O ajuste fiscal de R$ 64,9 bilhões que o Governo Federal tenta viabilizar em 2016 contempla uma série de ações pontuais de extrema complexidade política e de eficácia econômica duvidosa.
O governo não atentou à recomendação de Maquiavel: o mal se faz todo de uma só vez. Ao invés de no começo do ano, quando ainda tinha alguma força política, tentar resolver o ajuste de forma definitiva, o Planalto optou por um ajuste difuso e fragmentado, com uma infinidade de pequenas providências, elevações de tributos e vários pequenos cortes distribuídos pela administração. O efeito dessa opção foi a multiplicação e congregação contra o governo de todos os núcleos de interesses contrariados. Formou-se uma forte coalizão política contrária ao ajuste, resultando até mesmo na rejeição do pacote pelo partido da presidente da República.
Como resultado, o ajuste avança cambaleante, e não logra reverter as expectativas negativas dos agentes econômicos internos e externos. Nestas condições, a saída no curto prazo é aumentar a arrecadação.
Para promover o ajuste planejado de forma rápida e efetiva é necessária a instituição de um tributo sobre movimentação financeira, um IMF, semelhante à antiga CPMF, com uma alíquota total de 0,296%, podendo ser dividida em 0,148% no débito e no crédito de cada lançamento nas contas correntes bancárias. Tal medida implicaria no restabelecimento do equilíbrio fiscal da União com o benefício de se adotar um mecanismo de arrecadação simples, de baixo custo e que requer uma alíquota significativamente mais baixa quando confrontada com os tributos convencionais. Se fosse usado, por exemplo, o IRPF sua alíquota teria que passar de 27,5% para 41,9%; no caso do PIS/Cofins não cumulativo ela teria de saltar de 9,25% para 12,78%; e se a opção fosse a Cide gasolina, como vem sendo proposta, o tributo teria que ir de R$ 0,10 por litro para R$ 2,15 por litro.
Em relação à Cide cabe dizer que tem sido difundida a sua majoração de R$ 0,10 para R$ 0,60 da Cide por litro de gasolina para ajudar no ajuste fiscal. Este aumento propiciaria uma arrecadação de R$ 16 bilhões adicionais. A título de comparação, essa mesma arrecadação poderia ser gerada por um tributo sobre movimentação financeira de 0,072%, ou seja, uma alíquota cinco vezes menor do que a da extinta CPMF.
Ademais o aumento da Cide incidiria sobre um produto de enorme impacto em toda a cadeia produtiva, gerando forte pressão inflacionária de custos. Já um IMF não incide totalmente sobre a produção, tendo forte componente incidente sobre setores ou agentes econômicos incapazes de repassar a preços os impactos da tributação adicional. Em outras palavras, teria impacto inflacionário mais fraco do que o da Cide. Outros tributos em uso mostram-se igualmente inapropriados para produzir o ajuste fiscal na escala desejada.
Conclui-se, portanto, que o uso dos tributos atuais para viabilizar o ajuste fiscal exige aumentos absurdamente elevados de alíquotas, inviabilizando sua implantação. Assim, o remédio mais eficaz para sanar o atual quadro de fragilidade fiscal é a criação de um IMF.
*doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas).