A divulgação por um grande jornal paulista da lista de salários da Unesp do mês de outubro de 2014, com a distorção de 28,6% devido ao abono salarial correspondente ao dissídio concedido naquele mês, gera uma série de reflexões sobre o vencimento do professor universitário das universidades públicas paulistas.

Em primeiro lugar, é necessário que se entenda a carreira acadêmica nas Universidades Estaduais Paulistas como resultado de um processo de qualificação e de mérito. Os salários que excedem o subsídio do governador do Estado (R$ 21.631,00) decorrem de três rotas: decisões trabalhistas, anos de permanência do professor na Instituição e carreira acadêmica que pode ser comparada a uma escada com seus degraus.
As decisões trabalhistas são atribuídas por lei, assim como os ganhos referentes aos anos de permanência no serviço público (quinquênios e sexta-parte). Os aumentos salariais decorrentes de concursos públicos provêm de aprovações pelos pares, não apenas os da própria Instituição, mas, também, de outras universidades brasileiras ou do exterior.
É preciso olhar o passado e valorizar tudo o que foi feito! O salário do professor universitário reflete o mérito acadêmico e a dedicação integral a uma universidade que no nosso caso completa 40 anos em 2016. A maioria dos nossos professores que está acima do chamado “teto do subsídio do governador” contribuiu para construir e consolidar a Unesp como uma universidade jovem, de excelência, de classe mundial.
Vários deles começaram a sua vida acadêmica antes mesmo da criação da universidade porque atuavam nos antigos Institutos isolados de ensino superior do Estado de São Paulo. Os salários e benefícios dos professores universitários significam uma clara opção profissional, com autêntica dedicação ao sistema de educação superior do país.
Na escada do mérito acadêmico, degraus não podem ser pulados. Subir essa escada implica, inicialmente, em obter os títulos de mestre e doutor, realizar pesquisas financiadas por agências de fomento, com recursos concedidos a pesquisadores altamente qualificados. Este passo leva cerca de 7 a 8 anos.
No novo degrau da escada do crescimento, o docente doutor forma alunos na graduação, alunos de iniciação científica, novos mestres e doutores e realiza ações de extensão universitária junto às comunidades. Em constante aprimoramento, com período de pós-doutorado no exterior, chega à livre-docência, outro degrau arduamente galgado e que demanda grande esforço para a construção e consolidação de uma linha de pesquisa, com publicações e parcerias internacionais.
São mais 5 a 10 anos! Detalhando apenas o concurso para a livre-docência, com certeza o mais exigente da carreira acadêmica, são cinco provas em quatro dias: a didática, a escrita, a de arguição de tese inédita na linha de pesquisa do docente e o julgamento e arguição do memorial.
Quando chega a professor titular, outros tantos degraus foram vencidos. Além da formação de novos profissionais e novos pesquisadores, linha de pesquisa consolidada com parceiros internacionais, geração de novos conhecimentos e inovação e de serviços prestados à comunidade, devem ser dadas importantes contribuições para a gestão da universidade. Nesse degrau acadêmico boa parte das horas é dedicada a trabalhos administrativos e de governança da universidade que demandam novos aprendizados e sacrifício do convívio familiar, em especial numa universidade multicampus como a Unesp.
Como obstetra e professora titular de obstetrícia, não posso me furtar a uma comparação. Não estou falando aqui de 40 dias de vida ou de 40 semanas de gestação, mas da construção de uma carreira de professor universitário de 40 anos que demandou dedicação na construção da Unesp, na formação de pessoas e cérebros, na pesquisa na fronteira do conhecimento e na governança dessa universidade jovem e multicampus.
Concluindo, não posso concordar com a interpretação distorcida que vem sendo dada sobre os salários que percebem os professores universitários. Sinto nos comentários maldosos o mesmo erro que levou aos descalabros e descasos que observamos hoje com a educação básica em nosso Brasil.
A escada do crescimento dos professores universitários na construção da universidade é longa e árdua com degraus altos, difíceis de serem galgados, mas que representam a sua doação à sociedade, que os mantém com seus impostos na formação de novos profissionais, de novos pesquisadores e de um novo país.

*professora titular de obstetrícia da Faculdade de Medicina de Botucatu e vice-reitora da Unesp.