Primeiro jogador da seleção brasileira a se pronunciar sobre os protestos que marcaram a Copa das Confederações, o zagueiro Thiago Silva pediu calma numa possível repetição das manifestações no próximo sábado, quando a equipe enfrenta a Austrália, em Brasília, no primeiro 7 de setembro após o acirramento dos ânimos.

Em entrevista ao UOL Esporte, o jogador do PSG e capitão da seleção, que se apresenta nesta segunda-feira na capital federal, expressa preocupação com possíveis distúrbios, mas ao mesmo tempo celebra o reencontro com a torcida – uma ocasião que até há pouco tempo era vista com apreensão pelos jogadores.

Na entrevista, Thiago também revela bastidores da seleção na Copa das Confederações, incluindo o ”plano de batalha” para a final contra a Espanha. O zagueiro conta ainda que está esperando a retratação dos colegas estrangeiros que zombavam da má fase da seleção.

O primeiro amistoso da seleção em casa  desde a Copa das Confederações vai ocorrer num feriado nacional e numa das cidades que mais teve protestos há alguns meses. Preocupa?
Thiago Silva: Como disse durante a Copa das Confederações, o povo tem o direito de protestar. Isso não mudou. A gente só espera que as pessoas, quando estiverem protestando, não deixem que os baderneiros atrapalhem. Não permitam que o pessoal interessado em confusão atrapalhe. Em nenhum momento isso ajuda o Brasil. O país fica mal visto quando a coisa passa do limite. Se tiver que ir para a rua, que vá com consciência. Mas nós jogadores estamos felizes em voltar a jogar diante de nossa torcida.

A relação da seleção com a torcida mudou da água para o vinho depois do torneio, não?
Eu tinha receio de jogar no Brasil. Fizemos um amistoso contra a Holanda (empate sem gols em junho de 2011, em Goiânia) e fomos vaiados demais. Pensei em pedir à CBF que, de repente, não fizesse tantos jogos no Brasil. Porque naquele momento a recepção estava tirando nossa confiança e na verdade ajudava os adversários. Mas as coisas mudaram muito a partir do amistoso com a Inglaterra, no Maracanã. Ali a torcida aplaudiu a gente, mesmo sem o time ganhar. Mas até ali estávamos receosos.

E aí veio o ”hino prolongado” em Fortaleza…
Aquilo foi fora do normal, virou uma arma nossa e até o treinador da Espanha disse depois que a gente começou a ganhar a final com aquela atmosfera no estádio. Mas houve um outro episódio que me marcou muito em Fortaleza. A gente foi do aeroporto ao hotel num ônibus que tinha um insulfilme muito grosso. As pessoas não conseguiam ver a gente. O Júlio Cesar pediu para a comissão técnica que tirasse. A gente sabe como um tchau nosso pode alegrar o torcedor. Tem gente que fica horas esperando para tentar nos ver.

Há muito debate sobre como esse contato com o povo tem de ser. Os jogadores são favoráveis a uma aproximação maior?
O Felipão sabe diferenciar o dia de fechar e abrir treino. Nós que jogamos na Europa dificilmente treinamos com torcida e imprensa. A seleção é do povo e o povo tem que participar. Mas tem momento certo para isso e a torcida tem que saber respeitar. Se o treino é aberto, não dá para ir lá e ficar gritando ”burro”, ”ruim” ou ficar pedindo este ou aquele jogador. Torcedor não é treinador e um cara que quer arrumar confusão acaba atrapalhando os 100 que estão ali. Existe também a preocupação de que alguma coisa aconteça. Se alguém se machuca, a responsabilidade é nossa. No treino aberto que fizemos em Fortaleza, o Felipão queria abrir o treino, mas houve aquela confusão com a polícia e as pessoas ficaram agitadas. O Marcelo queria jogar a camisa dele para a torcida, mas a gente pediu para não fazer, porque poderia dar tumulto.

O título tirou um peso das costas dos jogadores?
Da maneira como foi, com uma vitória sobre uma das melhores seleções do mundo, foi muito melhor do que poderíamos imaginar. Mas não estamos num mar de rosas. Temos mais tranquilidade para trabalhar do que antes, mas os jogadores sabem que temos um longo caminho pela frente.

Você uma vez contou que ouvia gozações de colegas estrangeiros sobre o momento vivido pela seleção. Vieram os cumprimentos depois do título?
Era muito duro ouvir as gracinhas. Agora que a gente ganhou, ninguém disse mais nada. Ganhamos de França, Itália e Espanha e eu não recebi um SMS sequer dos estrangeiros. Prefiro ver isso com um sinal de respeito. As pessoas não estavam respeitando a seleção como antes, a gente precisa mostrar força. Todo mundo achou que jogaríamos na defesa contra a Espanha, que iríamos ficar atrás. Mas partimos para cima.

Como foi a preparação para aquele jogo?
Discutimos três dias seguidos o que era melhor fazer jogando contra a Espanha. Foi uma assembleia, ouvimos o depoimento do Dante e do Luiz Gustavo, que tinham enfrentado o Barcelona com o Bayern na Liga dos Campeões. O próprio Daniel, que viu a dificuldade, falou também. Discutimos se defendíamos ou atacávamos. O Felipão perguntou: “O que vocês querem fazer?”. Foi engraçado, pois todo mundo respondeu ao mesmo tempo que a gente iria para cima. Tinha algo diferente na noite do jogo. Estava todo mundo com sangue no olho. Queríamos amassar os caras.