Ajustes fiscais duradouros e de boa qualidade são os que se baseiam em corte de gastos. Os de pior qualidade, e mais recessivos, são aqueles que dependem de aumento de impostos.
Redução de gastos possui nítidas vantagens: cortam gorduras e ineficiências, combatem os “rent seekers” (agentes que tentam obter renda manipulando o ambiente político) e a corrupção, diminuem a demanda do setor público por poupança privada e preservam a capacidade de investimento das empresas.
Já os ajustes baseados em aumento de tributos são mais simples, porém não possuem muitas das qualidades acima, além de serem recessivos ao asfixiarem o setor produtivo e o consumo das famílias.
O ajuste que começa a ser posto em prática no Brasil é perverso, pois envolve elevação de tributos, como a Cide, IOF, PIS-Cofins, o fim de isenções e desonerações de IPI e INSS, e até possivelmente a recriação da CPMF. O aumento de carga tributária poderá chegar a 2% do PIB.
Por outro lado, as reduções de gastos públicos ainda são hipotéticas, e apesar da elogiável disposição do ministro Joaquim Levy em implementá-las, já enfrentam enorme oposição política e popular.
Os obstáculos para reduzir despesas são notórios no mundo todo, mas particularmente perceptíveis no Brasil, que optou por um modelo de estado de bem-estar social, sem dispor de meios para financiá-lo.
O corporativismo, a cultura do “direito conquistado”, a demagogia, o populismo e a ditadura do “politicamente correto” transformaram o país na “república dos coitadinhos”, onde os que são considerados “vulneráveis” julgam-se detentores de privilégios a ponto de desafiarem as autoridades constituídas para conquistarem suas metas. Questões objetivas de equidade e eficiência acham-se subordinadas à lógica do combate à desigualdade a qualquer custo.
Outro foco de dificuldade para cortar despesas diz respeito ao processo orçamentário brasileiro, que é incremental. Propostas orçamentárias adotam como premissa que os gastos e ações em andamento são justificáveis pelo simples fato de já existirem, cabendo aos que elaboram, aprovam e executam os orçamentos públicos interferirem apenas em decisões marginais de acréscimos ou de reduções desses programas. Os orçamentos tornam-se rígidos e inflexíveis para baixo. Sobrevivem por pura inércia.
Vê-se, portanto, que no tocante à redução de gastos públicos as dificuldades são enormes. Basta lembrar que apenas 10% das receitas federais são destinadas a gastos discricionários -não obrigatórios por lei-, incluindo investimentos.
Em resumo, não bastasse o descalabro que este governo gerou em sua gestão orçamentária, que seria corrigido com a adoção do método de orçamento base-zero (que todo ano revisa e avalia a eficiência dos gastos do ano anterior), o ajuste trilha o caminho mais ineficiente e recessivo para corrigir os seus próprios erros, aumentando a já exorbitante carga tributária brasileira.

*doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas).