Não tenho uma bola de cristal ao meu alcance, tampouco fiz pactos com forças ocultas, nem pretendo fazer, para adivinhar o desenrolar dos acontecimentos nos próximos anos no cenário político-econômico brasileiro. Sem me preocupar com o percentual de acerto (ou com a margem de erro) das minhas previsões, acredito que os atuais desdobramentos da nossa soap opera política levarão a relativas mudanças que, infelizmente, não conseguirão inverter a rota do subdesenvolvimento e dos persistentes e gravíssimos contrastes sociais brasileiros.

Inicialmente, vamos ter de nos conformar por mais alguns anos com a recessão aguda caracterizada por desemprego acima do desejável para um país ainda bastante jovem e dinâmico, associada a uma inflação que não retornará aos níveis anteriores ao Plano Real (reforçando a ideia de que se tratou da única reforma econômica a lograr êxito neste país), mas que não será irrelevante, encarecendo produtos e serviços essenciais, sobretudo para os mais desfavorecidos.
O Partido dos Trabalhadores, após a debandada de muitos militantes e figuras proeminentes, que preencherão os quadros do PMDB, partido que “sai por cima”, apesar dos escândalos de corrupção a ele associados, chegará à inevitável mudança de sigla, como já aconteceu com o PC do B de Roberto Freire e com antigos partidos comunistas da Europa como o PCI (Partido Comunista Italiano). Isto porque será preciso cancelar da memória popular (proeza nada difícil) qualquer associação com o partido dos escândalos que teve um Chefe de Estado afastado pelo impeachment (o termo golpe será lembrado apenas por alguns correligionários mais fanáticos e saudosistas).
Dilma Roussef dificilmente voltará à política (caso o Senado, como é de se esperar, consiga afastá-la definitivamente do poder nos próximos meses). Lula seguirá a trajetória de Collor, guardadas as devidas proporções. Após um período relativamente breve de ostracismo, será eleito novamente deputado ou senador, sempre com acenos populistas às antigas conquistas sociais de quem afirma ter eliminado a fome e a miséria brasileiras. O apelo, portanto, parecerá irresistível para boa parcela do eleitorado, pois as eleições raramente são vencidas pelos que apresentam ideias concretas, plausíveis e coerentes, com fundamento filosófico-cultural, mas por aqueles que apelam para a combalida situação financeira dos mais pobres ou para o medo de mais impostos para a classe média, não acenando sequer para mudanças profundas nos privilégios dos ricos e, sobretudo, dos especuladores que nada produzem e não geram empregos.
Enfim, os partidos pequenos que viviam à sombra do PT tenderão ao completo desaparecimento. Surgirão novos e oportunistas micropartidos como, por exemplo, o Partido dos Jovens ou o Partido Vegano, o Partido dos Aposentados ou o Partido Comunista Revisitado (nome que de per si já constituirá um fator de impopularidade). O PMDB, partido em que convivem tanto os que já pregaram a luta armada como os nostálgicos da ditadura militar, além, é claro, dos que se dizem liberais, mas não conseguem minimamente definir o que caracterizaria a atitude política de um liberal, passará por um processo de fragmentação, como consequência inevitável da sua notória falta de coesão interna e da apuração de novos escândalos que envolverão os seus integrantes.
Com relação aos movimentos sociais organizados como, por exemplo, o MST, inicialmente devem radicalizar as reivindicações e as atitudes, uma vez que não mais possuem o anjo da guarda do governo derrotado. Mais tarde, porém, tais atitudes radicais não contarão com apoio popular, pois tudo o que se baseia unicamente em revanchismo ou rancor tende a enveredar por caminhos obscuros, sendo rapidamente repudiado pelo bom senso e pelo apego à normalidade quotidiana.
O futuro cenário sócio-político não me parece, enfim, muito promissor, o que não significa que o Brasil nunca conseguirá reverter a rota do atraso e da corrupção generalizada. Dinamismo e juventude, aliado à grande disponibilidade de terras e de recursos naturais, sozinhos não constituem necessariamente um fator de progresso, mas poderão revelar-se um grande trunfo nas próximas décadas. A impunidade será menos contundente, mas a corrupção, sem um sistema educacional que ensine valores e verdadeira cultura, formando cidadãos conscientes, dificilmente deixará de existir.

*professor da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp de Araraquara.