Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiram suspender a lei que liberava o uso da fosfoetanolamina sintética, conhecida como “pílula do câncer”. O uso tinha sido liberado por uma lei aprovada no Congresso Nacional e sancionada pela presidente afastada Dilma Rousseff em abril.
A chamada “pílula do câncer” não tem liberação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) por não ter ação contra o câncer comprovada cientificamente, e nem ter sido testada em humanos.
No total, seis ministros votaram pela suspensão cautelar da lei, conforme a ação protocolada pela AMB (Associação Médica Brasileira). O relator, Marco Aurélio Melo, afirmou que o legislativo não poderia liberar uma medicação sem testes clínicos. De acordo com ele, a legislação é clara ao exigir o registro da substância pela agência fiscalizadora (Anvisa). Assim, a lei foi considerada inconstitucional.
O ministro Luiz Fux argumentou também que a liberação da pílula poderia onerar o Estado, já que as universidades não possuem estrutura para produzir em larga escala um medicamento –a USP foi obrigada por diversas ações judiciais a fornecer o medicamento para pacientes de câncer. “Há ainda o medo de que a substância faça os pacientes abandonarem os tratamentos tradicionais”, disse Fux.
Luís Roberto Barroso lembrou, em seu voto, que a Anvisa possui programas que viabilizam o uso de medicamentos experimentais, sem registro, no tratamento de doenças que não tenham alternativa terapêutica satisfatória. “A fosfoetanolamina sintética poderia ser oferecida no âmbito desses programas, com autorização da Anvisa.”
Quatro ministros votaram pela liberação para pacientes terminais
O ministro Edson Fachin considerou que a lei deveria ser mantida para pacientes terminais pois não caberia ao Estado estabelecer o que um cidadão pode ou não usar como medicamento, evocando o direito de autonomia e da autodefesa da vida.
“Por isso, quando não houver outras opções eficazes, pode haver relativização do controle do medicamento. Nesses casos cabe ao Congresso Nacional reconhecer o direito de pacientes terminais usarem o medicamento mesmo que os riscos sejam ainda desconhecidos”, explicou.
Fachin, Rosa Weber, Dias Toffoli e Gilmar Mendes defenderam que a liberação da substância fosse mantida no caso de pacientes terminais, mesmo sem as devidas pesquisas cientificas requeridas pela Anvisa.
Testes em humanos serão iniciados
A fosfoetanolamina sintética foi desenvolvida inicialmente por mais de 20 anos no Instituto de Química da USP (Universidade de São Paulo), em São Carlos, por uma equipe coordenada pelo professor aposentado Gilberto Chierice. Durante anos, a substância foi distribuída gratuitamente para pessoas interessadas.
Uma determinação da USP, no entanto, impediu a distribuição, o que fez com que muitos pacientes entrassem na Justiça para conseguir acesso ao medicamento. Muitos doentes garantem ter detectado efeitos positivos ao usar a “pílula do câncer”, mas análises iniciais não comprovaram sua eficácia.
Após diversos protestos e decisões judiciais, uma lei foi aprovada pelo Congresso Nacional permitindo a comercialização e uso da substância mesmo sem registro da Anvisa.
Enquanto isso, alguns centros pesquisam sobre a eficácia da substância. Um laboratório já foi autorizado a produzir a fosfoetanolamina sintética para análises clínicas. Até o momento, foram manufaturados 35 quilos da chamada “pílula do câncer” para serem testadas em pacientes de hospitais em um trabalho coordenado pelo Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo).
Em um primeiro momento, o estudo definirá a dose a ser ministrada em dez pacientes. Também serão analisados efeitos colaterais graves. Não havendo problemas, 21 voluntários passarão a tomar a substância. Entre outros, estarão envolvidos doentes com tumores no pulmão, próstata, fígado e estômago. A intenção é ir ampliando o número de pacientes até chegar a 1 mil.