Muito provavelmente você já ouviu falar de Martim Afonso de Sousa. Caso não saiba quem foi este português, saiba que além de ter sido o chefe da primeira expedição enviada ao Brasil para iniciar a colonização em terras novas, em 1530, Martim Afonso de Sousa trouxe ao Brasil um produto que até hoje um dos mais importantes da economia nacional: a cana-de-açúcar.
A cana-de-açúcar é hoje uma das principais commodities brasileira.
De acordo com o professor doutor da UNESP FCAT Dracena, Paulo Figueiredo, hoje a cana-de-açúcar é cultivada em cerca de nove milhões de hectares do território tupiniquim.
“O Brasil vem ganhando, cada vez mais, destaque nacional e internacional na área sucroenergética, pois é disparado o maior produtor mundial de cana-de-açúcar. Vale lembrar que, além da cana, soja e milho também são culturas agrícolas que têm posicionado o Brasil como uma das principais lideranças em todo o mundo, o que é motivo de muito orgulho para o setor agropecuário de nosso país”, disse o professor.
Mesmo sendo uma das principais fontes de produção do agronegócio nacional, a produção de açúcar, que conta com a cana como matéria prima, pode não ser o suficiente para a demanda mundial. “É importante destacar que, até meados de 2021, a produção mundial de açúcar deverá alcançar algo em torno de 184 milhões de toneladas, enquanto que a demanda global está projetada em 186 milhões. Portanto, há um potencial déficit de açúcar, que teve seu consumo acelerado com o aumento da confecção de produtos alimentícios embutidos, que em sua maioria, contém açúcar em sua composição”, explicou o especialista no assunto.
Paulo ressalta que pandemia de covid-19 também é fator determinante para este possível déficit. “A pandemia provocada pelo covid-19 tem aumentado o consumo de alimentos em todo o mundo, em função da retomada de inúmeros hábitos alimentares caseiros”, ressaltou.
Alta do dólar interfere na produção
O dólar ultrapassou e se mantém há meses acima dos R$ 5,00. Este fator interfere diretamente na produção agropecuária. O açúcar é um produto muito exportado, e apesar do retorno ser maior quando se negocia em dólar, Paulo afirma que a produção segue equilibrada entre o açúcar e o etanol.
“A escalada recente do dólar tem incentivado o aumento da produção de açúcar quando comparado com o álcool, mas isso não significa que a maior parte da cana tenha sido destinada para esse produto. Nesta safra, os dados mais recentes mostram que 47% da oferta total de cana foram destinadas ao açúcar, enquanto 53% para a produção de álcool. Esse patamar não deve mudar muito nos próximos anos”, afirmou o professor.
Preço do etanol nos postos de combustíveis
Essa mudança, segundo o professor, pode interferir diretamente no preço do etanol nos postos de combustíveis. “A opção das unidades sucroenergéticas produtoras em aumentar gradativamente a produção de açúcar, obviamente, vai diminuir a quantidade de matéria prima destinada para a produção de álcool. Nesse sentido, há uma tendência de redução da oferta de álcool para o mercado, o que faz com que o preço possa, até certo ponto, subir. Porém, esse comportamento vai depender de muitos fatores, como por exemplo, os estoques reguladores; a quantidade de cana-de-açúcar enquanto matéria prima a ser disponível no ano que vem; a oferta de outros combustíveis, como gasolina e gás natural; além do possível reaquecimento da economia pós covid-19”, afirmou Paulo.
Especulado recentemente em redes sociais, o risco de haver falta de etanol nas bombas de combustíveis está descartado. De acordo com Paulo, isso não acontecerá. “Estamos muito longe disso. Em função da disputa pelo açúcar no mercado internacional, não é tão simples e rápido o aumento da participação do Brasil nesse cenário. O açúcar é uma commoditie, o que significa que é uma mercadoria ou qualquer bem em estado bruto produzido em escala mundial; e com características físicas homogêneas destinadas ao comércio externo. Ou seja, se o Brasil, hipoteticamente, destinasse hoje toda a cana para a produção de açúcar, certamente teria dificuldades para processar, armazenar, comercializar, escoar e até mesmo exportar todo o volume produzido” disse Paulo.
Outro fator que Paulo levanta é que existem diferenças nas usinas que produzem açúcar e etanol. “Outro ponto interessante é que muitas unidades do País são destilarias, ou seja, produzem somente o álcool, não tendo condições efetivas de produzir açúcar, a não ser que invistam em equipamentos específicos, o que demanda interesse, tempo e altos investimentos financeiros. Por fim, vale lembrar que o preço do álcool também está relativamente atrativo para as unidades produtoras, em função das diversas estratégias que o setor vem gradativamente adotando para aumento do consumo”, disse o professor.
Falta de chuva pode fazer disparar o preço do etanol
Por fim, Paulo afirma que o preço do etanol pode estar em alta por causa da falta de chuva nas regiões onde se produzem cana-de-açúcar. “Novembro e dezembro são meses fundamentais para que haja uma melhor disponibilidade hídrica, fazendo com que os canaviais possam crescer e se desenvolver. Portanto, o setor aguarda melhores condições ambientais para alavancar a próxima safra, de modo que os preços dos produtos não sofram grandes variações”, concluiu o professor.