Os já divulgados indicadores econômicos de 2017 compravam, tecnicamente, o fim do ciclo recessivo no Brasil. A reflexão que proponho é entender como o setor público enfrentou a crise que colocou o País no limbo nos últimos anos.

Para alicerçar a análise, vejamos como o setor privado agiu. Antes que alguém pense no setor privado como se ele fosse constituído somente por empresários sem escrúpulos, os “coronéis modernos”, destaco que estou falando de empresários empreendedores, que arriscam seu capital, que empregam, que geram riquezas e lutam diariamente em suas organizações, ou seja, ajudam o Brasil a ser um país melhor de se viver, mantendo, entre outras coisas, relação de lealdade com os que como eles trabalham, tendo relação muito além a um empregado, de uma mera peça na engrenagem, se apresentando como um verdadeiro associado.

A expressão de ordem no meio empresarial foi “faça mais com menos”. Isso exigiu que dirigentes e seus colaboradores se debruçassem sobre os orçamentos anuais e listassem os eventuais desperdícios nos gastos e focassem na receita. A produtividade passou a imperar. Esse meio empresarial, muito criticado por alguns “românticos” que ainda acreditam no confronto capital/trabalho, escaldado, evitou, em primeiro momento, dispensar seus colaboradores.

O apagão de mão de obra que o Brasil observou quando a economia ainda apresentava crescimento (sem sustentação, mas crescimento) demonstrou aos empresários que forjar equipes de alta performance não era tarefa fácil e seria jogar no lixo todo investimento na qualificação profissional caso a opção para enfrentar a crise fosse à vala comum da dispensa de profissionais.

Este foi um dos motivos que contribuiu para o desemprego não se agravar no início da crise, contudo, com queda acentuada nas vendas, as empresas, tanto as micros, como as pequenas, médias e grandes, se endividaram.

Sem excedentes via lucro, recuaram no tocante aos seus investimentos e a dispensa de parte de equipe de profissionais foi inevitável. Muitas empresas abriram o bico e fecharam suas portas. Tantas outras estão em recuperação judicial.

O foco foi responder ao questionamento: como sobreviver em tempos de crise? Lembro que a realidade das empresas brasileiras, notadamente as familiares, é de baixos recursos para capital de giro.

Isso posto, foquemos no setor público. O que foi feito para enfrentar a crise? Umas poucas prefeituras e uns poucos estados fizeram a lição de casa. A maior parte seguiu em frente como se nada tivesse acontecendo e os calotes passaram a vigorar.

Sem elevar a arrecadação, não agiram na direção da contenção dos gastos em custeio. Adiaram os gastos em investimentos. É certo que a estabilidade legal do emprego público é um limitante, mas pouco ou quase nada foi feito em termos de eliminação de cargos comissionados (entenda-se indicações políticas), e redução de gastos.

Observem, por exemplo, o comportamento do setor público no tocante aos funcionários públicos que recebem elevados salários e ainda mantém uma série de benefícios: não mexeram uma palha no sentido de buscar ganhos em produtividade. No máximo não tiveram a reposição da inflação. No caso da União, mesmo com o limitador de gastos, o “cheque especial” da emissão de títulos públicos funcionou a todo vapor, e a convivência com déficits nas contas passou a ser a dura realidade da gestão dos recursos públicos.

A conclusão é que vivemos dois “Brasis”: o lado do setor privado tendo que matar um leão por dia e, em determinados momentos, além de matar um leão por dia é obrigado a segurar o leão do dia seguinte (quando tem leão disponível), enquanto o lado do setor público o máximo que se vê são “contingenciamentos” de recursos. A empresa privada, se não honrar seus compromissos, fecha. O setor público, se não honrar seus compromissos, se tolera, posterga, dizem somente “não temos recursos para pagar”.

O setor privado corta em sua própria carne e o setor público, com raras exceções opera como se nada tivesse acontecendo. Se quisermos um País forte, estes dois mundos terão que se aproximar e a sociedade como um todo enfrentar os desafios que se apresentam. Mais uma desigualdade em um País tão desigual.

*Economista