A decisão inédita do Tribunal de Contas da União (TCU) de adiar o julgamento das contas de 2014 do governo federal representa uma nova forma de atuação do órgão, que deverá refletir também nos tribunais estaduais. De acordo com o relator da matéria, ministro Augusto Nardes, essa nova fase deve-se ao upgrade promovido pelas especializações da equipe técnica do tribunal.
Por unanimidade, o plenário do TCU adiou por 30 dias, a serem contados a partir de notificação, a análise das contas do governo federal, a pedido do relator Augusto Nardes. Segundo ele, as contas apresentadas “não estão em condições de ser apreciadas”. O prazo dado pelo TCU é para que a presidenta Dilma Rousseff e sua equipe esclareçam, por escrito ou pessoalmente, indícios apontados pelo tribunal de que teriam descumprido as leis de Responsabilidade Fiscal e Orçamentária Anual.
“A decisão é histórica porque os demais tribunais poderão nos seguir e não apreciar as contas. Esta é uma mudança de comportamento que todos querem. Espero que isso repercuta também nos tribunais dos estados. Isso dará sincronização do Estado brasileiro como um todo”, disse Nardes, que atribuiu a nova prática ao “upgrade [obtido] com as especializações da equipe do TCU”, que vêm sendo implantadas desde 2013. “Agora temos gente mais especializada e uma reserva intelectual que pode em muito auxiliar a nação. Temos agora bagagem para fazer auditorias que não fazíamos antes. Se antes não foi descoberto, é porque não tínhamos implantado isso”, afirmou o ministro. “Foi por meio dessa equipe que levantamos as pedaladas fiscais”, acrescentou.
O atraso de repasses do governo a bancos públicos para pagamento de programas sociais levanta a suspeita de que o governo tenha adotado manobras para maquiar R$ 40 bilhões das contas entre 2009 e 2014, conforme Nardes. “Só em 2014, foram cerca de R$ 7 bilhões”, disse o ministro. Segundo ele, até o momento, o TCU encontrou 31 itens com indícios de irregularidades. Desse total, 13 serão submetidos ao esclarecimento da presidenta. Além das manobras, Dilma terá de explicar a falta de contingenciamento de R$ 28,4 bilhões em despesas discricionárias da União, referentes a 2014. “Além de não ter feito esse contingenciamento, o governo liberou outros R$ 10 bilhões que não tinham previsão orçamentária”.
Nardes lembrou que muitos dos escândalos de corrupção que ocorrem no país poderiam ter sido evitados caso o governo tivesse dado ouvidos aos alertas emitidos pelo TCU em anos anteriores. “Estamos inaugurando um novo tempo. Essa situação que vivemos no país é decorrente, em muitos casos, dos alertas que fizemos, como por exemplo, foi o caso da Petrobras e das estatais que não estão aplicando corretamente os investimentos.”
O ministro destacou a importância da Lei de Responsabilidade Fiscal para a governança do país e para evitar que ocorram casos semelhantes aos bancos estaduais, e com as dívidas que eram repassadas da gestão de um governo a outro governo.
Em ocasiões anteriores, o ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, Nelson Barbosa, disse que esse fato representa, na verdade, “diferenças na interpretação jurídica” de algumas ações financeiras.