“Não se fabricam coisas como antigamente”, quem já não ouviu ou até mesmo disse esta frase em algum momento?! São celulares que são substituídos em pleno funcionamento, lâmpadas e resistências de chuveiros que parecem queimar cada vez mais rapidamente; mesas, camas e cadeiras com lindos designs que parecem feitos para se desmancharem em menos de 2 anos… E, exceto pelas marcas de produtos que oferecem a sua durabilidade como principal diferencial, existem empresas que propositadamente planejam seus produtos para durarem menos. Essa estratégia comercial é conhecida como obsolescência programada ou obsolescência planejada.

Segundo o geógrafo Rodolfo Alves Pena em artigo publicado no Uol sobre o tema, a depressão de 1929 pode ter sido o principal estímulo para esta prática. Com a queda das vendas nas indústrias, os estoques ficaram abarrotados de mercadorias, agravando o desemprego e a crise. Há até um jargão conhecido entre os economistas americanos que reflete bem esta realidade: “Um produto que não se desgasta é uma tragédia para os negócios”.
Nesse mesmo artigo, Rodolfo Pena diz que preparar o produto para se desgastar mais rapidamente não é a única estratégia. Soma-se a esta, a obsolescência psicológica, onde o produto é trocado, mesmo estando em perfeito estado de uso; o exemplo clássico desta estratégia são os aparelhos de celulares.
Esta postura favorece a economia e gera empregos inegavelmente, mas, é preciso avaliar o limiar para tais práticas.
O primeiro efeito nefasto é para sobrevivência e qualidade de vida do ser humano, pois a prática fatalmente culmina em mais lixo tóxico, como baterias e pilhas, que nem sempre são descartados corretamente.
Outra questão é quando a estratégia empresarial fere os direitos do consumidor!
Conheço um caso onde o cliente comprou um relógio de uma marca conhecida pela qualidade dos componentes. Àquele tipo de relógio que dura uma vida! Como esperado o relógio estava em pleno funcionamento após 18 meses de uso, contudo a pulseira, de couro, naturalmente se deteriorou com o uso e precisava ser trocada. Ao cliente regressar à relojoaria foi surpreendido pela indisponibilidade da pulseira, tanto na loja quanto na fábrica.
Sem acordo com o fornecedor, apenas restou-lhe a evocação da lei!
Segundo o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), o art. 32 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) “garante o fornecimento de peças de reposição de todos os produtos disponíveis no mercado enquanto eles forem fabricados ou importados, até mesmo após saírem de linha. ” Contudo, o CDC se omite quanto ao prazo de fornecimento de peças para produtos fora de linha, fala apenas em “período razoável”.
Esta lacuna é preenchida pelo decreto-Lei n. 2.181/97, em seu inc. XXI, do art. 13 que equipara o “período razoável” à vida útil do produto ou serviço.
O uso da estratégia da obsolescência programada precisa de coerência e bom senso, perder um relógio por falta de reposição de uma pulseira é inadmissível! Resta, em casos como este, fazer valer os direitos do consumidor e colocar algum limite nesta prática.

* É consultor de empresas, professor executivo/colunista da FGV/ABS (FGV/América Business School) de Presidente Prudente.