Os resíduos gerados nas construções e demolições (RCD), incluídas nessas obras as reformas, são considerados um dos grandes problemas das cidades no mundo todo. Provavelmente pelo fato de não terem o mau cheiro característico do lixo comum, geralmente não são encarados como prioridade. O que é um erro tão grande quanto a quantidade gerada.

No Brasil, especialistas estimam que sejam gerados mais RCD do que lixo comum, algo em torno de 1,5 a 2,5 kg diários de entulho de construção por brasileiro. Ao contrário do lixo doméstico, gerado por todos, somente alguns geram RCD. Logo, é razoável que enquanto no lixo doméstico todos paguem impostos para o manejo correto, com o entulho somente quem gere pague para este resíduo siga o caminho que a legislação mandar.
Dessa forma, antes mesmo de começar uma obra, o pedreiro, mestre de obras, engenheiro e/ou arquiteto já avisa o proprietário que vai ser necessário contratar caçamba(s), aqueles imensos contêineres metálicos que ficam em frente às obras. E o dono da obra tem que pagar para que a caçamba fique lá por um tempo e, uma vez cheia, siga para o destino correto.
E qual é o destino correto de uma caçamba cheia de RCD?
A resposta para essa pergunta está numa lei federal, de 2002, que diz que os RCD devem ser separados para que sejam aproveitados (a não ser os perigosos, que também podem ser encaminhados a locais licenciados para recebê-los). A lei diz que, caso não exista aproveitamento, somente resíduos como tijolos, pedras, telhas, cimento e vidro podem ir para aterros simplificados, chamados aterros de resíduos inertes. São simplificados pois, ao contrário dos aterros sanitários que recebem lixo comum, não necessitam de impermeabilização do solo e da coleta e tratamento de efluentes líquidos e gasosos gerados durante a decomposição do que foi enterrado.
Isso porque, segundo outra legislação, que trata dos tipos de resíduos sólidos, tijolos, pedras, telhas, vidros e cimento não possuem nenhum componente que, ao ser atingido pela água da chuva que cai em qualquer aterro, cause algum tipo de contaminação que possa ser importante caso essa água flua até um aquífero e atinja a população. Num aterro sanitário, dada a presença de resíduos não inertes como restos de comida, madeira e metais, a impermeabilização do solo e o tratamento do líquido que sai do aterro (chorume) é fundamental.
Bem, essa é a teoria. Na prática a coisa não funciona exatamente assim, infelizmente. Como se não houvesse coleta de lixo comum regularmente, uma caçamba na vizinhança é vista como um enorme cesto de lixo, onde muitos colocam nela o que deve e o que não deve.
Já a separação de resíduos na obra é algo raro no Brasil, de modo que numa caçamba acabam indo todos os resíduos da obra, inertes e não inertes. Numa construção que parte do zero a separação é mais simples, uma vez que resíduos geralmente distintos são gerados em fases diferentes da obra, do alicerce ao acabamento. Mas numa reforma, onde podem ser gerados diferentes tipos de resíduos de uma vez, a separação de resíduos é incomum.
Então por que não se separam os resíduos posteriormente ao enchimento de uma caçamba? Isso é possível, mas improvável: os resíduos de construção e demolição são normalmente muito pesados, fazendo com que a segregação manual seja bastante difícil.
Assim, muitos resíduos que não são necessariamente inertes acabam indo para locais sem o devido preparo para recebê-los, de modo que um aterro de inertes se transforma num potencial problema para toda a população. Isso se a caçamba cheia vai para um aterro de inertes e não para um local como um terreno baldio ou margem de rio. Outra prática infelizmente bastante comum.
Em resumo, o avanço com a responsabilização direta do gerador pelo seu resíduo na contratação das caçambas, talvez seja a única notícia boa sobre os resíduos de construção e demolição.

*Professor da Unesp-Sorocaba