O Presidente Temer indicou Raquel Dodge para assumir no lugar de Rodrigo Janot , o cargo de Procurador Geral da República Federativa do Brasil.

De acordo com nossa Constituição Federal, cabe ao presidente da República indicar, a partir de uma lista tríplice, quem ocupará esse cargo por dois anos. Ocorre que nosso presidente não reúne mais condições de governabilidade, a ponto de estar “tocando” o seu governo por meio de atos de verdadeiro terror em relação aos aliados e supostos inimigos e na base do fisiologismo, numa dimensão nunca vista antes na história política brasileira.
Como se fosse um moleque birrento, por conta da conduta funcional do atual procurador o qual ele concebe como inimigo mortal ele indica a senhora Raquel, para, depois de sabatinada pelo Senado Federal, vir a ocupar o cargo em questão.
Embora não tenha sido o seu predileto, escolheu a segunda e a que é mais simpática aos seus interesses e aos de seus aliados. Poder-se-ia ver tal atitude como um ato de grandeza. Porém, como alguns jornalistas disseram, a sua escolha foi motivada unicamente por critérios políticos, entre eles: demonstrar que o seu governo, ainda exerce a governança.
E pela ideia de tentar demonstrar que ele é um ardoroso defensor das mulheres no topo do poder (uma enganação, pois quando da montagem inicial do seu governo não indicou nenhuma pessoa do sexo feminino, passando a fazer isso depois de pressões sociais, culminando com a indicação de uma mulher para a Secretaria de Direitos Humanos, Sra. Luislinda Valos (1922-) desembargadora aposentada e primeira juíza negra do Brasil.
Adianto que pouco me importa se a indicação fosse de uma mulher, de um deficiente físico, um negro, pardo, índio ou algo nesse sentido. O critério fundamental que deve pautar as escolhas para a administração, fiscalização e defesa da coisa pública deve ser o da competência e do discernimento. Sobre este aspecto, parece-me que ninguém duvida da Sra. Raquel.
O problema, a meu ver, é ficar “batendo” nessa tecla do gênero e usar como justificativa para a escolha o fato de ela ser mulher.
O que fica a me preocupar, ao escolher a segunda mais bem votada a despeito de ter se colocado favorável à continuidade da Operação Lava Jato, é se ela não vai se comportar como o jurista Geraldo Brindeiro , procurador Geral da República durante o período de 1995 a 2003, em pleno governo FHC, rotulado de “Engavetador Geral da República”.
Incomoda-me, mais ainda, o fato de Temer ter “quebrado” uma tradição que já estava se transformando em costume, a saber: o do Presidente não desrespeitar a vontade dos procuradores, indicando o candidato mais votado, mesmo que isso significasse prejuízos aos seus projetos de poder. Nesse ponto, os ex-presidentes Lula e Dilma indicaram e reconduziram Rodrigo Janot; justamente a pessoa que aprovou a abertura do pedido do processo de afastamento desta última. Nesse sentido, o presidente tem, mais uma vez, flertado com regimes de exceção e isso, a meu ver, é grave, além de evidenciar sua faceta policialesca e autoritária.
Agora, o que mais me assustou com essa indicação, foi até o momento estranha-me o silêncio dos procuradores com o desrespeito a uma tradição de se indicar o mais votado.
Segundo, o fato de Raquel não ter declinado o convite ao menos – enquanto consultasse os seus pares. Afinal, ela não foi a mais votada, demonstrando, ao agir assim, a ausência de “vergonha na cara”, o desrespeito ao pleito e aos seus colegas, a fome por poder, além de indiciar certo flerte com partidos políticos que, ora, ocupam o governo atual e alguns de seus membros estão sendo denunciados pelo atual procurador pelo acordo feito com Joesley Batista (JBS) e pivô da crise política do atual Governo Diante disso, indago à senhora Raquel: Vossa Senhoria não deveria, ao menos, condicionar o seu aceite a consulta junto aos Procuradores? Certamente, com os votos obtidos por Vossa Senhoria e pelo terceiro candidato, seriam suficientes para que fosse referendada. Além disso, como efeito colateral, demonstraria que o seu compromisso é efetivamente com a defesa dos interesses da República e até angaria simpatia e respeitabilidade daqueles que não votaram na senhora.
Analiso, aqui, apenas a coragem. Aristóteles disse que o seu excesso é a temeridade; sua ausência, a covardia. Tanto um extremo quanto o outro são vícios e distancia a pessoa da virtuosidade, tornando regra o romance O homem sem qualidades de Robert Musil (1880-1942).
Fico, diante disso, a me perguntar: será que essa ausência de vergonha de Raquel Dodge ao aceitar o convite, sendo a segunda mais votada, para ocupar o cargo de Procuradora Geral da República, é um ato de coragem? Se o for, ela pode ser vista como uma heroína e, portanto, figura digna de admiração? Sua escolha não foi apenas admirada pelos maus (corruptos e concentradores de renda) e pelos imbecis?
Não tenho respostas para essas indagações, mas sou forçado a conceber o presidente Temer, nas condições que se encontra e movido pelo ódio em relação ao atual procurador, como uma pessoa má e muitos dos seus aliados da mesma forma ou como imbecis.

*Docente da UNESP – Campus de Assis