A história de Dracena e de Adonias Escurinho Soares de Brito se confundem. A cidade, fundada em 1945, completa 75 anos em dezembro. A carreira do barbeiro mais antigo de Dracena completou ontem, 4, 60 anos.

Tempo o bastante para o senhor de 79 anos acumular diversas histórias e dizer tranquilamente que se sente realizado por tudo o que construiu. “Construí toda minha carreira aqui em Dracena. Desde o começo foi assim. Vivi muita coisa nessa profissão e vi o crescimento dessa cidade”, disse Escurinho.

Segundo ele, o sentimento que carrega por todos esses anos na profissão é de dever cumprido. “Quando a cidade completou 60 anos (em 2005) fui convidado pelo prefeito para receber uma comenda das mãos dele. Tudo isso por ter colaborado com o crescimento da cidade”, disse ele.

O início não foi fácil, o material de trabalho antigamente dificultava o serviço. “Antigamente era muito mais difícil. No meu tempo não existia máquina de cabelo elétrica. A gente fazia tudo na mão mesmo. As maquinas manuais eram complicadas. Tinha que apertar o aparelho para os pentes conseguirem cortar o cabelo”, ressaltou o senhor de fala calma.

A rotina de Escurinho começa bem cedo. Ele acorda ás 6h30, prepara o café da manhã em casa, toma banho, se arruma e vai para o salão. “Chegando aqui eu preparo o cafezinho para os clientes. Depois disso meu filho e o Airton (ambos são funcionários do salão) chegam. Eles ficam até mais tarde. Eu adoro chegar cedo em casa, jantar e assistir minhas novelas”, falou o bem-humorado senhor.

Quando perguntado o que ele achava do apelido de ‘barbeiro’ que os maus motoristas carregam há anos, Escurinho teve classe. “Foi alguém de mal gosto que fez esse tipo de piada e colocou o nome da nossa profissão como alguém que erra no trânsito. Não sei o motivo disso, mas quando carrega toda experiência que adquiri em 60 anos, o barbeiro consegue disfarçar até quando erra. Joga um pouco de cabelo para um lado, penteia um pouco de cabelo para corrigir a falha, tudo para que o freguês não perceba. Nesses anos todos posso dizer que errei pouco”, disse ele.

Pensar em parar? Nem pensar! Segundo ele segue firme na ativa e pronto para continuar trabalhando. “Não penso em parar. As mãos não estão balançando, estou enxergando muito bem. Me sinto disposto. A gente quando faz algo com amor, é difícil errar e não cansar do que faz. Eu amo muito minha profissão. Aqui eu criei minha família. Tenho medo de um dia parar e não ter para onde ir durante o dia. O salão é a extensão da minha casa”, disse Escurinho.

Legado

O legado desses 60 anos de profissão está bem próximo dele. Ronne Cesar de Brito, filho de Escurinho, trabalha como barbeiro há 32 anos e divide o salão com seu pai desde o começo da carreira. “É um aprendizado gigante. O legado dele tem muita importância. Eu trabalhei com outras coisas durante minha vida, mas foi ser barbeiro que eu aprendi e não tive para onde fugir. Está no sangue”, disse Ronne.

A vivência e a experiência ao lado do pai, deixa Ronne visivelmente orgulhoso da história que ele construiu. “Garanto que se eu chegar próximo do que ele foi, eu já estarei ganhando”, finalizou Ronne.

Airton da Silva, funcionário do salão há um ano e barbeiro há 31 anos, falas com orgulho. “Somos a substituição do que ele fez. Serve muito de exemplo e aprendizado para mim”, disse ele.

Clientela

Um dos clientes mais antigos do salão de cabeleireiro do Escurinho é o aposentado Valter João Rizzi bem que tentou, mas não conseguiu deixar de lado o atendimento do amigo. “Desde quando cheguei em Dracena é aqui que corto meu cabelo e faço a barba. A amizade é grande e gostosa. Já estou acostumado. Tentei mudar de barbeiro, procurar ser atendido por outro, mas não consegui. Criei um vínculo tão grande que a fidelidade não poderia ser deixada de lado. Aqui, o atendimento sempre vem com algo a mais”, finalizou Rizzi.

Segundo o próprio Escurinho, alguns clientes vão visita-lo até mesmo quando não serão atendidos. “Sempre tive muitos clientes. O mais legal é que muitos deles chegam para conversar conosco e não para cortar o cabelo. Temos um relacionamento muito bom, é uma experiência legal”, finalizou o sessentão de barbearia.