O governo de Michel Temer deve dar andamento à reforma da Previdência e ela tende a ser realizada de modo fatiado. Fazê-la de maneira ampla e geral pode ser um empecilho para as mudanças fundamentais, já que muitas delas são impopulares e vão gerar divergências no Congresso.
O Brasil chegou a um ponto em que as ações no âmbito das finanças públicas exigem mudanças nas regras do gasto no longo prazo, mais especificamente no gasto previdenciário, cujo peso no dispêndio governamental já é superior a 40% e cresce de modo acelerado. Em 2002 a despesa com benefícios da Previdência foi de R$ 88 bilhões (5,6% do PIB) e em 2015 alcançou R$ 436,1 bilhões (7,4% do PIB). A quantidade de beneficiários nesse período saltou de 18,9 milhões para 28,3 milhões. A LDO/2016 (Lei de Diretrizes Orçamentárias) aponta que em 2050 esse gasto pode atingir 12,6% do PIB.
Cumpre apontar que o Brasil é um dos países onde as aposentadorias são comparativamente precoces. A título de exemplo, vale citar que a idade média de aposentadoria de homens no México é de 72,3 anos, no Chile é de 69,4, no Japão de 69,1, nos Estados Unidos de 65 e no Brasil de 59,4 anos.
Elevar a idade de aposentadoria no Brasil é uma medida indispensável. Porém, essa deve ser uma das alterações de maior resistência junto à população, já que de acordo com um levantamento da Icatu Seguros elaborado junto a 400 de seus clientes a maioria deseja se aposentar aos 55 anos de idade. Pesquisa do Ibope aponta que 65% das pessoas são favoráveis à reforma da Previdência, mas 81% se posicionam contra o aumento da idade mínima.
A introdução de critérios mais rígidos no tocante à idade mínima de aposentadoria tem sido um dos aspectos críticos, e também dos mais polêmicos, nas propostas de reforma da Previdência no Brasil, mas não é só isso. São necessárias outras ações de impacto para tornar o sistema previdenciário brasileiro sustentável no longo prazo.
Outros aspectos relevantes nos debates sobre a reforma previdenciária são a necessidade de revisão da indexação dos reajustes dos benefícios ao salário mínimo e o acúmulo de aposentadoria e pensão pelos beneficiários. Assim como a questão do aumento da idade mínima essas ações também devem gerar insatisfação junto à população, mas elas necessariamente devem ser debatidas visando estancar um rombo financeiro que no ano passado chegou a R$ 85,8 bilhões e segue crescendo de modo acelerado. Caso tudo fique como está, daqui dez anos o déficit previdenciário vai ultrapassar os R$ 200 bilhões.
Tudo é uma questão que envolve aspectos atuariais e matemáticos. O país tem cada vez mais pessoas recebendo benefícios da Previdência e o número de contribuintes é cada vez menor. Em 1970 eram 4,2 ativos para manter cada inativo e hoje essa relação é de apenas 1,2 e continuará caindo. A despesa previdenciária é crescente frente à receita.
Não há como evitar que em futuro próximo o sistema previdenciário brasileiro seja amplamente reformado em seus aspectos operacionais e em seu sistema de benefícios, de forma a torná-lo compatível com as características demográficas e econômico-sociais do mundo moderno, equiparando-o aos modelos existentes em outros países.
Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas.