O deputado federal Domingos Sávio (PSDB/MG) acredita que a aprovação da Nova Lei do Gás — que ocorreu na madrugada desta quarta (17) na Câmara — vai permitir que o Brasil desenvolva o setor de gás natural que, na visão do parlamentar, está em retrocesso e atrasado há décadas na comparação com outros países.
Nesta quarta, a maioria dos parlamentares votou pela rejeição de todas as emendas aprovadas no Senado no fim do ano passado (Projeto de Lei 4.476/2020). Agora, a proposta segue para sanção do presidente Jair Bolsonaro. A tramitação do marco regulatório do gás natural levou cerca de oito anos, desde que o primeiro texto foi apresentado no Congresso Nacional.
A restauração do texto original, que já havia sido avalizado pela Câmara em setembro de 2020, foi costurada pelo relator junto ao Governo Federal, entidades representativas dos consumidores e do setor produtivo e parlamentares. Segundo Sávio, o País precisava de uma legislação mais moderna no setor de gás natural, que incentive a competitividade e ajude a baratear o preço do combustível.
“O Brasil tem um dos preços mais elevados do mundo para o gás natural e também para o gás de cozinha. Com esta legislação, o que queremos é baixar o preço do gás, trazendo concorrência para o mercado”, ressaltou o parlamentar.
Além do preço alto, que chega a ser três vezes maior do que na vizinha Argentina, o setor de gás natural carece de concorrência, segundo especialistas. A Petrobras é responsável por 100% da importação e 80% da produção do item.
“A ausência de concorrência que existe hoje no setor, que tem uma estrutura de legislação arcaica, cartelizante, não permite que o gás natural chegue às indústrias e ao consumidor”, afirma Sávio. O tucano completa que já sentiu na pele os efeitos da concentração do mercado atual.
“Eu fui prefeito de Divinópolis, cidade que se localiza a menos de 100 quilômetros de uma refinaria da Petrobras, a menos de 100 quilômetros de um grande gasoduto. E há décadas lutamos para levar um gasoduto para lá, para beneficiar diversas cidades, uma região populosa que está ao lado de Belo Horizonte, e não conseguimos, porque não há o menor interesse em se fazer isso”, critica.
Marco
O texto aprovado viabiliza a quebra do monopólio da Petrobras no setor. A empresa, inclusive, tem vendido suas participações nas cadeias de transporte e distribuição desde 2019, quando celebrou acordo com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
A Nova Lei do Gás tenta facilitar a construção e ampliação de gasodutos pela iniciativa privada. A ideia é que as empresas que desejem explorar o serviço precisem apenas da autorização da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Atualmente, a legislação exige a concessão (em que a empresa precisa vencer um leilão promovido pelo governo).
As nove emendas aprovadas ao texto pelo Senado foram rejeitadas pelos deputados. Algumas delas geraram bastante polêmica. Um dos pontos de maior tensão dizia respeito aos critérios de classificação de gasodutos. Pela proposta da Câmara, a ANP seria a responsável pela classificação dos dutos de transporte. No entanto, o texto aprovado pelos senadores retirou essa competência, transferindo-a para os estados.
Na visão de especialistas e defensores do texto original, o PL aprovado no Senado também dificultava outro avanço conseguido na Câmara: o acesso de novos agentes/terceiros às infraestruturas essenciais da cadeia do gás, como gasodutos de escoamento, terminais e unidades de tratamento. Para Bernardo Sicsú, diretor de eletricidade da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel), a emenda “colocava em risco a criação de um mercado aberto, dinâmico e com liquidez”.
Com a aprovação, o projeto prevê que os ofertantes de gás vão ter acesso facilitado a essas estruturas. Outro dispositivo importante também aprovado visa impedir que uma mesma empresa atue em todas as fases, da produção/extração até a distribuição. Especialistas esperam que novos agentes passem a atuar no setor, aumentando a competitividade e reduzindo o preço final do gás para as empresas e o consumidor final.
Embora tenha grande potencial de produção, principalmente por causa do pré-sal, o Brasil tem o gás natural entre os mais caros do mundo. Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) aponta que o preço médio do combustível no País é US$ 14 por milhão de BTUs (unidade de medida), enquanto na Argentina, é de US$ 4 por milhão de BTUs.
Segundo projeção do Ministério da Economia, a Nova Lei do Gás pode reduzir em até 50% o valor do produto para a indústria. Além disso, a proposta tem potencial para trazer R$ 60 bilhões em investimentos por ano e gerar 4,3 milhões de empregos.