Mani, também chamado de Manes ou Manchaeus, nasceu no século III e viveu na região da Pérsia, atualmente onde se localiza o Irã, foi o fundador da corrente ética, filosófica e religiosa de tendência dualista denominada, em sua homenagem, de Maniqueísmo. Seu pensamento é resultado do sincretismo entre o zoroastrismo, elementos de religiosidade oriental e das antigas religiões persas e, até mesmo, do cristianismo. Sua preocupação originária concentra-se em explicar a existência do mal.

Se Deus é bom e criou tudo, de onde vem o mal? Mani não aceitava que o mesmo princípio criador do bem tivesse gerado o mal ou dado ao homem o arbítrio para escolher a malignidade. Ele explica o problema afirmando a existência de duas forças criadoras antagônicas: a do bem e a do mal. Assim, a força do bem gerou o bem e a força do mal gerou o mal. O bem manifesta a luz e o mal manifesta as trevas formando dois reinos distintos em permanente conflito. Para Mani, a história consiste na guerra santa da luz contra as trevas.
Desta forma, os homens se dividem entre os do bem e os do mal. Não há meio termo! Quem é do bem é totalmente do bem; e o homem mal é plenamente mal. É claro que Mani compreendia como sendo do bem os membros de sua seita e todos os demais eram do mal. Então, pode-se resumir que o deus do bem fez o homem do bem e o deus do mal fez o homem do mal e ambos travam permanente batalha a ser vendida por um dos lados. Quem é do bem viverá sempre no reino da luz e quem é do mal passará das trevas deste mundo para as trevas eternas.
As ideias de Mani lhe valeram perseguições dos sacerdotes de Zoroastro e dos cristãos. Aproximadamente no ano 277 seu pensamento foi considerado herético e ele foi preso. Apesar de não se conhecer provas do fato, a tradição diz que foi escalpelado vivo tendo, em seguida, o corpo queimado e a pele estendida numa cruz. Ele, defensor da divisão entre os do bem os do mal vendo malignidade em tudo que estava fora de sua seita, era visto como do mal pelos seguidores do Zoroastrismo e do Cristianismo e acabou sendo morto por quem também se julgava em defesa do bem e em perseguição ao mal.
A ingenuidade sobre a condição humana caracteriza a visão dualista muito bem respondida pelo pensamento de Tomás de Aquino, no século XIII. Para este, no mundo não existem nem anjos nem demônios, mas humanos. Os anjos são criaturas intermediárias entre os homens e o Céu; os demônios fazem a intermediação entre os homens e o inferno. Aqui na terra vivem homens e mulheres em condições concretas. A perfeição não caracteriza a condição humana. Porém, vemos ressuscitar com frequência o dualismo maniqueísta dos que se julgam perfeitos sempre quando determinado grupo assume a posição puritana de quem é da luz e passa a perseguir tudo aquilo do qual discorda como se fosse das trevas.
Duas grandes tragédias podem ser citadas: a inquisição e o nazismo. No momento, vemos um pequeno grupo sectário de mulçumanos colocando em risco a riqueza da religião e cultura islâmica em nome do estado puritano. Mata-se por nada e com total impiedade todos os considerados filhos das trevas. Existem, também, os maniqueístas do cotidiano desrespeitosos com a opinião alheia e portadores de preconceitos de todo e qualquer gênero. Contrariando nossa Constituição desclassificam as pessoas em vista de “origem, raça, sexo, cor, idade” e demais “formas de discriminação”.
Aristóteles se levanta do túmulo para combater os maniqueístas de plantão ensinando como ideal de conduta as mesotes, isto é, que o caminho da virtude está no equilíbrio; nos extremos estão os vícios. Outro mestre que não precisa levantar do túmulo, pois, para os cristãos, está ressuscitado entre nós, ensina aos puritanos prontos para apedrejar a suposta filha do mal: “quem não tem pecado atire a primeira pedra!” (João 8, 7). Desta forma, os homens e as sociedades devem corrigir seus erros sem cair na tentação da luta do bem contra o mal, pois esta sempre se revelou, ao longo da história, trágica para todos.

*Professor da Faculdade REGES de Dracena, mestre em Direito (Teoria do Direito e do Estado) pela UNIVEM (Marília); doutorando em Direito (Sistema Constitucional de Garantia de Direitos) pela ITE-Bauru.