A sociedade está em um grau de regulação da vida comunitária que chega a sufocar. O anseio determinado e contumaz sobre o controle do corpo, lança a perspectiva de que o homem tem sido expiação de um plano regulamentar que precisa de atenção, apesar de necessário para o ordenamento da vida em sociedade. Hoje, apoiada na “tecnologia espiã”, a “sociedade disciplinar” vem das evidências “”Foucaultianas”” de que, todos os órgãos sociais eram propostos com o escopo disciplinar, de dizer o caminho, de doutrinar.
Nesse campo, a família, a igreja, a fábrica, o estado, os clubes de serviço, as escolas, se prestavam ao regulamento da sociedade, disciplinando-a o tempo todo. Diante de todo controle instalado, a escola não foge à regra, e tem recebido cada vez mais regulamentos e preceitos para direcionar a postura dos docentes e, por consequência, da vida e formação dos alunos.
O modelo escolar posto é hegemônico e, como tal, impregna a direção, professores e alunos da sensação de tutela constante. Está sendo retirada a voz e a criatividade do ambiente educacional, relegando seus atores à uma produção monótona e sem vida. Quem é que tem medo da efervescência crítica? Sem a liberdade de gerir seus princípios e vontades, a escola se vê diante do acovardamento generalizado, aliado à falta de estímulo e interesse por parte de todos os envolvidos. A regra básica é colocar diretrizes para serem seguidas sem, contudo, uma discussão aprofundada com os interessados. Como o ensino é dever do Estado, cria-se um conceito de que o regramento é o único meio do atingimento do objetivo, o da “”qualidade de ensino””.
Será? No contexto acadêmico, os diretores não têm liberdade para liderarem, nem podem estar sensíveis aos clamores dos professores que são tolhidos de ensinar livremente e, muito menos dos alunos que não aprendem de forma crítica, quando aprendem. Agora nos deparamos com o Projeto Escola Sem Partido, em trâmite pelo Congresso Nacional, uma proposta que torna obrigatória a afixação, em todas as salas de aula do ensino fundamental e médio, de um cartaz com os deveres dos professores.
Em linhas gerais, mais uma vez, o Poder quer que o professor perca sua capacidade de desenvolver o pensamento crítico e contestador nos alunos, não decidindo por si próprio o caminho filosófico que lhe convém. Vale lembrar que, abusos neste sentido, já são punidos através das Leis de Diretrizes da Educação em todas as esferas do Estado mas, não contente, o Projeto de Lei quer mais.
O cartaz com normas de pensamento, difusão e comportamento, que o programa pretende fixar em todas as salas de aula, é mais um bloqueio ao debate salutar de ideias e posturas frente ao mundo. Dentre os itens a serem fixados, temos: “”I – O Professor não se aproveitará da audiência cativa dos alunos, para promover os seus próprios interesses, opiniões, concepções ou preferências ideológicas, religiosas, morais, políticas e partidárias. (…) IV – Ao tratar de questões políticas, sócio-culturais e econômicas, o professor apresentará aos alunos, de forma justa isto é, com a mesma profundidade e seriedade , as principais versões, teorias, opiniões e perspectivas concorrentes a respeito.”
As demais, na minha opinião, “chovem no molhado”, pois já são regras que devem ser respeitadas em sala de aula. Com a aprovação deste Projeto de Lei, uma vez mais, fica aparente o medo dos detentores do Poder do Estado em ter, entre seu povo, alunos e futuros cidadãos, com pensamento crítico e espírito/ânimo transformador, forçando uma mudança do status estatal que está posto há anos e que apresenta franca decadência.
*Advogado, jornalista- online@jcruzeiro.com.br