O que segue aprendi com um dos meus maiores mestres de Teologia, o professor e padre Tiaguinho, homem simples, humilde e de grande conhecimento teológico e cultura geral. Holandês de nascimento e paraense por opção missionária. Ele era especialista em traduzir os conceitos mais difíceis da Teologia para que pudéssemos ensinar os leigos e, principalmente, os cataquistas das pequenas comunidades católicas amazônicas. Aquela aula ficou guardada em minha memória e ainda ecoa depois de 25 anos. Uma das lições que fez valer a pena os dez anos de trabalho no interior do estado do Pará. Ainda hoje, quando volto meu pensamento para a Teologia ou quando vejo as pessoas falando de religião, vejo o velho Tiaguinho dizendo: “Deus é MMM” (Pronuncia-se: hum, hum, hum! com o som na garganta e mantendo a boca fechada. É bom nunca dizer 3M, para não confundir Deus com alguma marca registrada).
Era meu primeiro ano de seminário maior e na disciplina Introdução à Teologia estudávamos “quem é Deus?”. Eu havia aprendido na catequese que “Deus é o espírito perfeitíssimo criador do céu e da terra” e achava que isto era tudo. Pensava ser possível conhecer plenamente a Deus e que uns O conheciam e outros desconheciam. Queria aprisionar Deus num conceito completo e bonito resumido no jargão do espírito perfeitíssimo. Tratava-se de um Deus preso nas gaiolas dos altares, delimitado pelas interpretações dos textos das sagradas escrituras; em resumo, um Deus MEU que era superior ao das outras pessoas e religiões. Como se fosse possível aprisionar a infinitude do bem na gaiola de alguma denominação.
Entra o velho Tiaguinho na sala de aula e diz: “Deus é MMM!” (hum, hum, hum!). Eu estava acostumado a compreender Deus como onipotência (aquele que tudo pode), onipresença (está em todo lugar), onisciência (sabe tudo o que acontece, aconteceu ou acontecerá). Aprendera tudo isto nas letras frias dos livros catequéticos e nas pregações das missas acompanhadas desde a mais tenra infância. Um Deus forte e poderoso sempre pronto para punir quem lhe desrespeita e em Quem os fiéis creem mais por temor que por amor. Um Deus grande e feroz, contido e delimitado pelos conceitos, vontades e necessidades de cada um. A tentação do fiel é achar que Deus se resume à sua própria compreensão e em atender as necessidades particulares. Agora me vem este padre velho dizer que Deus é “MMM”.
Mas, afinal de contas o que isto significa? O primeiro M é de mais; o segundo, de maior; e o terceiro, melhor. Tudo aquilo que alguém ou alguma religião pensar ou disser sobre Deus deve se iluminar com o entendimento de que Deus é Mais, Maior e Melhor. Quando pensamos ter entendido todo o poder de Deus, não esqueçamos que ele é MAIS. Quando achamos que a nossa religião possui Deus em sua plenitude, lembremos que ele é MAIOR. Quando nos orgulhamos por ações caritativas reveladoras da vontade de Deus aos homens mostrando-lhes Seu amor, fiquemos atentos, pois ele é ainda MELHOR.
Nenhuma religião pode se pavonear como possuidora da total plenitude de Deus, pois ele é maior que qualquer plenitude dos conceitos humanos e não se deixa aprisionar como escravo de ideologias religiosas. Ele é MAIS. Ele não é marca registrada de seita ou tradição religiosa e sua onipresença o coloca principalmente nas periferias sofridas da condição humana, entre os atingidos pela dor e o sofrimento imerecidos. Quando e onde os homens se encontram sem defesa frente aos poderes da sociedade constituída e sem a proteção que lhes devia oferecer o Estado surge como último tribunal recursal os braços estendidos pela Sua misericórdia.
Se alguém disser: “Ele está em todas as igrejas do mundo”, ainda terá dito pouco, pois “Ele é MAIOR”. Chegando a tentação de pensar que somos bons por isso ou por aquilo, recordemos Jesus afirmando que “Bom é Deus”. Onde e quando o bem acontece, a vontade divina se manifesta. A crença infantil leva o homem a querer algo bom de Deus; a crença emancipada leva o homem a fazer algo bom por Deus.
Se alguém pensa que Deus só pode fazer o bem através das mãos dos pregadores e das estruturas das igrejas, não se esqueça de que ele é muito MELHOR. Ele não se vende aceitando pagamento, nem se corrompe em troca de favores.
Em tempos de tanta diversidade religiosa e em meio a tantas dificuldades materiais cujo resultado é a busca da religião como solução fácil para os problemas, lembremos que o Senhor MMM nos concedeu este imenso planeta azul e uma maravilhosa vida para deles sermos zeladores. É tempo para, independente de crença, exercitarmos nossas responsabilidades diante da grande Casa Comum.

Professor da Faculdade REGES de Dracena; doutorando em Direito pelo Centro Universitário de Bauru (ITE-Bauru)