Em uma cirurgia inédita na literatura médica brasileira, o setor de ginecologia do Hospital das Clínicas de São Paulo removeu um cisto de ovário de 16 litros por um corte de 1,2 cm no umbigo.

O volume equivale ao de duas melancias de 7 kg cada uma ou ao de oito garrafas PET de dois litros.

É a primeira cirurgia de cisto desse porte por videolaparoscopia –cistos menores já são rotineiramente retirados por via laparoscópica.

No caso do cisto gigante, além da incisão no umbigo, foram feitos outros dois cortes de 0,5 cm no abdome por onde passaram as pinças e outros instrumentos.

 Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress 

ASPIRAÇÃO

O ginecologista Sérgio Conti Ribeiros, chefe do setor de laparoscopia, explica que, primeiro, aspirou todo o líquido do cisto por meio da incisão no umbigo. Depois, retirou a cápsula (membrana) do cisto e o resto do material.

Segundo ele, o principal requisito para esse tipo de cirurgia é o cisto ser benigno.

Em geral, afirma o médico, a remoção de cistos gigantes é por laparotomia, operação que envolve um corte vertical ou horizontal de 15 cm de extensão na região pélvica (parecido com o da cesariana).

Nesse procedimento, a paciente fica três dias internada e leva até um mês para retomar as atividades. Com a videolaparoscopia, em 24 horas recebe alta e, em uma semana, pode voltar à rotina.

O sucesso do método foi demonstrado em mais dez casos de pacientes com cistos de ovário acima de seis litros, atendidas no HC.

Os resultados serão apresentados em congresso médico que acontecerá em novembro, em Washington.

Segundo Ribeiros, os cistos ovarianos crescem nessas proporções por características próprias ou pela demora enfrentada pela paciente para conseguir um diagnóstico e um tratamento.

Foi o que aconteceu com a diarista Maria Aparecida Tenório, 46, a paciente que retirou o cisto de 16 litros.

Moradora de Embu-Guaçu, região metropolitana de São Paulo, ela conta que passou dois anos se queixando no posto de saúde sobre o aumento da barriga, mas não conseguiu se consultar com o ginecologista.

BARRIGA D’ÁGUA

“O clínico-geral disse que era ‘barriga d’àgua’ [esquistossomose]. Como o meu exame de Papanicolaou sempre dava negativo, disseram que eu nem precisava passar com o ginecologista”, diz Maria.

O papanicolaou é usado para diagnóstico de câncer do colo do útero. É preciso um exame de imagem para detectar cistos ovarianos.

Enquanto isso, a barriga só crescia. “Se eu não tivesse ligado as trompas, pensaria em um bebê. Aquela coisa mexia dentro de mim”, afirma a diarista, mãe de quatro filhos e laqueada há 14 anos.

Depois de muito insistir, Maria conseguiu se consultar com um gastroenterologista. “Só de me olhar ele disse: ou a senhora está com tuberculose ou tem cisto no ovário.”

Encaminhada ao Hospital das Clínicas, ela fez a cirurgia de remoção do cisto após esperar mais dois meses. “Me internei pesando 79 kg e saí com 55 kg. Foi um alívio.”

Conti comparou a barriga de Maria à de uma gravidez de “20 meses”. Segundo ele, de 4% a 5% das mulheres atendidas no HC com cistos ovarianos têm os gigantes.

A paciente mais nova tinha 16 anos, e teve removido um cisto de oito litros.

“No bairro, todo mundo pensava que a menina estava grávida e era mãe solteira. Ela ficou muito feliz de sair só com três furinhos na barriga e brincou: ‘Pelo menos não vão achar que eu fiz uma cesariana e dei o bebê.”