Nunca me encantei muito com a ideia de se estabelecer um dia especial para este ou aquele nem para isto ou aquilo pelo simples fato de que as principais datas comemorativas nacionais e internacionais se transformaram via de regra em dias de maior consumo. Mas recentemente temos observado o estabelecimento de dias que procuram chamar a atenção para problemas sociais: dia da consciência negra, dia do meio ambiente, dia mundial da justiça social, etc.

De todos estes talvez a escolha mais acertada seja esta última, pois qualquer outro dia, seja ele Natal, Páscoa, Dia dos Pais ou das Mães, Dia da Independência não poderá ser comemorado de fato se não houver justiça social. Se esta existir, então podemos comemorar com todas as nações e religiões a segurança e a paz, objetivo principal das Nações Unidas.
Aliás, qualquer nação como qualquer religião só veio a existir graças às suas leis. E estas só existem porque se pretendem justas. A ONU, portanto, não está estabelecendo nada de novo. Esta preocupação com a justiça social e a paz entre as nações já se reflete em textos milenares, como a Bíblia.
Ora, sem justiça social nação nenhuma estará a salvo. Nova talvez seja a consciência de que se essa justiça social proclamada há milhares de anos até nossos dias nas constituições de nações, religiões, instituições de modo geral, se ela continuar apenas no discurso, a nossa paz e segurança estarão cada vez mais ameaçadas. Toda criança em sua prática e pureza ensina para nós sábios, doutores, conhecedores das leis, que a violência e/ou repressão começa nela quando ela não tem o direito ao brinquedinho que tanto deseja. Na primeira ocasião vai disputar a tapa o brinquedo da outra.
Dos que julgam que isso sempre foi assim e assim sempre será nada podemos esperar, a não ser um ar de deboche ou de indiferença em relação àqueles que fazem da sua vida um caminho para a justiça social. Este caminho nunca pôde nem nunca poderá ser pautado apenas no discurso. É preciso que apareçam seres humanos com ‘fome e sede de justiça’ conforme cada cultura pode ler em textos de sua referência, sejam eles laicos ou sagrados. No entanto, um texto em si pouco ou nada pode nos ensinar sobre justiça social. Quem ousar ultrapassar os limites do discurso certamente vai entrar para a história como ‘a justa’, ‘o justo’.
A cultura ocidental tem em seus textos sagrados referências à ressurreição dos justos e assiná-la a missão deles. A ONU com os seus objetivos de justiça social até o ano de 2030, entre eles “erradicação da pobreza”, “promover o pleno emprego”, “o trabalho digno”, “a igualdade de gênero”, “o acesso ao bem-estar social e à justiça para todos” parece parafrasear estes textos. Talvez seja ela de fato uma organização capaz de unir todos os seres humanos em torno deste objetivo.
Mas, se quiser ter alguma chance, precisa primeiro em seus laboratórios compreender e mostrar ao mundo na prática que justiça social não pode ser estabelecida a partir de leis subjetivas, onde cada nação, cada religião, cada indivíduo estabelece a sua de acordo com as suas crenças. Ela é uma ciência que garante a sustentabilidade, o equilíbrio, a qualidade da vida na terra para todos.
Cabe aos cientistas das nações, religiões e ONGs que de fato se interessam pela justiça social desvendar estas leis, confirmá-las na prática em seus laboratórios e torná-las assim leis universais, como são universais as leis das ciências exatas.

*professor da Unesp de Assis e, entre suas linhas de pesquisa, estão a Diversidade Cultural e a Interculturalidade.