O atropelamento de animais em estradas e rodovias do Brasil possui números alarmantes, mesmo sem contar casos não registrados, frutos do escasso monitoramento desse tipo de ocorrência. No país, ainda não existe legislação vigente que tenha como intuito reduzir o impacto da extensa malha rodoviária sobre a fauna brasileira. Enquanto os projetos de lei não são aprovados, a estimativa é de que mais de um milhão de animais morram diariamente nas estradas do país.
Além disso, a fragmentação das áreas florestais torna cada vez mais perigosa a migração da fauna ao longo do ano, devido à necessidade corrente de transporem rodovias. Em muitos países, a solução encontrada foi a inclusão de ecodutos nos projetos de construção de vias que interferem na rota de locomoção de animais silvestres. No Brasil, entretanto, a construção de passagem que garante a preservação da fauna fica à mercê da decisão das empreiteiras.
Enquanto isso está em curso no Plenário o PL 466/2015, que propõe medidas que buscam proporcionar a circulação segura de animais silvestres em território nacional, mas ainda aguarda votação. Outro projeto de lei, o PL 7780/2014, que propunha a implantação de ecodutos em ferrovias e rodovias, foi arquivado pelo artigo 105 do Regimento da Câmara dos Deputados, que determina o arquivamento automático de projetos ao fim da legislatura de seus autores.
No início de 2014, o Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas (CBEE) lançou um aplicativo para celulares, o Urubu Mobile, que permite aos usuários fotografar e registrar o atropelamento de animais nas vias brasileiras, com rastreamento via GPS. Mesmo operando há pouco tempo, o sistema Urubu já registrou mais de dezessete mil animais atropelados e identificados no País, sendo as maiores incidências nos Estados de São Paulo e do Rio Grande do Sul, que juntos somam mais da metade dos acidentes registrados no sistema.
A classe Mammalia possui a maior quantidade de animais identificados (mais de nove mil atropelamentos), sendo que dos dez animais com maior quantidade de entradas do sistema, oito são mamíferos, porém deve-se analisar o fato que animais de maior porte são mais fáceis de serem avistados e fotografados do que em relação aos répteis teiú (Salvator merianae) e cobra-d”água (Helicops infrataeniatus), que participam do ranking de dez animais mais afetados e possuem porte relativamente menor do que outros que entram na lista, como o cachorro do mato (Cerdocyon thous) e o tatu-galinha (Dasypus novemcinctus).
Entre os dez animais mais atingidos, destaca-se o tamanduá-bandeira (Mymecophaga tridactyla L.), espécie classificada como vulnerável à extinção pela IUCN Red List (inventário global sobre a conservação de espécies ameaçadas) e está praticamente extinta no Rio Grande do Sul. De acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, o atropelamento é uma das principais ameaças à vida do tamanduá-bandeira, por ser um animal que necessita de amplo território (até 639 hectares) para sobreviver, o que o leva a atravessar as rodovias e estradas que cortam sua área de habitação.
É notável, portanto, que a burocracia e a desatenção são grandes contribuintes para a redução e morte da fauna nativa brasileira. A inconsequência da não tomada de decisões e a falta de interesse em proteger a biodiversidade destroem, pouco a pouco, a verdadeira riqueza presente em nosso País. Cabe cada vez mais ao cidadão brasileiro, e não apenas aos institutos e organizações, a responsabilidade de cobrar a aprovação e o exercício de leis que protejam a fauna e a flora ainda existentes, para que o meio ambiente não mais seja visto apenas como meras paisagens.
*Aluna do curso de bacharelado em Ciências Biológicas da Uniso (Universidade de Sorocaba)