O novo decreto sobre o armamento no Brasil e o papel do delegado de Polícia como cumpridor da lei 

*Jacqueline Valadares é delegada de Polícia, especialista em Direito Penal

O novo decreto sobre o armamento no Brasil e o papel do delegado de Polícia como cumpridor da lei 

 

Jacqueline Valadares* 

O primeiro dia do novo ano foi marcado pela publicação do decreto 11.366/2023, que suspende os registros para a aquisição e a transferência de armas e de munições de uso restrito por parte de caçadores, colecionadores, atiradores e particulares. Assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o texto também restringe os quantitativos de aquisição de armas e de munições de uso permitido, suspende a concessão de novos registros de clubes e de escolas de tiro, e suspende a concessão de novos registros de colecionadores, de atiradores e de caçadores.

 

O decreto ainda institui grupo de trabalho para apresentar nova regulamentação à lei 10.826, de 22 de dezembro de 2003, que trata de armamento no Brasil.

 

Não obstante todas as polêmicas que envolvem o tema, merece destaque o disposto no artigo 27: “serão cassadas as autorizações de posse e de porte de arma de fogo do titular que responda a inquérito policial, ou a ação penal por crime doloso. § 2º A cassação a que se refere o caput será determinada a partir do indiciamento do investigado no inquérito policial, ou do recebimento da denúncia ou da queixa pelo juiz”.

 

O indiciamento é o ato pelo qual o delegado de Polícia manifesta sua convicção jurídica motivada a imputar a uma pessoa a condição de provável autor ou de partícipe da infração penal investigada no inquérito. Até o momento do indiciamento, o sujeito é tratado como investigado, ou seja, mero suspeito ou averiguado, ou apenas como parte envolvida. Formalizado o ato, o indivíduo passa a ser designado indiciado e, na concepção técnico-jurídica justificada da autoridade policial presidente do inquérito, figura como provável autor do fato objeto da investigação criminal. Trata-se, assim, da transposição de um juízo de possibilidade (mera suspeita) para outro de probabilidade (fundada suspeita), conforme bem lembra em artigo o delegado Rafael Francisco Marcondes de Moraes (www.adpf.org.br/adpf/admin/painelcontrole/materia/materia_portal.wsp?tmp.edt.materia_codigo=6366#.Y7Lz1nbMKUk).

 

O decreto de Lula ainda destaca a atuação das Polícias Civil e Federal ao dispor, no parágrafo § 4º, que “a apreensão da arma de fogo é de responsabilidade da Polícia Judiciária competente para a investigação do crime motivador da cassação.” Por fim, o texto também abarca preocupação com a violência contra a mulher no País. Destaca a atuação das delegadas e dos delegados de Polícia que atuam neste segmento ao prever no parágrafo § 5º que “nos casos de ação penal ou de inquérito policial que envolva violência doméstica e familiar contra a mulher, a arma será apreendida imediatamente pela autoridade competente, nos termos do inciso IV do caput do artigo 18 da lei 11.340, de 7 de agosto de 2006.”

 

Diante do exposto, fica clara, mais uma vez, a figura do delegado de Polícia como peça fundamental para a concretização no Brasil de diversos direitos sociais e fundamentais, inclusive cumprindo o papel que a população espera.

 

Mesmo numa situação de relativização de direitos, a restrição às armas deve ser pautada em nosso País por indícios oriundos de investigação respaldada legalmente.