Nos últimos dois anos, Cuba é alvo de uma série de mudanças internas intensas. O governo do presidente Raúl Castro estimulou a demissão voluntária de 178 mil funcionários públicos, autorizou atividades privadas em mais de 170 profissões, permitiu a abertura de lojas e mercados, além da compra de computadores pessoais. Mas o mesmo bloqueio econômico que levou Castro à abertura é responsável pelos impedimentos para a execução dessas medidas.
O impasse entre o planejado e o resultado obtido está em todo o país. Nas praças e jardins, acumulam-se trabalhadores desocupados que tentam aproveitar as horas livres, conversando ou apenas deixando o olhar perdido. Não há dados oficiais sobre o percentual de desemprego, mas as pessoas se queixam da falta de oportunidades.
Muitos cubanos se oferecem aos turistas como guias informais e até companhias para, em troca, receber pagamentos. A história do médico intensivista Juan Pablo Luis é comum a muitos cubanos. Ele abandonou a profissão para ser taxista. Segundo o médico, a opção, “bastante dolorosa”, foi tomada depois que o filho, de 11 anos, nasceu e ele viu a situação ficar mais difícil. “Sonho todos os dias que estou trabalhando na minha profissão. Não gosto de falar sobre isso”, disse.
O diretor do Centro de Investigações da Faculdade Mundial e professor adjunto da Faculdade de Economia da Universidade de Havana, Osvaldo Martínez Martínez, defendeu que apenas o “fortalecimento regional” pode vencer a “pressão” exercida pelo embargo econômico sobre Cuba. Mas segundo ele, os países desenvolvidos atuam para evitar esse fortalecimento. De acordo com professor, há um incentivo para a “desintegração regional”.
“Há um esquema de ‘desintegração regional’ que tende a vincular [de forma dependente] a América Latina aos Estados Unidos e à Ásia. Este tipo de vínculo me parece que tem mais de desintegrador do que de integrador”, afirmou Martínez. “O ideal seria a imprensa defender essa integração com elementos de solidariedade, de combate à pobreza e à desigualdade social. A integração é um grande tema para o futuro.”
A desintegração citada pelo professor pode ser vista nas ruas de Havana. Nos mercados e lojas, há poucos produtos à venda. Garrafas de água e papel higiênico são produtos raros, assim como a carne de boi e variedades de verduras e frutas. As batatas fritas, em lata, vêm da Malásia. A Coca-Cola é produzida no México. Em média, uma lata de refrigerante sai a Cu 1,5 (US$ 1,5) – a moeda oficial cubana para estrangeiros – e a de batatas fritas a Cu 3 (US$ 3). Faltam água e energia com frequência na capital cubana.
Caminhando por Havana é possível esbarrar em defensores da Revolução Cubana e também em críticos do sistema. O vice-presidente da União dos Jornalistas de Cuba (cuja sigla em espanhol é UP), Luis António Martín, é um dos que defendem o regime. Para ele, jornalismo e patriotismo andam juntos.
“Os desafios da gente são os mesmos do nosso país: como manter-se diante de tamanho bloqueio e também com ameaças e campanhas contrárias a Cuba”, disse Martín. Como ele pensa o jornalista Enrique Torres de la Torre, editor-chefe da Prensa Latina, única agência pública de notícias de Cuba. “Um jornalista em Cuba se pergunta: ‘Será que isso vai afetar meu país? Porque sou, sobretudo, um patriota'”, acrescentou.
Com cautela, no entanto, o taxista William Garcez se mantém crítico em relação às mudanças anunciadas pelo governo e em execução em Cuba. “Que mudanças? Não vejo mudança alguma. É como se o mundo girasse e aqui estamos sempre parados”, disse ele. “Não percebo vontade das pessoas em buscar mudanças.”