Um dos maiores gênios da história do pensamento foi o prussiano Immanuel Kant. Tendo obras datadas do final do século XVIII e início do século XIX, seu pensamento, em muitos aspectos, permanece atual até os dias de hoje. Sua originalidade com a apresentação de novos conceitos para explicar a realidade moral e jurídica continua sendo importante referencial. Especialmente com a obra Fundamentação da Metafísica dos Costumes, aqui com a tradução portuguesa das edições 70.
Neste livro ele apresenta como fundamento elementar da moralidade e do Direito o imperativo categórico, também denominado de hipotético. Talvez seja o mais conciso e claro preceito inaugurador da moral e do direito modernos nos quais não vigora a força de alguma autoridade, mas o poder da própria norma. Este imperativo determina: “Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal”. A preocupação dele é resolver o sério problema enfrentado pela sociedade, pois as pessoas querem uma norma para todos ao mesmo tempo desejam ser exceção.
Para ele, a máxima é o princípio maior que determina as normas da moral e do Direito a partir do indivíduo para toda a sociedade. O sucesso da boa lei inicia dentro da consciência do ser humano. A lógica deste imperativo é razoavelmente simples: aquilo que aceito como fundamento de minhas condutas sou obrigado a aceitar como fundamento da conduta de todos. Desta forma, têm-se a base para elaborar as normas morais e, especialmente, jurídicas com validade para todas as pessoas da mesma forma. Num desdobramento da lógica do imperativo, uma das principais características do constitucionalismo moderno é que ninguém está acima da lei. Para ser mais claro, ninguém pode se considerar exceção à regra feita para todos.
Uma das consequências da aplicação deste imperativo encontra-se na educação dos cidadãos como proposto em seu livro A Pedagogia. Através da educação o homem deve ser disciplinado para controlar a ferocidade que há nele e desenvolver os germes de humanidade; “tornar-se prudente” para reconhecer seu lugar na sociedade e nele permanecer garantindo o princípio da civilidade; e, for fim, “deve cuidar da moralização. Na verdade, não basta que o homem seja capaz de toda sorte de fins; convém também que ele consiga a disposição de escolher apenas os bons fins. Bons são aqueles fins aprovados necessariamente por todos e que podem ser, ao mesmo tempo, os fins de cada um”.
O princípio que leva o indivíduo a buscar a própria vantagem em detrimento do bem comum e do bem-estar de todos é flagrantemente contrário ao imperativo categórico. Uma sociedade em que os cidadãos não estão preocupados em viver segundo a máxima necessária para a boa ordem será sempre frágil diante de toda e qualquer corrupção. Quando não há a disposição interior de realizar os bons fins a vigilância exterior da lei será sempre ineficiente.
Escolher os bons fins cuidando ao mesmo tempo do interesse pessoal e coletivo! É isto que a nossa Constituição conceitua ao falar de bem comum. Infelizmente às vezes quando andamos nas ruas ouvimos o grito da casa grande e da senzala cantando com o sambista: “se a farinha é pouca, meu pirão primeiro”. Ou ainda ecoa nos ouvidos dos mais velhos e no arquétipo dos mais jovens a famosa propaganda do cigarro Vila Rica: “Faça como eu, leve vantagem em tudo!”.
Olhemos o tamanho do mal que a lei da vantagem pode trazer a um país inteiro. Para a fartura no pirão de alguns poderá faltar farinha para uma nação inteira. Em tempos de crise moral, como a que vivemos, é bom ressuscitar o velho Kant e verificar se a minha máxima interior está contribuindo para a nobreza moral de minha família, de meu bairro, de minha cidade, de meu estado e de meu país. Sem isto, iniciará governo e terminará governo, uma operação investigativa sucederá a outra, e continuaremos vivendo sem o respeito ao bem comum e movidos pela lei da vantagem pessoal. É tempo de revermos nossas condutas em relação à administração pública, aos bens e patrimônios cujo fim é o bem estar de todos.

*Professor da Faculdade REGES de Dracena, mestre em Direito (Teoria do Direito e do Estado) pela UNIVEM (Marília); doutorando em Direito (Sistema Constitucional de Garantia de Direitos) pela ITE-Bauru.