Apesar de o Brasil ter legislação específica para garantir a presença feminina na política, o país amarga intensa desigualdade quanto à ocupação de cadeiras parlamentares pelas mulheres. Em um ranking de 190 países, o Brasil ocupa a 152ª posição em relação ao percentual de parlamentares homens e mulheres na Câmara dos Deputados.
O dado, que consta em uma pesquisa divulgada nesta quarta-feira (7) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é monitorado pela Inter-Parliamentary Union – IPU. A organização, com sede na Suíça, tem o objetivo de mediar os contatos multilaterais dos parlamentares dos países.
Em dezembro, na média global, a presença feminina nas câmaras baixas ou parlamentos unicamerais – que no Brasil corresponde exclusivamente à Câmara dos Deputados – era de 23,6%. No caso brasileiro, o percentual era de 10,5% no mesmo mês.
O Brasil teve o pior resultado entre os países sulamericanos. A Bolívia, por exemplo, aparece na 2ª posição do ranking, com 53,1% das cadeiras da Câmara ocupadas por mulheres.
Ruanda lidera o ranking feito pela IPU desde 2008. Em dezembro de 2017 as mulheres representavam 61,3% do parlamento do país.
A pesquisadora da Coordenação de População e Indicadores Sociais do IBGE, Luanda Botelho, lembrou que Ruanda teve sua organização social completamente alterada em 1994, quando 800 mil pessoas foram assassinadas no país em 100 dias – o maior genocídio da história recente.
“O que os relatórios sobre o país apontam é que a partir do genocídio, a participação feminina em diversos papeis foi intensificada. Houve a criação de conselhos locais exclusivamente femininos, a criação de cotas para as mulheres no serviço público além de medidas de acesso a educação e a terras”, disse a pesquisadora.
Após o genocídio, 70% da população de Ruanda passou a ser feminina. “Mas mesmo antes do genocídio, a participação feminina no parlamento de lá era de 18%”, ponderou Luanda. A pesquisadora enfatizou, ainda, que no Brasil as mulheres também são maioria, embora em proporção menor, que os homens.
“É claro que a maior presença feminina na população não se reflete nestas posições políticas. Então, na verdade, não é uma questão de estudar os outros países, mas de estudar o próprio Brasil. É uma questão de ouvirmos o que os estudiosos do processo eleitoral têm a nos dizer”, afirmou.
Luanda destacou que o Brasil está atrás de países com experiências muito distintas – desde Suécia e Finlândia, que têm alto nível de desenvolvimento econômico e social, como da Somália, onde ainda persiste a mutilação genital feminina, e Afeganistão, que há poucos ainda ainda era considerado um dos países mais perigosos para as mulheres.
O IBGE destacou que desde 1995 o Brasil possui legislação específica que prevê cotas eleitorais, reservando às mulheres um percentual mínimo de candidaturas nas eleições proporcionais. Somente em 2009, no entanto, essas cotas se tornaram obrigatórias. Pela lei, deve haver no mínimo 30% e no máximo 70% de candidaturas de cada sexo, para cada partido ou coligação partidária.
A legislação rege as candidaturas e é cumprida. Todavia, ela não se reflete no resultado das eleições.
Em 20 de dezembro de 2017, data em que o IBGE fez o levantamento, as mulheres representavam 16% dos senadores e 10,5% dos deputados federais em exercício. Na Câmara, onde as eleições são proporcionais – no Senado as eleições são majoritárias – não havia, naquela data, nenhuma representante mulher dos estados da Paraíba, Sergipe e Mato Grosso.
“O descompasso entre a proporção de candidatas e deputadas mulheres em exercício poderia ser atribuído, segundo estudos eleitorais, a fatores como falta de apoio material às candidaturas femininas, inclusive no seio dos partidos políticos, e ao maior sucesso eleitoral dos candidatos que já eram parlamentares anteriormente”, avaliou o IBGE.
O IBGE destacou, ainda, que em 13 de dezembro do ano passado, dos 28 ministros de Estado no Brasil, nomeados diretamente pelo presidente da República, apenas dois eram mulheres: Luislinda Valois, que era titular da pasta de Direitos Humanos, e Grace Mendonça, chefe da Advocacia Geral da União – que embora não seja um ministério, tem status ministerial.
Assim, em dezembro, as mulheres respondiam por 7,1% dos cargos ministeriais do governo brasileiro. Com a saída de Luislinda Valois do Ministério dos Direitos Humanos, que foi assumido interinamente por Gustavo do Vale Rocha, e a criação do Ministério da Segurança Pública, assumido também por um homem, Raul Jungmann, o percentual feminino nos ministérios caiu para 3,4%.
“Uma série de políticas públicas poderiam ser desenhadas a partir destes dados, a fim de se garantir o maior acesso de mulheres a essas posições políticas”, sugeriu a pesquisadora do IBGE Luanda Botelho.