O Ministério da Justiça entrou com pedido de reexame no Tribunal de Contas da União contra decisão do próprio TCU de revisar mais de 9 mil reparações econômicas a pessoas perseguidas durante a ditadura militar (1964-1985). As reparações foram concedidas com base na Lei 10.559/2002.
No documento, protocolado no último dia 8, o ministério argumenta que as reparações, ainda que sejam pagas mensalmente e de forma contínua, “têm natureza jurídica indenizatória, e não de pensão”, conforme interpretou o tribunal em agosto. A Constituição Federal (Artigo 71, Inciso 3) estabelece que cabe ao TCU proceder a fiscalização das aposentadorias e pensões dos servidores públicos e familiares.
No Ministério da Justiça, o entendimento é de que a indenização aos anistiados não tem “natureza previdenciária”, não é um direito decorrente do recolhimento de trabalho e contribuição à Previdência Social, mas um direito devido a uma “lesão” provocada pelo Estado. “Se assim é”, diz o documento, “o ato de concessão da declaração da anistia, bem como da prestação permanente e continuada, não se submete a registro perante a Corte de Contas”.
O pedido de reexame é assinado pelo presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão Jr, e pela consultora jurídica do ministério, Giselle Cibilla Silva. No documento, os dois rememoram que, em processo de anistiados da Força Aérea Brasileira (TC 026.848/2006-1), o próprio tribunal assinala que “não se extrai do texto constitucional qualquer possibilidade de o TCU adentrar terreno da discricionariedade [decisão] política dos atos de governo”.
Paulo Abrão e Giselle Cibilla ressaltam ainda que “é inconstitucional” a norma interna do TCU (Artigo 14 da Instrução Normativa do TCU 55/2007) em que se baseou a decisão do tribunal de rever as indenizações.
Segundo eles, a revisão do TCU é “inoportuna” e “injustificável” e agrava a não reconciliação do Estado com as pessoas perseguidas pelo regime militar. “Com a ausência de arquivos disponíveis para a sociedade, com a negativa do direito à proteção judicial das vítimas em relação aos seus torturadores, com a incapacidade do Estado em localizar os restos mortais dos desaparecidos políticos, o processo reparatório resta como baluarte [sustentação] da transição rumo à reconciliação”, descreve o pedido de reexame.
Em entrevista à Agência Brasil, o procurador Marinus Eduardo Marsico, membro do Ministério Público no TCU e autor da representação para revisar a concessão das reparações dos anistiados, disse que o tribunal não “irá olhar as indenizações com os olhos de perseguido”. Para ele, os processos, em sua maioria, são regulares.
Marinus destacou , no entanto,que a reparação, paga de forma mensal, permanente e continuada, tem caráter de pensão. Ele assegurou que, caso o TCU mande suspender o pagamento, não será determinado o ressarcimento do que foi recebido pelos anistiados, pois agiram de “de boa fé”.
O TCU ainda não tem previsão de quando será analisado o pedido do Ministério da Justiça.