Uma boa maquiagem, um vestido de gala, salto alto e pronto. Ximena Suaréz voltou a sorrir. Podia ser fácil assim, mas foi longo e tortuoso o caminho da boliviana até seguir em frente com a vida. Uma das seis sobreviventes do acidente aéreo de 29 de novembro em Medellín, a comissária de bordo completa um ano da tragédia nas passarelas e diante de flashes em seu país. Glamour que serviu de atalho para quem lutava contra a depressão após o trauma com o avião da LaMia, empresa para qual trabalhava.

 

Ximena em pose como modelo na Bolívia (Foto: Reprodução/Facebook)

Ximena em pose como modelo na Bolívia (Foto: Reprodução/Facebook)

Com lesões nos pés e ainda em estado de choque, Ximena não tinha ânimo sequer para aflorar a vaidade feminina. Até que os convites para atuar como modelo e o apoio dos psicólogos fizeram com que a boliviana, que segue morando em Santa Cruz de la Sierra, reencontrasse estímulo. Um ano depois, ela ainda busca coragem para voltar a trabalhar como comissária, mas já realiza palestras para falar de aviação e carrega na pele uma tatuagem onde eterniza a tragédia do Cerro Gordo.

– Vinha de uma depressão muito forte e os psicólogos disseram que podia me ajudar. E realmente ajudou. Voltei a me cuidar fisicamente, a caminhar… É um passatempo que me deixa ocupada enquanto me preparo para voar. Foi um ano de recuperação com muita terapia, momentos de dificuldade. É uma benção receber essa segunda chance de conviver com minha família, meus filhos, vê-los crescer – disse ao GloboEsporte.com.

 

Ximena e a Chape: na Colômbia com os escombros da aeronave, itens dos tripulantes e a camisa autografada pelo time  (Foto: Reprodução/Facebook)

Ximena e a Chape: na Colômbia com os escombros da aeronave, itens dos tripulantes e a camisa autografada pelo time (Foto: Reprodução/Facebook)

A mãe de Thiago, de 7 anos, e Gabriel, de 3, tem uma rotina bem menos agitada do que as do tempo de aeromoça. A vida noturna ficou para trás e, assim como os outros sobreviventes, Ximena repete à exaustão que não pode deixar passar em branco a oportunidade de seguir viva. O contato com aqueles que compartilham da mesma história, por sinal, é pouco. No primeiro semestre, ela visitou a delegação da Chape em viagem à Bolívia e garante que Erwin Tumiri, seu ex-companheiro de LaMia, está se recuperando longe dos holofotes:

– Minha vida é dividida entre antes e depois do acidente. Era uma garota festeira e mudei. Sou mais apegada a Deus e minha família. Dou importância a coisas que não dava e penso no futuro, no propósito de estar aqui. Tenho uma missão. Quero crescer como pessoa, ajudar ao outro.

 

 (Foto: Arte com reprodução/Youtube)

(Foto: Arte com reprodução/Youtube)

O desenho de um avião com a inscrição da LaMia entre nuvens na costela chama a atenção em Ximena. Aos curiosos, a comissária diz tratar-se de uma forma de canalizar a dor ainda forte pelo ocorrido:

– A tatuagem é de um avião entrando em uma ferida aberta na minha pele e subindo aos céus. É algo que reflete a dor que sinto, ocupa um vazio e me faz recordar de todos, que estarão para sempre na minha vida e no meu coração. As feridas físicas vão se curando, mas a do coração é para sempre. Por isso, tatuei no meu corpo.

 

Ximena ganha abraços de jogadores da Chape (Foto: Reprodução/Facebook)

Ximena ganha abraços de jogadores da Chape (Foto: Reprodução/Facebook)

Ximena fez parte da mesma tripulação da LaMia em outros voos, como o que levou a seleção da Argentina, com Messi. Questionada se consegue entender o ocorrido naquela madrugada, a comissária diz que tem muitas perguntas sem respostas e aponta o acidente como o pior momento da vida. Em breve, está previsto um lançamento de um livro, como fizeram Rafael Henzel e Neto, onde promete ajudar a desvendar um pouco da tragédia.

– Vou falar coisas que ninguém nunca disse.

Nas passarelas ou na literatura, Ximena se reconstrói enquanto cria coragem para voltar à rotina de voar.

 

Ximena no Jardim Botânico de Curitiba. Recentemente, esteve no Brasil para dar palestras sobre aviação (Foto: Reprodução/Facebook)

Ximena no Jardim Botânico de Curitiba. Recentemente, esteve no Brasil para dar palestras sobre aviação (Foto: Reprodução/Facebook)