Aos trancos e barrancos, com alguma alegria no meio do caminho, nós, que consideramos levar uma vida em princípios civilizados, vigiados pela moral, pela lei e pela ética, vamos avançando ao final de um mais um ano difícil. Faltam menos de 60 dias para 2018, mas os problemas não são nem nunca foi o calendário. O ser humano é que são eles…
Ainda domingo, 5, um cidadão norte-americano entrou em uma igreja e matou pessoas. Uns dias antes, três caras mataram um empresário de Barra Bonita e não mostram sinal algum, não diria de arrependimento, mas de aborrecimento, ao menos. Afinal, tiraram algo de alguém que não querem que os tirem – a vida, simplesmente ela, a vida. E ainda na última semana, uma garota que estudava em Rio Preto foi morta após dar carona comunitária errada a um jovem marginal.
Para as crises sistêmicas, estejam onde estiverem, na economia, na política, em casa ou no trabalho, a solução é encontrada de alguma forma e o final de ano chega sorridente, todos se confraternizam e a folhinha que terminou em 31/12 é amassada e lançada ao cesto de lixo. Mas o transe mental atormentado que muitas pessoas estão vivendo individualmente mundo afora é algo que merece reflexão séria, tanto quanto ou mais do que se discute sobre mudanças climáticas, geopolítica, tecnologia etc.
Não há ninguém seguro em lugar algum.
Lobo solitário é o novo neologismo para um homicida como o que entrou domingo em uma igreja Batista da pequena cidade de Sutherland Springs, no Texas, Estados Unidos, atirou e matou pelo menos 20 pessoas, deixando mais de 20 feridas.
Geralmente, esses genocidas morrem. Então, não buscam vitória, supremacia, conquistas, ainda que baseados na velha premissa de que o homem é mesmo o lobo do homem. Os fundamentalistas que matam usam para si a justificativa de que irão a um lugar sagrado após cumprir a missão que, em nome de uma divindade, outro humano lhe delegou.
Há três grupos de terroristas solitários: um formado por aqueles que não se vinculam a nenhuma entidade nem devem obediência a alguém. Há aqueles que igualmente agem sozinhos, não recebem orientação, nem são necessariamente filiados a uma organização política ou ideológica, mas simpatizam com ela e se sacrificam em atrocidades, ainda que isso não lhes tenha sido exigido. Este último tipo aparece em alguns dos últimos atropelamentos que mataram pessoas, tanto na Europa como, recentemente, em Nova York, quando turistas argentinos foram mortos.
Ninguém nasce com ódio de seus semelhantes. Difícil sustentar o tempo inteiro a tese de que somos seres ruins em essência, porque a civilização encontrou freios de vários tipos para conter nossos instintos mais básicos e irracionais. Mas como padronizar o comportamento de 7 bilhões de seres vivendo em um planeta que gasta e consome energia o tempo todo?!
Talvez traga algum alívio enxergar atos extremados contra a vida como exceções. A maioria de nós mantém sob controle as vontades inconfessáveis, inclusive as violentas. Mas basta?
Do ponto de vista da cronologia histórica, o atentado de 11 de setembro de 2001, nos EUA, parece ter reaberto a temporada de terror como alternativa à guerra convencional, anos após uma relativa estabilidade nas relações mundiais, principalmente após o fim da Guerra Fria, no final dos anos 80. Voltando a refletir, certamente, desequilíbrios históricos, milenares, nas relações entre os agrupamentos humanos. Entre os que podem mais e os que podem menos, em escala global ou mesmo entre pessoas de uma mesma cidade, por menor que seja.
A era dos lobos solitários é um tempo estranho de pavor e medo em meio ao otimismo e conforto advindos das descobertas da ciência e da tecnologia. Misturamos na mesma dimensão da existência contemporânea formidáveis conquistas e grotescos retrocessos, o que nos deixa perdidos, sem explicação lógica.
Por isso, comedimento, amor e bom senso, em cada ato nosso!
*Colunista Jornal da Cidade-Bauru