A britânica Anna Ruston (nome fictício) tinha apenas 15 anos quando foi sequestrada e mantida em cativeiro como escrava sexual, em uma casa na região central da Inglaterra.
Agora, aos 44 anos, ela acaba de lançar o livro Secret Slave (Escrava Secreta, em português), no qual conta o seu drama – ela passou 13 anos presa – e como sobreviveu.
O caso tem ecos da história da austríaca Elizabeth Fritzl, que foi mantida por 24 anos no porão da casa de seu pai, Joseph Fritzl, que a estuprava sistematicamente. Até hoje, passados 16 anos, Anna tem medo e não identifica o sequestrador – um motorista de táxi asiático a quem deu o nome de Malik.
Ela relatou seu caso a Samantha Haque, repórter do programa Today da BBC Radio 4.
Sequestro e estupro
Anna conta que era rejeitada pelos pais, e que conheceu o taxista Malik em 1987. Ele era bondoso com ela, ficaram amigos e, um dia, ele a convidou para conhecer sua família e tomar um chá.
Malik morava com os irmãos, suas mulheres, filhos e a mãe. Depois do chá, insistiu para que ela passasse a noite na casa. Começava o inferno da jovem, que foi estuprada nessa mesma noite.
“Eu imaginava que um dia ele ia entrar no quarto e dizer: ‘Calce os sapatos e vamos’. Mas isso nunca aconteceu”, diz Anna.
“Ele me chamava de ‘escória branca’ e dizia: Faça tudo o que eu mando ou você sabe as consequências”, continua.
A garota era sistematicamente estuprada e sofria abusos e maus-tratos também dos parentes e amigos do sequestrador, que a oferecia como prostituta.
Anna teve quatro filhos que foram entregues a desconhecidos. Ela lembra o nascimento do primeiro bebê:
“Segurei meu primeiro filho, tão pequeno… Os dias foram passando e quando eu vi que ele havia sido circuncidado e estava com a cabeça raspada, soube que nunca mais o veria novamente”.
“Nunca me deixaram amamentar, trocar fralda, mudar roupinha. Simplesmente mantinham o bebê longe de mim”.
Isso se repetiu com os outros três filhos de Anna no cativeiro. “Tiraram todos eles de mim”.
Tentativas de suicídio
Anna foi parar no hospital várias vezes por causa de surras e tentativas de suicídio depois de fugas fracassadas.
Durante as internações, ninguém desconfiava da sua situação e ela admite que se sentia incapaz de escapar de Malik.
“Havia sempre três ou quatro pessoas comigo. Eu nunca ficava sozinha com os médicos e não podia falar com eles. Só balançava a cabeça”.
“Eu torcia para alguém sair da sala para eu poder dizer ao médico: preciso de ajuda, estou em cativeiro, tenho que sair. Mas eles nunca saíam do meu lado”.
“Se eu ia ao banheiro, iam junto ou ficavam na porta. À noite, dormiam perto de mim e diziam que estavam cuidando de mim”.
A tortura continuou até que um dia Malik anunciou que Anna iria com ele e a família para o Paquistão.
“Quando ele disse isso, pensei que só tinha duas saídas: me matar ou fugir. Eu sabia que não estava indo para uma festa e achava que provavelmente eles iam me apedrejar até a morte”.
A fuga
Anna conta ter conseguido passar um bilhete pedindo socorro para uma assistente social que tinha ido visitar seu quarto filho. A mulher concordou em ajudá-la.
Durante as preces do Ramadã, o mês sagrado dos muçulmanos, Anna finalmente conseguiu fugir.
“Eles rezavam no quarto ao lado e eu vi que a chave estava na porta. Desci, abri a porta, senti o ar fresco e corri, corri muito até o carro da assistente social, que esperava na esquina”.
A polícia tentou interrogá-la, mas Anna se negou a ajudar, pois até hoje teme pela sua vida.
“Ele tirou tudo de mim. Eu me sentia péssima, suja. Espero que as pessoas não me julguem e que seja feita justiça por tudo o que esse homem me fez passar”, conclui.