Após os três primeiros casamentos homoafetivos ocorridos em Dracena neste mês, muitos questionam as atitudes que os homossexuais vêm tomando em suas vidas, principalmente pelo fato de assumir publicamente um relacionamento e admitirem sua orientação sexual perante toda a sociedade, que em pleno o século XXI, infelizmente na maioria das vezes mostra-se homofóbica.

A reportagem entrevistou a psicóloga Andréa Fernandes de Araújo na semana que passou. Ela explica que ser homossexual não se trata de uma doença ou um desvio de caráter e, que muitas vezes não é culpa dos pais, os filhos terem atração por outra pessoa do mesmo sexo. A questão é que, a homossexualidade, é o mais difícil tema relacionado à sexualidade, por se tratar de um assunto tão complexo.
A profissional de Psicologia que segue a linha da psicanálise conta que o termo de união homoafetiva foi adotado para ressaltar uma questão afetiva deste indivíduo e não somente tratar do lado sexual. “Antigamente tratava-se da questão da sexualidade e hoje estamos falando de algo que é afetivo, é muito mais importante do que a questão sexual. Trata-se de uma escolha livre. Essa característica que até dentro da Psicologia e da Psiquiatria mostrava que a homossexualidade se configurava como uma patologia, uma perversão, vem sendo desconstruída, inclusive dentro da Psicologia e da Psiquiatria. É uma tendência a desconfigurar essa questão sexual e pensar na questão afetiva, pois não se trata de uma doença”, avalia.
Andréa ressalta ainda que ser homossexual está associado a identificação do indivíduo durante o desenvolvimento da pessoa, não é algo genético e sim uma configuração da estrutura familiar com os papéis masculino e feminino, como eles se organizam e de que forma este indivíduo irá se identificar. “Os hormônios também têm um grande papel. Casos como, por exemplo, o excesso de testosterona em uma menina vai dar configurações mais masculinizadas, mas isso não é suficiente para dizer da identidade sexual. Por isso não é correto afirmar que somente isso determina a identidade sexual da pessoa. Outro fato é que um menino que deveria se identificar mais com o pai, de repente se identifica mais com a mãe, o mesmo ocorre com as meninas. Tudo isso também está relacionado a uma dinâmica familiar”.
A psicóloga relata que a maioria das pessoas se descobre já na fase adulta, mas acredita que isso seja algo que tenha aparecido em algum momento da vida e que foi reprimido. “Chega uma hora que tudo isso irá vir à tona. Por isso é comum vermos pessoas que casaram teve filhos, mas acabaram tornando-se homossexuais, porque tinham uma tendência muito forte que não puderam viver, até mesmo pelo próprio preconceito”.
Andréa enfoca ainda que há casos de casais do mesmo sexo que é comum um se comportar como a ‘mulher’ da relação e o outro como o ‘homem’, porém isso não é uma ‘lei’ que ocorre com todos os casais homossexuais. Ainda há casos de casais heterossexuais que o papel está invertido. “Há casos que é possível notar nitidamente que o homem é passivo, não que ele seja afeminado, mas você o vê com poucas atitudes masculinas e de mulheres com muitas atitudes masculinas, ou seja, mulheres mandonas, dominadoras, agressivas. Tudo isso é muito mais complexo do que se pensa. É como se a identidade deles estivessem invertidas, apesar de serem casais heteros”, afirma a psicóloga.
FILHOS – O termo e modelo familiar pai, mãe e filho vem sendo desconfigurado da Psicologia. A psicóloga dracenense acentua que agora o certo é adotar o termo ‘novas configurações’ que vem sendo reconstituído pelos psicólogos e que admite em uma família dois homens casados, duas mulheres casadas, mãe e um filho, pai e filho, um avô e uma avó. “Dentro da dinâmica da família, se você tem um que faz claramente o papel de pai e outro de mãe você acaba tendo uma estrutura ‘normal’ como outra qualquer. São os papéis que definem, não é o sexo da pessoa e sim a postura. A atitude que esta pessoa irá comportar e passar para uma criança”, completa.
Para evitar o bullying por parte dos estudantes e amiguinhos, a orientação é que os pais e até mesmo a escola, através de seus educadores conversem claramente com as crianças e jovens sobre a necessidade de respeitar as diferenças e que nem toda família tem o ‘comportamento padrão’ imposto pela sociedade.
Para os pais do mesmo sexo, a orientação é ser direto no momento de conversar com os seus filhos e explicar a questão da homossexualidade de uma forma clara e objetiva e a situação que ocorre dentro de casa. “Se tudo for muito bem conversado e essa criança entender que dentro de casa tem amor, um lar onde ela pode se sentir segura e que ela pode confiar, isso será tranquilo para a criança, mesmo que elas acabem sentindo certa discriminação fora de casa. Há muitos casais heterossexuais que não oferecem esse tipo de confiança a seus filhos”, pondera Andréa.
Ela garante ainda que mesmo as crianças que hoje estão numa faixa etária de 5 a 7 anos de idade deverá levar um certo tempo para assimilar e aceitar as mudanças que vêm ocorrendo no cotidiano da vida familiar. Isso envolve mudar a mentalidade dos educadores e de toda uma sociedade, ou seja, deixar de ter preconceito. “O fato é que essas crianças irão sentir sim, porque culturalmente e historicamente, as coisas configuraram de outra forma. Mas isso não quer dizer que essa criança irá ter problema. Tudo dependerá do manejo da situação, principalmente dentro de casa. Dependendo de alguns casos também é necessário de um acompanhamento psicológico”.
A psicóloga garante ainda que não significa que filhos de casais homossexuais, necessariamente apresentarão problemas de convívio. A maioria das crianças e jovens se desenvolve normalmente.
PRECONCEITO – Muitos pais acabam achando normal a situação de uma pessoa ser homossexual, porém quando isso acontece na casa deles, acabam não aceitando. “A orientação é que esses pais não se sintam culpados. As pessoas que se tornam homossexuais são filhas de relação heterossexuais, é claro. Quantas pessoas que a gente conhece que se dizem ser heteros e não conseguem assumir um vínculo, ou seja, que não conseguem estabelecer uma relação afetiva e se dizem heterossexuais”, aponta a psicóloga.
Muito antigamente, a homossexualidade era vista como uma incapacidade de lidar com o diferente e de aceitar o outro com suas diferenças e com uma diferença que se completa. “Isso nos primórdios da psicanálise do século passado como Freud (criador da psicanálise) dizia. Atualmente se nota uma geração de heterossexuais cada vez mais vazios e insatisfeitos consigo mesmos e com seus relacionamentos. Uma geração de pessoas cada vez mais individualistas”, conclui.