O Mercosul completa mais um ano em um período de instabilidade política e econômica na região. No dia 25 de abril de 2016, na sala do Parlamento do Mercosul – Parlasul –, ocorreu a celebração dos 25 anos do bloco regional. Os festejos foram marcados pela ausência de quatro, dos cinco presidentes. Somente o anfitrião, Tabaré Vasques, esteve presente.
A cerimônia foi marcada por divergências políticas e diplomáticas. No início do ato protocolar, 17 dos 20 parlamentares brasileiros se retiraram em protesto pelo que consideraram uma “declaração irresponsável” do presidente do Parlasul, o argentino Jorge Taiana. Dias antes, o ex-chanceler havia lançado um comunicado que fazia referência à crise política brasileira, no qual questionou severamente o julgamento político que o Congresso brasileiro leva adiante contra a presidente Dilma Rousseff. No texto, publicado na página on-line do Mercosul, Taiana considerou o impeachment contra Dilma um “golpe parlamentar” e uma “utilização forçada da lei”.
Diante disso, a delegação brasileira gritava “humilhação” e se retirava do Parlasul. A delegação da Venezuela balançava cartazes em protesto pela crise econômica e social de seu país. Os parlamentares antichavistas exigiam o referendo revogatório presidencial do governo de Nicolas Maduro. Os festejos das bodas de prata da organização regional não foram como imaginado. Não houve diálogo, muito menos consenso.
O momento seria uma oportunidade excepcional para impulsionar o acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, mas acabou sendo desperdiçado. As relações entre essas duas regiões começaram tecnicamente em 2001, mas na década de 1990 já havia sido assinado um acordo inicial. O maior avanço do processo ocorreu em 2004, com um intercâmbio de ofertas. Na ocasião, alguns analistas entenderam como o ponto mais próximo de um acordo. A partir de então, as negociações ficaram congeladas até 2010, quando houve o reinício do processo com importante número de reuniões técnicas. Apesar disso, os avanços são pouco significativos, especialmente porque não houve novas ofertas.
25 anos se passaram desde março de 1991. O Mercosul tem cumprido com parte de seus objetivos fundamentais, enquanto outros ficaram pelo caminho. O fato de ter-se constituído um processo de integração é um aspecto que deve ser ressaltado. Trata-se de um acordo que, entre outras conquistas, permitiu a reconciliação entre duas potências regionais, com importante significado político para a região. No entanto, este justo reconhecimento não impediu que ao longo de sua história analistas tenham apontado os desacertos do bloco, em um exercício de identificar erros para corrigi-los e possibilitar a retomada do caminho em direção ao cumprimento dos objetivos fundamentais firmados no Tratado de Assunção (TA) e no Protocolo de Ouro Preto (PO).
Para se avaliar os resultados do Mercosul é preciso ter em mente o aspecto do bloco a ser analisado: político, social e econômico-comercial. De acordo com cada um deles os diagnósticos e os resultados serão diferentes. A avaliação do estado atual do bloco regional sugere partir das análises realizadas nos últimos anos, que reconhecem as forças que mostram o processo no âmbito político institucional, social e inclusive cidadão. São destacadas as dificuldades em outros planos como o econômico-comercial. Este esclarecimento é necessário, pois alguns diagnósticos sobre o Mercosul terminam, em muitos casos, com a simplificada e evidente confrontação entre “integracioanistas” e não “integracionistas”. Esta dicotomia não é positiva para o Mercosul. Ao contrário, desconhecer e não ressaltar suas debilidades não favorece ao desenvolvimento do bloco e ignora o principal objetivo deste instrumento que é a construção de um Mercado Comum e uma União Aduaneira, que deveriam resultar “na livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos, o estabelecimento de uma política comercial comum e a coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais”, objetivos iniciais ratificados no artigo 1 do TA.
No ato comemorativo dos 25 anos o chanceler do Uruguai, Rodolfo Nin Novoa, admitiu em seu discurso as dificuldades do bloco, ao enfatizar que nos 25 anos passados, desde a inauguração do Mercosul, os “ventos protecionistas que prevaleceram sobre a construção dos mercados de nossa região foram os que postergaram a construção de uma política comercial comum”. De alguma maneira esta frase sintetiza as críticas realizadas reiteradamente pelo Uruguai em direção aos seus pares nas sucessivas cúpulas de chefes de Estado nos últimos tempos.
Em definitivo, a cerimônia foi um espelho da realidade do bloco: países enfrentando diferenças política e ideológicas na hora de estabelecer acordos entre si e com terceiros, e a imagem de uma economia estancada e sem perspectivas.
A falta de diálogo dificulta a programação de uma agenda propositiva para as sucessivas reuniões, fator que paralisa o bloco frente às dinâmicas da comunidade internacional. Nesse sentido, talvez uma maneira de amenizar as crises regionais seja a renegociação de alguns de seus objetivos originais, fortalecendo aqueles nos quais foram alcançados sucesso e descartando os que estão longe de concretizar-se e que, por sua vez, atuaram como barreiras ao desenvolvimento regional.
*pesquisadora do Núcleo de Estudos e Análises Internacionais (NEAI) da Unesp