as castanholas é o que nos resta.

*advogado especialista em Direito Constitucional, Civil, Tributário e Coletivo do Trabalho.