O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ayres Britto, disse hoje (6), ao participar de um debate sobre o equilíbrio entre os três poderes,l promovido pela Federação do Comércio de São Paulo, que a crise política pela qual o país passa é um processo de “purgação” e aperfeiçoamento da democracia. “Essa democracia [que], finalmente, não aceita mais escamoteação…[e] que começa a se dar o respeito. Uma democracia que resolveu altivamente sair do armário”, destacou.
“Nesse contexto transicional, a democracia experimenta uma fase de fadiga. Como que por cansaço democrático, a coletividade experimenta uma desagradável sensação de torpor, de desorientação. Uma espécie de desalento, de descrédito”, explicou. E disse que acredita que o processo político atual, com denúncias de corrupção vindo a público constantemente, é um período de transição importante para o amadurecimento político do Brasil.
Liberdade e transparência
Um dos principais elementos que catalisam essa mudança é, segundo Ayres Britto, a liberdade de atuação dos veículos de comunicação. “A plenitude de liberdade da imprensa está desaguando nesse tipo ideal turbinado de cidadania. Tudo vem a lume, transparência. Estamos excomungando a cultura do bastidor. Por isso que a crise está sendo tão conhecida, tão estudada, debatida, desnudada”, ressaltou Britto.
Há ainda, na avaliação dele, resistências dos setores da sociedade que se beneficiavam da corrupção. “A velha ordem, autoritária, corporativa, corrupta, perdulária de recursos públicos… é teimosa, malandra, insidiosa, resistente e não joga a toalha”, complementou.
O ex-ministro ressaltou a importância do julgamento do mensalão, do qual fez parte como ministro do STF, para mudar certas relações na sociedade. “A partir do mensalão, o princípio republicano de que todos são iguais perante a lei chegou para o direito penal. E moradores do andar de cima da sociedade passaram a responder por suas malfeitorias vendo o sol nascer quadrado, inclusive”.
Crise é internacional
Para o professor e diretor da Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas, Joaquim Falcão, o processo que o Brasil passa faz parte de uma conjuntura internacional. Para ele, o desencanto com o sistema político acontece em várias nações e “a democracia está em risco em todos os países”
“Todos com um problema comum, que é a corrupção. A corrupção não é invenção brasileira”, citou. “Dois candidatos a presidente da França são acusados de algum tipo de corrupção. E sabe o que ocorreu? Eles dizem que vão continuar candidatos. A gente está muito perto de tudo”, exemplificou.
Falcão avalia que seja necessário encontrar as raízes das mazelas, em vez de simplesmente focar em um grupo de culpados. “Se a gente não enfrentar a corrupção do mercado e das empresas, não vai adiantar nada. O problema não é a corrupção do político ou do empresário ou do candidato. O problema é a relação que se formou entre os três”.