Comerciantes fecharam as portas e o policiamento foi reforçado na avenida Edu Chaves, na Vila Medeiros, zona norte de São Paulo, região que foi palco do protesto que terminou com veículos incendiados e lojas saqueadas na noite de ontem (29). A manifestação foi realizada por conta da morte do jovem Douglas Rodrigues, 17, baleado por um policial militar, e terminou com 90 pessoas detidas –apenas duas ainda permanecem presas.

A maioria dos comércios fechou as portas por volta de 12h após circular um boato de que um novo protesto será realizado às 14h. “Estamos fechando com medo de quebra-quebra”, diz Sandro Luiz, 34, balconista de um mercado.

A reportagem do UOL presenciou um carro da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), grupamento de elite da PM, circular pela avenida, além de três motos da Rocam (Ronda Ostensiva com Apoio de Motociclista). Policiais de uma base comunitária móvel da PM que fica na avenida confirmaram que o boato se espalhou e disseram que “o comando [da PM] já foi avisado”.

“A gente está vendo todo mundo fechando, achamos melhor fechar também”, diz a vendedora M. F., 18, que não quis identificar. Uma agência dos Correios na avenida Edu Chaves também fechou. Nas avenidas Mendes Rocha e Roland Garros, palcos do quebra-quebra de ontem, os comércios também começaram a fechar a partir de 13h. 

Até o momento a reportagem não localizou nenhum indício de que haverá protesto no local. “Com esse clima, ninguém quer comprar, nem vender, todos têm medo de ser roubado”, afirmou um lojista que não quis se identificar.

Escolas

As duas escolas mais próximas ao local dos atos, visitadas pela reportagem, funcionaram normalmente pela manhã, mas, por volta de 13h, funcionários do Centro de Educação Infantil Vereador Francisco Marcondes de Oliveira ligaram para os pais dos alunos e pediram que os estudantes fossem buscados.

“Vim pegar [a filha na escola] por receio da bagunça. As ruas estão estranhas. É melhor ficar em casa”, afirmou o vendedor William Silva Coelho, 24, enquanto saía com sua filha Luciana da escola.

Uma funcionária que não quis se identificar afirmou que “algumas crianças faltaram” no período da manhã.

No Centro de Educação Infantil Lyly Byan, apesar de não terem sido alertados pela escola, pais de alunos também buscavam os filhos no início desta tarde com medo de um possível tumulto.

Moradores criticam vandalismo

Mais cedo, nas avenidas Mendes da Rocha e Roland Garros, o clima era mais tranquilo, com a maior parte das lojas funcionando normalmente. Entre os moradores do bairro, o sentimento é de que os atos de vandalismo não trarão Douglas de volta.

“Que protesto é esse com gente andando com televisão saqueada embaixo do braço? Depredação não vai trazer o Douglas de volta”, diz o estudante Fernando Santana, 21, que conhecia a vítima de partidas de futebol amistosas. “Muita gente que estava saqueando e depredando nem conhecia o Douglas e nem era aqui do bairro.”

As agências do Itaú e da Nossa Caixa, que tiveram suas vidraças quebradas ontem, funcionavam normalmente nesta terça-feira.

“O quebra-quebra de ontem à noite mancha a memória do Douglas. O bairro já não é bem falado por causa da violência e, com os protestos de ontem, já já vão achar que aqui é o Rio de Janeiro”, disse a funcionária da escola.

“A situação é complicada. Os comerciantes não têm nada a ver com a bagunça, o PM será julgado e não dá para fazer justiça com as próprias mãos”, disse Nilson Inácio da Silva, 52, comerciante.

No início da manhã, os boatos de uma nova passeata que aconteceria hoje deixaram lojistas preocupados. “Ontem eu tive que fechar as portas e hoje abri a loja meio ressabiado. Ainda bem que não teve outra manifestação”, afirmou Reinaldo Dias, 24, tapeceiro. “Nessas horas o prejuízo é só nosso”.

Abordagem policial

Jovens do bairro relataram que abordagens policiais, com arma apontada ao rosto, em desacordo com o manual de conduta da Polícia Militar, são comuns no bairro. “Sempre que me enquadram já saem com a pistola mirando minha cabeça”, afirmou o jovem G.C., 17 anos, que preferiu não se identificar.

Durante o tempo em que permaneceu no bairro, a reportagem viu apenas dois carros da Polícia Civil circulando pelo local. Ontem, o secretário de Segurança Pública, Fernando Grella, havia dito que iria reforçar o efetivo na Vila Medeiros e chegou a conversar com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, sobre uma ação conjunta.

Nesta terça-feira, a cúpula da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo irá se reunir com representantes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) para definir as ações que irão tomadas. A rodovia Fernão Dias, palco principal dos protestos na zona norte, é interestadual.