Para a Espanha, os trens de alta velocidade são o futuro das viagens de longa distância.
Desde fevereiro de 2008, os trens da AVE (Alta Velocidade Espanhola) fazem a ligação de 600 quilômetros entre as duas principais cidades espanholas, Madri e Barcelona.
A distância, que antes era percorrida em quatro horas e meia, agora leva a metade do tempo.
E desde julho deste ano, o número de passageiros de trem nessa rota ultrapassou o dos aviões.
A rota entre as duas cidades era até então um dos corredores aéreos mais lucrativos do mundo.
Avanço rápido
A Espanha começou a investir tarde nos trens de alta velocidade, com a inauguração da primeira linha, entre Madri e Sevilha, em 1992.
Mas o país avançou rápido e já tem 1.835 quilômetros de trilhos em operação.
O governo espanhol diz que a rede de trens-bala do país ultrapassará no ano que vem as do Japão e da França, para se tornar a maior do mundo em extensão.
“Nós transportamos hoje 40 mil passageiros por dia”, afirma Abelardo Carrillo, diretor dos serviços do AVE na companhia espanhola de trens, a Renfe.
“O AVE é um grande sucesso, tanto em termos comerciais quanto em termos de opinião pública. E há duas razões-chave: tempo de viagem competitivo e um nível de serviço tão bom quanto o das companhias aéreas”, diz.
Conforto e conveniência
Os preços das passagens são semelhantes aos das companhias aéreas, numa demonstração de que os operadores confiam que os passageiros escolherão os trens por uma questão de conforto e conveniência, não de preço.
“O modelo espanhol é bem diferente do modelo populista da França, onde os passageiros pagam tarifas mais baixas por um padrão de serviço inferior”, explica o professor Josep Sayeras, da escola de administração Esade, em Barcelona.
“Aqui, a Renfe estabelece tarifas mais altas, acreditando que os homens de negócios farão a viagem de qualquer maneira”, diz.
Até aqui, a estratégia parece estar dando certo, e o AVE opera com lucro.
Atenção do exterior
O projeto espanhol vem atraindo uma atenção considerável do exterior.
No Reino Unido, ao propor uma ligação de alta velocidade entre Londres e Glasgow, o governo argumentou que, no caso do AVE, os trens espanhóis tomaram mercado das companhias aéreas e promoveram o desenvolvimento econômico regional.
Nos Estados Unidos, o governo de Barack Obama destinou um orçamento de US$ 8 bilhões para investimentos em trens de alta velocidade, levando o secretário dos Transportes, Ray LaHood, a testar o serviço do AVE durante uma viagem à Espanha em junho.
“Vocês sabiam que a Espanha tem o objetivo de estabelecer estações de trens de alta velocidade até no máximo 50 quilômetros da casa de 90% dos espanhóis até 2020?”, escreveu LaHood em seu blog. “Isso é que é ambição”, disse.
Ao apoiar os trens-bala, os administradores públicos podem justificar a escolha por um modelo de transporte que é simultaneamente tradicional e moderno, e que reduz tanto os congestionamentos quanto as emissões de gases poluentes.
A União Internacional de Ferrovias estima que o AVE produz um sexto das emissões de CO2 por passageiro do que os aviões.
Desenvolvimento
Na Espanha, o AVE também trouxe desenvolvimento econômico para cidades menores servidas pela linha de trens-bala.
Entre essas cidades está Zaragoza, a meio caminho entre Madri e Barcelona.
“Zaragoza é o novo centro de negócios da Espanha, porque as pessoas de Madri e de Barcelona agora se reúnem aqui no meio”, afirma com orgulho Manuel Teruel, presidente da câmara local de comércio.
Citando os hotéis e centros de conferência modernos que foram erguidos no entorno da estação do AVE, ele diz que o número de feiras de negócios na cidade triplicou nos últimos cinco anos.
Teruel afirma que o trem de alta velocidade tornou mais produtivas as empresas locais, cortando o custo e o tempo das viagens de negócios.
E com o aumento de 28% no número de turistas na cidade desde 2005, Teruel argumenta que a associação com o meio de transporte moderno também tornou a cidade mais atraente.
“O AVE simboliza a tecnologia e o futuro. É uma questão de imagem”, diz.
Investimentos em questão
A Renfe está planejando um investimento adicional de 120 bilhões de euros na próxima década, com cerca de 80% desse montante pago pelo próprio governo espanhol.
Mas os críticos questionam se a quintuplicação proposta da rede de trens, para chegar a 10 mil quilômetros até 2020, é realista no atual clima econômico.
“A Espanha está em uma crise econômica e tem um grande déficit fiscal. Neste clima, o governo precisa escolher com mais cautela onde vai investir. E para mim, a expansão da rede não deve ser uma prioridade”, afirma o economista Sayeras.
Carrillo, da Renfe, admite que, em tempos difíceis, os administradores devem segurar os nervos para tomar as decisões.
“Por conta dos orçamentos envolvidos, essas são decisões políticas com um grande peso”, afirma. “Mas nossa experiência até aqui é que o investimento vale a pena.”