Amanda Tomashow é uma das mais de 140 vítimas de Larry Nassar, ex-médico da seleção americana de ginástica e da Michigan State University. Sem a fama de estrelas do esporte que também sofreram nas mãos de Larry como Simone Biles e Aly Raisman, ela é considerada uma vítima com um papel fundamental para inspirar outras meninas a também contar suas histórias. Em 2014, Amanda tentou contar a sua, depois de ser abusada por Larry Nassar em uma consulta. A denúncia foi registrada pela polícia e pela MSU (Michigan State University), que disse ter aberto uma investigação interna, mas permitiu que o médico continuasse suas atividades. Revoltada, Amanda diz que foi ignorada em sua denúncia, o que contribuiu para que Lassar continuasse fazendo vítimas.
Eles não me ouviram! (a universidade). Eles até ouviram, mas não sei se tiveram o cuidado de considerar o que eu tava dizendo. Eles estavam mais preocupados em proteger o médico deles que era da seleção olímpica americana. Se eles tivessem me ouvido seriamente naquele momento, se a comunidade tivesse me ouvido naquele momento, isso (mais de 140 denúncias de abuso de Larry Nassar) não estaria acontecendo agora – disse Amanda.
Dois anos depois das denúncias, o Lansing State Journal publicou uma reportagem com a história de Amanda, e a partir daí, mais meninas se sentiram confiantes a também denunciar Nassar. Na quarta-feira passada, no Tribunal de Michigan, Amanda deu depoimento olhando nos olhos do agressor Larry Nassar. Em seguida, ela permaneceu na sala para apoiar as demais vítimas em suas palavras. Em um dos breves intervalos entre os testemunhos, a jovem conversou com a reportagem do GloboEsporte.com. Voz baixa, mas firme. Fala pausada, com picos de emoção.
GloboEsporte.com: Lembra como se sentiu ao registrar uma denúncia a Larry Nassar em 2014?
Amanda: Voltando para 2014, quando falei sobre isso em uma denúncia, foi assustador pra mim. Fiquei com muito medo de minha voz não ser ouvida. Fiquei com medo também de ser perseguida. Me senti assustada e sozinha. Mas eu sabia que ele tinha feito algo errado, então eu tinha que dizer alguma coisa. Foi assustador, solitário, mas eu sentia que tinha que falar.
E como foi recebida a denúncia pela Michigan State University?
Eles não me ouviram! (a universidade). Eles até ouviram, mas não sei se tiveram o cuidado de considerar o que eu tava dizendo. Eles estavam mais preocupados em proteger o médico deles que era da seleção olímpica americana. Se eles tivessem me ouvido seriamente naquele momento, se a comunidade tivesse me ouvido naquele momento, isso (mais de 140 denúncias de abuso de Larry Nassar) não estaria acontecendo agora. Não teriam deixado o médico atuar por mais 30 meses depois.
Se tivessem considerado o que disse antes, não digo que todas as vítimas depois disso não teriam sido abusadas, mas muitas dessas pessoas seriam salvas.
Qual a importância em tornar público um abuso sexual e o impacto que isso pode causar em outras vítimas?
É sempre muito importante quando mulheres ou homens se manifestam sobre isso, ainda mais sobre abuso sexual. É sempre muito assustador, mas falar é muito importante. O que estamos vendo hoje e nesses dias que se passaram de depoimentos, falar o que passou e ouvir o que a outra atleta também sofreu, nos faz sentir mais confortáveis. E assim que essas histórias são reveladas. Espero que as coisas mudem. Não só aqui, mas no mundo todo.
Quem é Larry Nassar?
Ele é o homem mais cruel de todos, que usou seu poder pra abusar de centenas de jovens meninas.
Larry é um mestre da manipulação. Ele é o mal em forma de pessoa.
Você acha que existem mais pessoas como Larry Nassar no mundo?
Sim, eu acho que existem mais Nassars no mundo, mas vejo que nós temos a oportunidade agora de tirá-los de cena. Nós começamos a pegar de novo o poder.
Acha que esse caso do Larry Nassar pode causar um impacto positivo no problema de abuso sexual no esporte, no sentido de vítimas serem mais ouvidas?
Eu tenho muita esperança que sim. Vou me manter otimista em relação a isso. Acredito que vai haver uma mudança.
E o que dizer para os pais de filhos que iniciam em uma prática esportiva?
Você tem que ser capaz de confiar nos técnicos e nos médicos e profissionais da área, mas o mais importante é confiar no que é dito. Se alguém diz que algo de ruim aconteceu com ela, se alguém denuncia algum abuso, temos que confiar nessa pessoa mais do que em qualquer outra. E que isso nunca mais aconteça.
No primeiro dia de depoimentos, o tom parecia ser bem emotivo e triste nos depoimentos. Mas com o passar da semana, os discursos foram ganhando força, energia e esperança. Como você viu o desenvolvimento das palavras das vítimas?
Eu acho estamos vendo e percebendo que nós não somos mais vítimas. Nós somos sobreviventes e estamos prontas. Agora muitas pessoas consideram nossos discurso e nossas denúncias. Como disse a juíza: Nós somos o exército de irmãs sobreviventes e estamos prontas pra fazer grandes mudanças nesse mundo.