Neste momento triste da história de nosso país, em que o presente avança em sobressalto como numa montanha-russa e o futuro não se descortina, mais uma demonstração de falência do atual modelo de gestão pública acaba de ser dada pelo aumento de tributos sobre combustíveis e suas desastrosas consequências.
Como sabemos, isto representa insumo presente em praticamente todos os estágios de produção de produtos e serviços do país – ou, simplesmente, mais uma invasão no bolso já escorchado do brasileiro.
Este é um país corroído pela corrupção, com uma das cargas tributárias mais elevadas do planeta e no qual os governantes se dão ao luxo de tributar mais e mais para tapar sua incapacidade administrativa. O que reforça o contorno de injustiça social ainda maior quando constatamos a absoluta ausência de serviços públicos indispensáveis, que deveriam ser financiados pelos impostos pagos pela sociedade, especialmente em áreas vitais como educação, saúde, segurança e justiça.
Não há reciprocidade entre as obrigações da sociedade e as do Poder Público, com sua estrutura gigantesca, cara e ao mesmo tempo ineficiente. O fato é que o Estado continua moldado pelo patrimonialismo, pela apropriação de espaços e esforços públicos em benefício do setor privado.
É assombroso o número de cargos comissionados que servem apenas para atender aos interesses políticos, sem necessidade administrativa, ocupados na maioria das vezes por pessoas sem qualquer qualificação técnica para a função. Então, para manter essa máquina em péssimo funcionamento, lança-se mão do aumento de tributos.
O Brasil reclama reformas que combatam para valer as suas mazelas – administrativa, fiscal, tributária, federativa – e que levem a uma nova forma de relacionamento entre os Poderes, fora outras correções de rumo essenciais para o desenvolvimento da pátria. E a principal, a política.
É preciso, afinal, romper com a herança maldita de nossa história. A reforma política que se esboça agora em Brasília, por exemplo, não passa de mais um remendo na velha colcha de retalhos para perpetuar práticas já condenadas pela opinião pública.
O declínio da política em nosso país é acentuado pelo fato de ter substituído o conceito de missão pelo conceito de profissão. Por que os mecanismos clássicos da política vivem em crise descomunal? As nações democráticas registram forte decaída da participação dos cidadãos no exercício da vida pública – basta apurar o retraimento dos eleitores por ocasião dos pleitos. Esse profundo desinteresse pela política se explica pelos baixos níveis de escolaridade e ignorância sobre o papel das instituições e pelo desinteresse dos políticos em relação às causas sociais. O fenômeno – a distância entre a esfera pública e a vida privada – se expande de maneira geométrica.
O que fazer para limpar a sujeira que borra a imagem do homem público? Não adianta colocar sobre ela camadas de tinta. Equivaleria a pintar uma parede sem argamassa, oca. A pintura deve ser feita por dentro. A reengenharia voltada para o resgate da moral na vida pública é tarefa para mais de uma geração. Mas pode ser iniciada já. Primeiro passo: o homem público deve cumprir rigorosamente o papel que lhe cabe. Segundo: punir os que saem da linha. Terceiro: revogam-se as disposições em contrário.
Por isso, neste momento a sociedade reclama uma reforma política digna desse nome, entre outros motivos para qualificar adequadamente o Congresso Nacional, para renovar as envelhecidas práticas políticas e valorizar a nobre missão de servir à sociedade – e não se servir dela. Enfim, promover as transformações imprescindíveis para a representatividade de nossos eleitos.
Esse deve ser o caminho para tornar o Brasil mais comprometido com a seriedade, com o zelo da coisa pública, com o respeito que a população em geral merece.
E a saída para tudo isso exige competência e seriedade dos gestores públicos, em todas as esferas do poder; não são os seguidos e casuísticos aumentos de tributos que resolverão problemas históricos de nossa Nação. Muito pelo contrário.
*Advogado, presidente da OAB SP