Diante de um cenário altamente caótico, em que os índices das vendas têm caído continuamente e existe grande dificuldade na concessão do crédito, as medidas fiscais adotadas no país em muito têm contribuído para o agravamento da crise e para o fechamento de diversos pontos de comércio.
É certo que a política fiscal brasileira tem adquirido contornos dramáticos, vez que a máquina pública, inflada como está, tem encontrado dificuldades para manter-se. Com efeito, os gastos dos governos federal, estaduais e municipais alcançaram tamanha proporção que é cada vez mais oneroso financiá-los, sobretudo diante dos constantes desvios de verba pública. Some-se a isso a necessidade de se conseguir economias orçamentárias a fim de fazer frente aos juros e reduzir a dívida pública, que consome considerável fatia do PIB.
Diante de um forte desentrosamento entre a política monetária e a política fiscal, e perante uma horda de políticos que se recusam a diminuir os próprios gastos a fim de desonerar a máquina pública, a estratégia escolhida pelo Estado para garantir a manutenção da arrecadação consiste em um evidente endurecimento da política fiscal, seja com o aumento da carga tributária – já claramente abusiva e confiscatória -, seja com o enrijecimento dos mecanismos de cobrança de eventuais passivos tributários a descoberto.
Contudo, trata-se de um flagrante “tiro no pé”, vez que as empresas, já extremamente sufocadas pelas circunstâncias socioeconômicas, acabam ficando sem condições de manter-se em funcionamento e em razão disso param de produzir e comercializar seus produtos. Isso provoca um considerável decréscimo na base tributável, vez que quanto mais empresas fechadas menor é o número de contribuintes, de sorte que a política fiscal é altamente contraproducente.
No segmento varejista, essa é uma realidade facilmente aferível. São alarmantes os números de empresas que tem encerrado as atividades nos últimos meses. Mesmo algumas das gigantes do varejo amargaram prejuízos nos últimos meses e tem sido comum o fechamento massivo de várias unidades e lojas.
Vale lembrar que no varejo, a crise se dá em cadeia, vez que com o endurecimento da política fiscal, há o repasse dos aumentos dos tributos para os produtos pela indústria, de modo que o comerciante gasta mais para adquirir a mercadoria e também se vê obrigado a repassar isso ao consumidor.
Com os preços elevados, o índice de desconfiança do consumidor cresce e ele para de consumir. A queda no volume das vendas, por sua vez, dificulta a atividade do varejista (e a de outros setores da economia), o qual não tem margem de lucro suficiente para reduzir os preços, nem capital de giro para continuar em atividade, e tampouco tem fluxo de caixa para adimplir seus tributos.
Sufocado, o varejista se vê obrigado a efetuar demissões em massa, o que diminuirá ainda mais o volume de vendas vez que esses trabalhadores deixam de consumir, ao mesmo tempo em que vê surgir e aumentar a largos passos um passivo fiscal, que lhe será extremamente difícil de gerir.
Essa dificuldade é agravada, ainda, pela política agressiva do Fisco na busca por reaver os tributos não pagos. Com efeito, o rito pelo qual tramitam as Execuções Fiscais é altamente desfavorável ao contribuinte. Em seu ímpeto arrecadatório, os órgãos fazendários lançam mão de mecanismos tais como penhoras sobre o faturamento, bloqueio de valores em conta corrente e redirecionamento da execução aos sócios de forma indiscriminada.
Ao assim agir, no entanto, o Fisco atua contra seus próprios interesses, vez que as empresas têm suas operações prejudicadas e são de tal forma pressionadas, que acaba se provocando ou ao menos se acelerando o processo de fechamento. Dúvida não há de que essa atuação enérgica das entidades fazendárias acaba mesmo por violar a Constituição da República, vez que desrespeita indiscutivelmente a função social da empresa e compromete sua preservação.
A solução para todo esse desanimador cenário é que se perceba que não é necessário aumentar a arrecadação ou mesmo instituir ou majorar tributos, sobretudo em meio à crise. Na realidade, o que se precisa é que haja uma melhoria na gestão dos recursos que são arrecadados, bem como um endurecimento nas políticas contra a corrupção.
Isso porque ainda que venha sofrendo baixas, a arrecadação do Estado ainda é muito expressiva e capaz de fazer frente às mais diversas demandas econômicas e sociais existentes. Contudo, diante de uma gestão temerária e da ausência de um efetivo combate à corrupção, a qual não se limita a determinadas legendas ou partidos ressalte-se, essas verbas continuarão a ser desviadas e o preço da conta mais uma vez será repassado a um sufocado contribuinte.
*Advogada tributarista e coordenadora do Task Force de Varejo do escritório A. Augusto Grellert Advogados Associados.