No rastro de revelações do fim de semana de que dados de até 50 milhões de usuários do Facebook foram usados para interferir nas eleições americanas de 2016, favorecendo a vitória do presidente Donald Trump, as ações da empresa despencaram na Bolsa de Nova York nesta segunda-feira (19). Os papéis da rede social caíram 6,8% em reação às notícias, a pior retração dos últimos quatro anos, o que reduziu em US$ 36,7 bilhões (R$ 123 bilhões) o valor de mercado da empresa, que antes estava avaliada em cerca de US$ 538 bilhões.
O declínio contaminou outras ações de tecnologia. A Alphabet, dona do Google, teve queda de 3%, a Amazon e a Microsoft perderam 1,7%, e a Apple afundou teve desvalorização de 1,5%. O índice Dow Jones recuou 1,35%. O presidente-executivo do Facebook, Mark Zuckerberg, que vinha despachando seus advogados para conter a ira de parlamentares americanos e europeus, enfrenta agora uma das maiores crises de imagem a chacoalhar o Vale do Silício. E Washington, Londres e a União Europeia querem ouvir da boca dele como a britânica Cambridge Analytica teve acesso a dados de usuários num esquema para manipular resultados eleitorais. Deputados e senadores americanos subiram o tom de suas ameaças ao Facebook, exigindo novas investigações sobre a possível violação de um acordo com o governo sobre proteção à privacidade de usuários por parte da firma. A senadora democrata Amy Klobuchar, por exemplo, exige uma explicação do dono do Facebook à Câmara em Washington, onde, nas palavras dela, gostaria de ouvir tudo o que ele sabe sobre o mau uso de dados para “alvejar as propagandas políticas e manipular os eleitores”.
Em Londres, o chefe da investigação britânica sobre a interferência russa no referendo britânico para que o país deixasse a União Europeia, Damian Collins, também disse que exigira uma manifestação de Zuckerberg sobre a série de acusações. “É inaceitável que eles nos enviem testemunhas que evitam responder perguntas difíceis dizendo que não sabem as repostas”, disse Collins. “Isso cria uma falsa impressão de que as políticas do Facebook são robustas e monitoradas de maneira eficaz.” Um porta-voz da premiê britânica, Theresa May, também manifestou sua preocupação pelo uso de dados do Facebook pela Cambridge Analytica –a firma operou o esquema a partir de Londres.
EXECUTIVO FORA Noutro sinal de agravamento da situação, o responsável por assuntos de segurança da rede social, Alex Stamos, anunciou que vai deixar seu cargo depois de desavenças com outras lideranças na empresa, entre elas Sheryl Sandberg, uma de suas diretoras. De acordo com pessoas próximas às negociações, Stamos vinha brigando até o momento para que o Facebook investigasse e esclarecesse logo os episódios de atividade dos russos em sua plataforma, mas não foi ouvido. Em dezembro, suas responsabilidades foram sendo repassadas a outros executivos, mas ele havia concordado em ficar até agosto, para não criar mais desgastes. Stamos é o primeiro executivo do alto escalão da firma a deixar o cargo desde o início do escândalo da campanha russa.
Na semana passada, sabendo que estavam para vazar detalhes de como a Cambridge Analytica criou um aplicativo para compilar dados e montar perfis de preferências políticas de usuários, o Facebook bloqueou o acesso de executivos do grupo à rede.
AUDITORIA O time jurídico de Zuckerberg também acaba de anunciar que sua empresa contratou uma auditoria para entender como a Cambridge Analytica armou a operação. Executivos do grupo deram detalhes ao canal britânico Channel 4 News sobre como plantaram notícias falsas e agiram com ex-espiões para manipular resultados eleitorais no mundo todo. Estratégias envolviam criar escândalos falsos de pagamento de propina e até contratar prostitutas para seduzir políticos. Os dados de usuários do Facebook usados pelo grupo vieram de questionários sobre preferências pessoais permitidos pela rede social, que nega o vazamento dessas informações, alegando que sempre repassou esses dados a pesquisadores acadêmicos. O problema é que a Cambridge Analytica é uma consultoria política que tinha entre os clientes a campanha de Donald Trump, entre outros.